Retorno obrigatório

Acordo que induzia empregado a não entrar na Justiça é invalidado

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6 de abril de 2004, 9h18

A 1ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho considerou nula parte do acordo coletivo firmado pela Mercedes Benz do Brasil com o Sindicato dos Metalúrgicos da Região de Campinas (SP). No acerto foi ajustado o pagamento de uma vantagem financeira, de acordo com o tempo de casa, a 500 trabalhadores dispensados em 1995.

Entre as cláusulas, uma previa que, caso o empregado demitido movesse qualquer ação trabalhista ou civil contra a empresa, o valor pago a título de vantagem financeira seria deduzido da quantia eventualmente devida pela Mercedes em decorrência de decisão judicial.

O relator do recurso, juiz convocado Aloysio Corrêa da Veiga, afirmou que a cláusula, na verdade, funcionou como uma ameaça ao empregado para que não recorresse à Justiça pois, se o fizesse, perderia parte do que ganhou.

O argumento jurídico utilizado pelo relator para acolher o recurso de um ex-serralheiro da Mercedes foi o de que a cláusula contrariou a própria natureza jurídica do instituto da compensação, que só é admissível no Direito do Trabalho em se tratando de parcelas de idêntica natureza jurídica.

Segundo o juiz, a cláusula também deve ser considerada nula porque importou em renúncia de direito, que tem caráter personalíssimo. Por esse motivo, tal renúncia não poderia ter sido negociada pelo sindicato.

Esse foi um dos pontos sobre os quais se debruçou a defesa do metalúrgico: que o sindicato não cumpriu sua função de defender os direitos dos representados, como determina a Constituição Federal.

Ao acompanhar o voto do relator, o ministro João Oreste Dalazen afirmou que os sindicatos não podem tratar sobre créditos futuros de seus representados. “Reconhecemos valor e eficácia aos acordos coletivos de trabalho mas não a esse ponto”, reagiu Dalazen.

O ministro rebateu o argumento da defesa da Mercedes de que a vantagem financeira foi paga por “mera liberalidade” da empresa. “Na verdade o que houve foi uma demissão em massa e, para atenuar a situação, a empresa concedeu a vantagem financeira aos 500 empregados dispensados”, afirmou.

O serralheiro tinha 14 anos de trabalho para a Mercedes. Foi admitido em 1981 para atuar no setor de montagem bruta, no qual passava a maior parte do tempo trabalhando nas bancadas, ajustando peças, cortando materiais, dobrando e ferrando peças.

Como utilizava esmeril, lixadeira, serra circular, dobradeira, serra-fogo (que solta faísca) e fresa, ajuizou reclamação trabalhista contra a Mercedes logo após a demissão, na qual requereu o pagamento de adicional de insalubridade, entre outros direitos.

No acordo coletivo em questão, o empregado com até cinco anos na Mercedes recebeu o correspondente a quatro salários. Quem tinha de cinco a 20 anos, recebeu seis salários (caso do serralheiro). Aquele que contava com 20 a 30 anos de trabalho na montadora, recebeu sete salários. Por fim, ao empregado com mais de 30 anos de casa, a Mercedes pagou oito salários a mais.

A Vara de Trabalho de Campinas e o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região admitiram a validade das cláusulas estabelecidas no acordo. O entendimento foi o de que os dispositivos não eram abusivos ou ilegais. Mas no TST as decisões anteriores foram reformadas.

O juiz Aloysio Veiga afirmou que a compensação pretendida é impossível de ser feita. “No presente caso, a referida verba foi paga pela empresa em obediência ao que dispõe o Acordo Coletivo, não se podendo cogitar de mera liberalidade. Não há que se falar em não reconhecimento dos acordos e convenções coletivas de trabalho. Trata-se de hipótese de nulidade de cláusula de acordo coletivo que não respeitou o próprio instituto da compensação, que se refere apenas a verbas de mesma natureza jurídica”, registrou o relator, rebatendo argumento da defesa da Mercedes de que a decisão estaria inviabilizando os acordos coletivos de trabalho. (TST)

RR 588.922/1999

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