Tema 1.046 do STF e a flexibilização de direitos na Justiça do Trabalho
1 de maio de 2025, 17h27
A relação entre empregados e empregadores tem passado por mudanças significativas nos últimos anos, especialmente após a reforma trabalhista de 2017 (Lei 13.467/2017). Um dos pontos mais relevantes dessa transformação está previsto no artigo 611-A da legislação trabalhista e diz respeito à possibilidade de que acordos e convenções coletivas possam prevalecer sobre a própria lei. Essa discussão chegou ao Supremo Tribunal Federal, que a consolidou no julgamento do Tema 1.046, estabelecendo diretrizes importantes sobre os limites da negociação coletiva.

No julgamento, o STF firmou o entendimento de que acordos e convenções coletivas de trabalho podem restringir ou limitar direitos trabalhistas previstos em lei, desde que não se trate de direitos absolutamente indisponíveis. Isso significa que, com a participação do sindicato da categoria, é possível flexibilizar certos aspectos da legislação, desde que não se ultrapassem os limites constitucionais mínimos de proteção ao trabalhador.
Para entender essa decisão, é essencial distinguir dois conceitos-chave: direitos disponíveis e direitos indisponíveis. O primeiro é aquele sobre o qual o trabalhador pode negociar ou até mesmo abrir mão, total ou parcialmente, por meio da atuação sindical. Fazem parte desse grupo itens como jornada de trabalho (desde que respeitados os limites constitucionais), banco de horas, participação nos lucros, planos de cargos e salários, entre outros.
Já o segundo, previsto no artigo 611-B da CLT, é aquele considerado essencial à dignidade do trabalhador e que, portanto, não pode ser objeto de renúncia, mesmo com anuência do sindicato. Neste caso, são exemplos o salário-mínimo, o pagamento de férias com adicional de um terço, o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), o seguro-desemprego, as normas de saúde e segurança no trabalho e os limites máximos de jornada previstos na Constituição.
A decisão do STF, portanto, reforça o papel da negociação coletiva como instrumento legítimo de flexibilização das relações de trabalho, desde que respeitados os direitos fundamentais dos trabalhadores. Esse posicionamento confere maior segurança jurídica às empresas e aos sindicatos que atuam de maneira responsável na busca por soluções que conciliem os interesses das partes.
Jurisprudência relutante e reação das empresas
Recentemente, a 5ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho, ao julgar o agravo de instrumento em recurso de revista do processo nº 20460-39.2014.5.04.0015, reafirmou que os vales-alimentação e refeição (VA e VR) não configuram direitos absolutamente indisponíveis e, portanto, podem ser objeto de negociação coletiva. A decisão foi tomada pela Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1), que reconheceu a validade de cláusula que previa a suspensão temporária desses benefícios durante a pandemia, em acordo firmado entre empresa e sindicato.

A corte destacou que tais verbas possuem natureza indenizatória e, portanto, são passíveis de flexibilização, reforçando o entendimento de que acordos e convenções coletivas podem prevalecer sobre a lei quando não envolvem direitos essenciais à dignidade do trabalhador, em consonância com o que já foi estabelecido pelo STF no julgamento do Tema 1.046.
A aplicação desse entendimento para alguns temas ainda encontra resistência em parte da jurisprudência trabalhista. Todavia, com o respaldo do julgamento do STF, muitas empresas têm adotado uma postura mais proativa nas negociações sindicais, buscando adequar regras trabalhistas às suas necessidades operacionais, flexibilizando intervalos entre jornadas, a compensação, o banco de horas, a implementação de escalas diferenciadas, dentre outros.
Em suma, o Tema 1.046 representa um marco importante para a valorização da negociação coletiva no Brasil, mas também exige atenção na flexibilização para trabalhadores, sindicatos e empresas. Sendo certo que o desafio está em usar esse instrumento de forma equilibrada, garantindo segurança jurídica, sem impactar em renúncia às proteções asseguradas pela Constituição e pela CLT.
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