A nova Justiça

Falta de efeito vinculante na Justiça significa apartheid social

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23 de abril de 2004, 17h08

A busca da eficiência e o combate à morosidade da Justiça foram os temas dominantes na abertura do seminário A Nova Justiça, no Hotel Costão do Santinho, em Florianópolis. O seminário, promovido pela revista Consultor Jurídico, lotou o auditório do hotel.

O governador de Santa Catarina, Luiz Henrique da Silveira, abriu os debates após a apresentação do evento feita pelo diretor da revista Consultor Jurídico, Marcio Chaer.

Coube ao ministro Gilmar Mendes traçar um quadro das dificuldades enfrentadas no Supremo Tribunal Federal e, por extensão, em todo o Poder Judiciário. Lembrou que estão acumulados no STF, à espera de julgamento, 160 mil processos. Cada ministro recebe mil novos processos por mês para serem julgados, uma tarefa humanamente impossível de ser cumprida. O resultado é que um processo leva, em média, 12 anos para ser julgada no país.

“Por todas estas razões, seria muito mais eficiente trabalhar com um referencial temático”, disse o ministro ao defender a adoção da Súmula Vinculante. “Queremos uma corte constitucional e não queremos efeito vinculante?” argumentou. Para ele, a morosidade e a ineficiência da Justiça acabam prejudicando diretamente o cidadão: “A falta de efeito vinculante significa um apartheid na Justiça e um apartheid social”.

Para Gilmar Mendes, a reforma legislativa também é ponto fundamental para a reformulação do Judiciário. “É preciso objetivar os processos. A legislação deveria contribuir nesse sentido, deixando as coisas mais simples e objetivas”.

O advogado Ricardo Tosto, falando em nome da Comissão de Reforma do Judiciário da OAB paulista, também recorreu às estatísticas para falar da necessidade de mudanças na administração de Justiça: “Apenas 20% da população recorre aos tribunais e ainda assim a Justiça está entupida de processos”, disse Tosto. “Imagine como seria a situação se toda a população tivesse acesso à Justiça”. Segundo o advogado, a lentidão da Justiça causa um prejuízo de 10 bilhões ao país.

Em busca de maior agilidade e de melhor qualidade e mais previsibilidade na resolução dos processos, a OAB-SP defende na reforma do Judiciário a criação de Câmaras Especializadas, ao mesmo tempo em que apóia a manutenção dos Juizados Especiais. Para Tosto, esta experiência significou um grande avanço ao facilitar o acesso da população à Justiça. Outra sugestão da OAB-SP no âmbito da reforma, é a reunião dos assuntos repetidos de um tribunal para serem julgados em conjunto.

Tosto, ao contrário de Gilmar Mendes, discorda que a adoção da Súmula Vinculante possa trazer benefícios, preferindo em seu lugar a adoção da Súmula Impeditiva. Manifestou também posição favorável ao controle externo, não só da magistratura, como também do Ministério Público.

“O controle externo não vai mudar absolutamente nada”, rebateu Domingos Franciulli Netto, ministro do STJ, que ocupou o microfone logo depois de Tosto. Aproveitou para criticar a posição da OAB: “A OAB caminha pelo politicamente correto, desprezando a funcionalidade das medidas para a reforma. O controle externo não resolverá os problemas do Judiciário”.

O ministro afirmou que para tirar o Judiciário do caos em que se encontra é preciso um reforço de verbas e uma reformulação das leis de organização do Judiciário visando a adaptá-las às necessidades dos tempos atuais.

Franciulli Netto se posicionou contra a quarentena prevista para os magistrados que se aposentam: “A quarentena é uma reserva de mercado. Porque temos que ficar 3 anos sem advogar? Por acaso saímos da magistratura com algum vírus?”

Rodrigo Bornholdt, professor e mestre em Direito Constitucional, lamentou que o debate sobre a questão da Súmula Vinculante está perdendo o caráter técnico, que deveria norteá-lo, e ganhando um viés ideológico: “Acredito que a Súmula seja um alívio para a população que sofre com a lerdeza do Judiciário”.

Bornholdt disse acreditar, no entanto, na necessidade de maior reflexão antes de sua implementação para evitar que ela engesse o sistema: “É preciso colocar algumas condições para que a Súmula Vinculante seja realmente eficiente e assegure o direito dos cidadãos.”

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