Hora extra

Peculiar condição biossocial da mulher é o que a diferencia do homem na CLT

Autor

6 de janeiro de 2016, 13h58

A peculiar condição biossocial das mulheres é o que lhes garante o intervalo de 15 minutos antes do início das horas extras e nega o mesmo benefício aos homens. Assim entendeu, de maneira unânime, a 2ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho ao negar a um vigilante bancário o pagamento relativo ao período de descanso que antecede o início das horas extraordinárias.

O intervalo de 15 minutos é previsto no artigo 384 da Consolidação das Leis do Trabalho, mas é válido apenas para mulheres. Tanto é que a norma que garante o benefício compõe o capítulo de proteção ao trabalho da mulher.

O empregado argumentou que também merecia o benefício, pois a Constituição Federal é expressa sobre a igualdade entre os sexos. O pedido foi rejeitado pelas cortes de primeiro e segundo graus. Para o Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (SC), o artigo 384 da CLT não foi recepcionado pela atual Constituição, porque cria "diferenciação injustificável" entre homens e mulheres.

Segundo a ministra Delaíde Miranda Arantes, relatora do processo no TST, o intervalo limita-se à mulher "por conta de sua peculiar condição biossocial". "Embora homens e mulheres sejam iguais em direitos e obrigações, suas diferenças psicossociais justificam o tratamento diferenciado em alguns aspectos", afirma.

A magistrada explicou também que o assunto tem sido amplamente discutido e que o TST segue mantendo o entendimento de afastar a inconstitucionalidade do referido artigo.

Entendimento do STF
Em novembro de 2014, ao negar o recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida (RE 658.312), o Plenário do Supremo Tribunal Federal, por maioria, firmou entendimento de que o artigo 384 da CLT foi recepcionado pela Constituição da República de 1988.

O ministro Dias Toffoli, que foi o relator do RE, ressaltou que o artigo 384 faz parte da redação original da CLT, de 1943. “Quando foi sancionada a CLT, vigorava a Constituição de 1937, que se limitou, como na Constituição de 1946, a garantir a cláusula geral de igualdade, expressa na fórmula ‘todos são iguais perante a lei’.”

“Nem a inserção dessa cláusula em todas as nossas Constituições, nem a inserção de cláusula específica de igualdade entre gênero na Carta de 1934 impediram, como é sabido, a plena igualdade entre os sexos no mundo dos fatos”, complementou.

Por isso, observou o ministro, a Constituição de 1988 estabeleceu cláusula específica de igualdade de gênero e, ao mesmo tempo, admitiu a possibilidade de tratamento diferenciado, levando em conta a exclusão da mulher do mercado de trabalho, a menor resistência física da mulher e o componente social, pela existência da “dupla jornada” — o acúmulo de atividades pela mulher no lar e no trabalho.

Toffoli ressaltou ainda que as disposições constitucionais e infraconstitucionais não impedem os tratamentos diferenciados, desde que essas diferenciações sejam embasadas em elementos legítimos e que as garantias sejam proporcionais às diferenças ou definidas por algumas conjunturas sociais. Segundo ele, o artigo 384 da CLT “trata de aspectos de evidente desigualdade de forma proporcional”.

Como exemplos dessa diferenciação, o ministro Dias Toffoli citou o prazo menor para aposentadoria, a cota de 30% para mulheres nas eleições e a Lei Maria da Penha. O relator também argumentou que o intervalo não prejudicaria o acesso da mulher ao mercado de trabalho.

“Não parece existir fundamento sociológico ou mesmo comprovação por dados estatísticos a amparar essa tese (…) Não há notícia da existência de levantamento técnico ou científico a demonstrar que o empregador prefira contratar homens, em vez de mulheres, em virtude dessa obrigação”, explicou o ministro, que teve seu voto seguido pelos ministros Gilmar Mendes, Celso de Mello, Rosa Weber e Cármen Lúcia.

Nesse julgamento, os ministros Luiz Fux e Marco Aurélio divergiram do relator e ficaram vencidos. Para Fux, o dispositivo viola o princípio da igualdade e, por isso, só poderia ser admitido nas atividades que demandem esforço físico. “É uma proteção deficiente e uma violação da isonomia consagrar uma regra que dá tratamento diferenciado a homens e mulheres, que são iguais perante a lei.”

No mesmo sentido, o ministro Marco Aurélio afirmou que o artigo 384 “é gerador de algo que a Carta afasta, que é a discriminação no mercado de trabalho”. Os dois ministros votaram no sentido de dar provimento ao recurso para reconhecer a inconstitucionalidade do artigo 384. Com informações da Assessoria de Imprensa do TST e do STF.

Clique aqui para ler o acórdão.
Recurso de Revista 82000-37.2009.5.12.0049

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!