A lei da selva

A lei da selva

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9 de março de 1998, 18h35

Dia 12 de fevereiro entra para a história do direito, como o dia da sanção presidencial da Lei de Crimes Ambientais. Contra ela se levantam algumas críticas. Mas é bom que se repita à exaustão: o projeto de lei aprovado representa um enorme avanço no tocante à proteção dos recursos naturais renováveis, do meio ambiente equilibrado, da sadia qualidade de vida, além de representar um instrumento eficaz e eficiente com que os cidadãos, os órgãos ambientais e o Ministério Público passam a contar para a defesa dos seus direitos.

Só encontra paralelo no Código do Defesa dos Direitos do Consumidor e no Código Nacional de Trânsito. E com grandes vantagens: enquanto no primeiro tutelam-se as relações de consumo e no segundo fixam-se regras para motoristas, ciclistas e pedestres, a Lei de Crimes Ambientais é bem mais ampla, protege a todos os habitantes, sem exceção. Afinal todos respiram, bebem água, comem alimentos.

Além de dar instrumentos para garantir a integridade do ar, das águas, das florestas, dos animais, aves e peixes, a lei penaliza civil, administrativa e criminalmente não só pessoas físicas, mas também pessoas jurídicas. Incorpora modernos mecanismos de substituição de penas privativas de liberdade por restritivas de direitos. Corrige enormes equívocos que antes a legislação esparsa e setorial impunha.

Agora se passa a contar com uma norma sistematizada, coerente e que deu às penas graduação adequada. Antes, se uma pessoa matasse um tatu para comer, cometia um crime inafiançável, enquanto uma madeireira que desmatasse 100 hectares na Amazônia cometia contravenção.

Se considerarmos que para lavrar uma multa tínhamos que tricotar uma verdadeira malha jurídica e, ainda assim, estávamos sujeitos à anulação desta multa, avançamos muito. Agora as tipificações estão todas reunidas, de forma clara, cristalina, insofismável.

Antes as multas não passavam de R$ 5 mil. Agora variam de R$ 50 a 50 milhões. Condutas delituosas que não tinham previsão específica e representavam prática corriqueira, passam a ser criminalizadas de forma objetiva: pichar e grafitar, por exemplo.

Bem, mas alguns defensores do meio ambiente passaram a condenar esta lei, em face da retirada de artigos que constavam do texto aprovado pelo Senado e de supostos vetos, que teriam sido garantidos pelo Executivo para possibilitar a votação e aprovação do projeto.

O projeto encaminhado pelo Executivo ao Congresso Nacional em 1991, contemplava os anseios da época. Se considerarmos a data da apresentação, e que de lá para cá a consciência ambiental cresceu em progressão geométrica, alavancada que foi pela Eco-92, pode-se até considerá-lo aquém das expectativas de hoje. Mas, não se pode negar que dessa iniciativa resultou o projeto ora aprovado, atual, moderno, avançado e abrangente.

Chega a ser singelo o espanto causado pelas alterações que a Câmara, em segunda votação, fez em um texto que saiu de seu Plenário com 27 artigos e voltou do Senado com 90. Ora, se a Câmara fosse composta só por deputados verdes ou ambientalistas, aí sim, caberia o espanto.

Quando Ary Barroso escreveu na Aquarela do Brasil, “… ah esse coqueiro que dá coco…”, acharam redundante. Mas no caso do atual projeto, a impressão que fica é que os críticos ferrenhos do projeto pareciam esperar que o coqueiro desse banana…

Depois, a lei é apenas um instrumento, uma ferramenta. Cabe a nós, cidadãos exercitá-la, implementá-la, dar-lhe vida. Há muito sabemos que ela não é um fim em si mesmo. Se fosse assim, nosso país ainda estaria coberto de pau-brasil. Afinal a primeira lei florestal brasileira foi o Regimento do Pau Brasil, em 1.605.

O que mais chama a atenção, no entanto, é a insistência de pseudolíderes e ventríloquos de fundações dissimuladas insistirem em desqualificar a lei, sob o argumento de que representa um retrocesso, ao invés de preferirem reconhecer os avanços, que são muitos.

Se tão ardorosos defensores do meio ambiente, por que então preferem ficar com a legislação anterior, em muitos pontos ultrapassada? Se reclamam providências enérgicas do Governo contra o desmatamento da Amazônia, por que tentam impedi-lo de contar com um instrumento mais ágil e eficaz? É grande a interrogação.

O ministro Gustavo Krause em recente artigo (Governo, oposição e o ‘mico’ da Amazônia – Folha/Opinião – 05.02) pergunta: a lei deixou de tipificar algum delito? Algum agente está fora do alcance da norma? A ação punitiva do IBAMA a partir de agora tem base legal? As respostas são óbvias, tanto que o desafio lançado não sofreu contestação.

No fundo o que fica é uma certeza: esses autoproclamados defensores ambientais estão se apoiando em argumentos frágeis como um lírio, em críticas rápidas e sem fundamento. E o que é mais triste, estão engrossando o lobby dos grandes degradadores e poluidores, ao preferirem o estado de coisas que reinava antes na lei da selva.

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