Grande fiscalizador

O princípio da precaução e da insignificância no TCU

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28 de setembro de 2007, 0h00

Os Tribunais de Contas têm o dever constitucional de fiscalizar a boa aplicação da legislação pertinente às contratações do Poder Público. De há muito se discute a necessidade desses Tribunais atuarem mais no sentido preventivo do que repressivo (com aplicação de multas e declarações de nulidade) em virtude dos princípios constitucionais da economicidade, razoabilidade, eficiência e celeridade.

Muitas vezes se tem visto a declaração de nulidade emitida por um desses Tribunais quando a obra já está pronta e inaugurada o que prejudica a eficácia desse julgamento.

No entanto, agora cabe uma ressalva fundada na Instrução Normativa do Tribunal de Contas de União — TCU 52, de 4 de julho de 2007, que dispõe sobre o controle e a fiscalização de procedimentos de licitação, contratação e execução contratual de Parcerias Público-Privadas, a serem exercidas pelo TCU.

Princípio da Precaução

É inegável que a emissão desta norma administrativa visa atender ao princípio da precaução que vem a ser

“O fenômeno social traduzido no princípio de precaução levou, igualmente, ao desenvolvimento de uma filosofia da precaução construída com base em uma história da prudência, que revela, a princípio, o domínio do paradigma da responsabilidade, substituído na passagem para o século XX pelo da solidariedade…. Com efeito, a idéia moderna de responsabilidade buscava tornar o homem prudente, pois sancionava o comportamento contrário àquele que deveria e poderia ser previsto”1.

Como se nota, o princípio de precaução pode ser invocado sempre que seja necessária uma intervenção prudente em face de um possível risco para a sociedade em geral (envolve aqui os recursos públicos oriundos dos tributos de todos os contribuintes) que não permitam uma avaliação completa do risco. Não se trata de uma proteção sendo aplicado, sobretudo para os casos que possam acarretar prejuízos sociais e governamentais.

Há também que lembrar que este princípio — da cautela antecipada e preventiva — tem sua origem na política visando evitar ou minimizar o risco, tanto real como antecipado.

Pelas razões apontadas acima, de início já se confirma uma alteração comportamental do TCU quando no Artigo1º enuncia que a ele cabe acompanhar os processos de licitação, bem como, fiscalizar a execução dos contratos. Como se nota, poderá, ou melhor, ainda o TCU deverá realizar um acompanhamento a priori da Corte de Contas cooperando com todos os agentes públicos e privados, na melhor gestão dos recursos públicos e no melhor atendimento ao interesse público envolvido na contratação.

É presente no Direito Administrativo a existência do princípio da colaboração entre os entes públicos. Mas, o que sempre se viu foi uma ausência dessa atitude em virtude da fiscalização a posteriori. É claro que uma atitude não suprime a outra. Ao contrário, porque quando acompanha desde o início da licitação a fiscalização foi mais abrangente alcançando as diversas fases de um certame licitatório e a fase de cumprimento do contrato firmado.

Princípio da Insignificância

Adite-se a isso o fato de que no §1º do Artigo 3 dessa Instrução Normativa 52/07 o TCU informa que observará o “princípio da insignificância, de acordo com os critérios de materialidade, relevância, oportunidade e risco”. Esta é sem dúvida uma memorável opção na obtenção de resultados eficientes e eficazes na fiscalização do uso de recursos e bens públicos porque o TCU passa agora a preocupar-se, em tempo real, com o que realmente interesse deixando o que é objetiva e juridicamente insignificante.

Conforme se entende o princípio da insignificância largamente utilizado no Direito Penal significa uma moldura que reduz ou descaracteriza a materialidade/tipicidade do ato ilícito. Em linhas gerais já se pode depreender que o TCU aferirá o relevo material dos atos para concluir pela sua insignificância.

É mister se destacar a intenção patente do TCU na inclusão deste princípio nesta Instrução que mira na racionalidade administrativa e fiscalizatória. Em última análise a aplicação do princípio da precaução tem fundamento direto na razoabilidade, na proporcionalidade e na finalidade dos atos praticados pelos agentes públicos.

Em verdade o TCU atualiza-se para atender as demandas da sociedade do Século XXI onde a precaução é essencial para se alcançar o interesse público.

Comentários ao texto da Instrução do TCU

Essa Instrução aponta nos capítulos seguintes cinco Estágios de acompanhamento do processo de licitação que certamente promoverão uma maior segurança jurídica a todos os agentes sejam eles públicos ou privados. O Primeiro Estágio aponta que o acompanhamento será feito nas fases que precedem a licitação:i)pronunciamento ministerial, ii)autorização legislativa, iii)autorizações administrativas, iv) estudos de viabilidade.

No Segundo Estágio aponta a necessidade da manifestação acerca das questões suscitadas na consulta pública o que evidencia uma preocupação com os reais motivos da realização da consulta pública. Adite-se a isso o fato de também o TCU ter baixado essa Instrução para também acompanhar a aprovação do edital, as impugnações e os esclarecimentos divulgados.

Mais adiante, no terceiro Estágio, o TCU acompanhará a fase de habilitação, incluindo as decisões proferidas em recursos interpostos contra os resultados da fase de habilitação. As tarefas do Quarto Estágio serão acompanhar o julgamento das propostas (técnicas e econômico-financeiras) e possíveis questionamentos. Por último no quinto Estágio atos para a adjudicação, a constituição da SPE, a assinatura do contrato de concessão.

Há, no entanto, prevista nesta Instrução 52/07 do TCU, prazos peremptórios estabelecidos no Artigo 5º dessa norma fixando: 60 dias, no mínimo, para o primeiro Estágio; 5 dias, no máximo,para o segundo Estágio; 5 dias, no máximo para o terceiro Estágio; 5 dias, no máximo, para o quarto Estágio e 5 dias, no máximo, para o quinto Estágio. Com esta determinação se depreende que a entidade promotora da licitação deve atuar de forma eficiente e célere para atender a todos os prazos acima estabelecidos.

Em conseqüência, na fase de execução contratual, avaliará não só o fiel comprimento do contrato, bem como, as ações exercidas pelo órgão ou entidade federal concedente ou pela agência reguladora. Por conseguinte, o Poder Concedente qualquer que seja ele terá obrigação de informar ao TCU, com a devida fundamentação, vários eventos elencados no Artigo 9º da Instrução 52/07. Por iguais razões também deverá, o Representante do Poder Concedente manter arquivo atualizado de uma série de documentos incluindo os eventos de arbitragem, na conformidade da Lei Brasileira da Arbitragem, Lei 9.307/96. Por fim, informar o TCU, anualmente, sobre o desempenho do contrato de PPP.

Por fim, nas disposições finais, a Instrução 52/07 do TCU afirma que o responsável que deixar de atendê-la, salvo justo motivo, ficará sujeito à aplicação de multa na conformidade da Lei 84.443/92.

Em última análise se pode constatar que esta Instrução do TCU inova na atuação dessa Corte de Contas com ênfase na eficiência, ou seja, na virtude de alcançar o resultado desejado. Em razão disso foi imposta à administração pública federal um compromisso que pode minimizar muitos riscos evitando ou minimizando o aparecimento de conflitos entre os agentes econômicos e entre eles e o poder público.

Notas de rodapé

1- Princípio da Precaução – Dever do Estado ou Protecionismo Disfarçado, Sueli Gandolfi Dallari e Deisy de Freitas Lima Ventura, Scielo, vol.16, nº2, São Paulo. April/June/2002.

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