Prender não resolve

CPI ganharia se desse benefício em troca de colaboração

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12 de agosto de 2005, 17h50

Uma Comissão Parlamentar de Inquérito não é feita para que os depoentes tenham os dentes quebrados, como ameaçou fazer a afável senadora Heloísa Helena (PSOL-AL) com o empresário Marcos Valério de Souza durante depoimento à CPI do Mensalão na quarta-feira (10/8). O papel de uma CPI é fiscalizar atos do Poder Público e, caso se depare com indícios de crimes ou ilícitos civis, pode municiar o Ministério Público para que este dê andamento ao caso na esfera do Judiciário.

Em seu depoimento à CPI do Correios, um dia após o surto de valentia de Heloísa Helena, o publicitário Duda Mendonça demonstrou que a investigação parlamentar pode render melhores resultados quando o depoente se sente encorajado a “abrir seu coração”.

Sem ser atacado e humilhado por deputados e senadores blindados com a imunidade parlamentar, o marqueteiro de Lula confessou a prática de ao menos dois crimes: evasão de divisas e sonegação fiscal. Não foi preso ou humilhado e, agora, terá de acertar as contas com a Receita Federal. Bom para o erário e melhor para as investigações. “No caso relatado por Duda Mendonça, cometeu crime quem mandou o dinheiro, quem recebeu e quem orientou”, afirma o advogado Eduardo Diamantino.

De cara limpa, Duda deu mais pistas aos parlamentares sobre os fatos investigados do que todos os depoentes que o precederam munidos de Habeas Corpus preventivos contra uma eventual prisão em flagrante por falso testemunho. Também foi tratado com muito mais cordialidade por seus inquiridores.

Se existisse uma regra que garantisse ao depoente o direito de não ser preso ao contar aos parlamentares aquilo que eles querem saber, o resultado das CPIs seria, sem dúvida, mais proveitoso. No âmbito judicial, existe para isso a delação premiada, que propõe a troca de colaboração do investigado por benefícios penais. A legislação, no entanto, não prevê essa possibilidade no âmbito das Comissões Parlamentares de Inquérito.

Especialistas ouvidos pela revista Consultor Jurídico afirmam que uma proposta nesse sentido poderia vir por meio de um projeto de lei e seria juridicamente possível. O que não significa necessariamente que apóiam a idéia.

Lei de resultados

Segundo o advogado Mário de Oliveira Filho, a proposta seria bem vinda com parâmetros bem definidos. “O depoente não deixaria de responder por eventuais crimes confessados, mas não passaria pelo constrangimento de ser preso sob os holofotes de uma CPI”, afirma.

Para Oliveira Filho, na prática, o resultado seria melhor para as investigações. Concorda com ele o professor Luiz Flávio Gomes. “Aquele que vai a uma CPI, relata detalhes que ajudam nas investigações e tem residência fixa não deveria ser preso, ao menos até decisão final da Justiça”, afirma.

De certa forma, a proposta seguiria o princípio do Projeto de Lei 5.228, em discussão no Congresso Nacional, que extingue a punibilidade daqueles que legalizarem dinheiro não declarado ou repatriarem recursos mantidos em contas no exterior.

Para o advogado Jair Jaloreto Junior, a proposta é viável juridicamente, mas é imoral. “Uma proposta com esse teor colide frontalmente com todos os princípios basilares do Direito Penal. Seria a universalização do instituto do arrependimento eficaz”.

O procurador-regional da República Luiz Carlos dos Santos Gonçalves não acredita na proposta. “A lei já prevê a delação premiada, que pode chegar até ao perdão judicial e é suficiente para os casos de colaboração”.

Gonçalves acredita que os parlamentares têm exagerado na argüição dos depoentes. “O método de intimidar, na prática, mais atrapalha do que ajuda as investigações”. Mas, para o procurador, “se a CPI não tiver nenhum poder coercitivo não vai funcionar”.

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