Devemos conversar com as polícias
22 de fevereiro de 2020, 10h03
*Artigo originalmente publicado no jornal O Estado de S. Paulo, no dia 22 de fevereiro de 2020.
O Poder Judiciário brasileiro vem sendo convocado a contribuir com soluções efetivas para enfrentar o grave problema da segurança pública em nosso país, o que inclui o estado inconstitucional em que se encontram nossas prisões e o desafio de consolidar canais permanentes de diálogo interinstitucional que apoiem o trabalho daqueles que atuam na ponta.
Vamos intensificar o relacionamento já existente com as polícias para subsidiar a construção de estratégias do Judiciário em matérias associadas à segurança pública e ao sistema de Justiça Criminal, aperfeiçoando e, se for o caso, revisando procedimentos e fluxos de trabalho. Identificaremos gargalos entre o trabalho policial e o funcionamento do processo penal. E ampliaremos o conhecimento a respeito da percepção dos policiais quanto aos procedimentos penais, desde a abordagem policial até a execução da pena, passando pela investigação e pela fase processual, bem como pela forma de interação do Judiciário com as policiais.
Para aumentar o nosso alcance e potencializar resultados teremos o apoio do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, entidade reconhecida por seu trabalho na produção e compilação de dados e informações sobre segurança pública. Sua missão será ouvir todos os setores das polícias, sem viés corporativo ou institucional, contando com a capilaridade de uma rede de associados que inclui profissionais de todas as regiões do nosso país.
A partir do que já foi observado, há ganhos possíveis em novos fluxos que aproximem magistrados das particularidades da atividade policial e que, por outro lado, integrem as polícias cada vez mais às rotinas judiciárias, tão importantes nas fases investigativas para garantir o bom andamento dos processos em fases posteriores. Não há lados nessa história e tanto o ritmo das ruas quanto as formalidades processuais são duas perspectivas de uma mesma realidade. Precisamos, sim, trabalhar para que as engrenagens do sistema funcionem em sintonia, a favor de uma Justiça de qualidade.
A necessidade dessa pesquisa se tornou indiscutível a partir dos avanços do programa Justiça Presente, parceria inédita entre o CNJ e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), com o suporte do Ministério da Justiça e Segurança Pública, para o enfrentamento de problemas históricos no sistema prisional e no sistema socioeducativo.
Iniciado em janeiro de 2019, o programa trabalha 19 iniciativas simultâneas que consideram todo o ciclo penal, apostando no amplo envolvimento de atores do poder público e da sociedade civil. O intuito é fortalecer instituições e órgãos locais para o desenvolvimento de ações com foco na responsabilização em meios adequados, maior eficiência na gestão com apoio da tecnologia e estruturação de serviços para racionalizar a porta de entrada, qualificar a porta de saída e promover políticas de cidadania. Conforme o programa se desenvolve, é cada vez mais evidente a mensagem de que não há propostas possíveis para a superação de fraturas do sistema prisional que desconsiderem as interfaces com o trabalho das polícias.
Acreditamos que a construção de soluções para a segurança pública passa pela elaboração de diagnósticos baseados em evidências e procedimentos cientificamente comprovados. Muito se faz em várias esferas, instituições e Poderes, mas cada vez mais temos percebido que gestão e tecnologia, quando bem planejadas, são instrumentos fundamentais para unir esforços e melhorar nossas respostas às demandas da sociedade por justiça e cidadania. Partindo dessas premissas, apresentaremos em breve o resultado dessa pesquisa com subsídios para a implementação de melhorias capazes de aperfeiçoar o nosso sistema penal, reduzir a violência e enfrentar as diversas dinâmicas de violência e criminalidade.
O Estado é um só e sua função – por meio dos três Poderes da República, das funções essenciais à Justiça, da polícia judiciária e de todas as suas esferas e áreas de atuação – é atender ao bem comum. O desafio está lançado. Desde já, agradecemos aos que colaboraram e participaram.
Justiça Presente!
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