Opinião

Desoneração da folha: uma perspectiva jurídica sobre sua legitimidade e constitucionalidade

Autor

  • Leonardo Roesler

    é advogado tributário e empresarial com especialização em Direito Tributário pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) bacharel em Administração pela Universidade do Vale do Itajaí (Univali) e mestre em Administração e Finanças pela Ohio University.

18 de janeiro de 2024, 9h13

Em uma análise criteriosa sobre a questão da desoneração da folha de pagamento, alegada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, como inconstitucional, deve-se considerar diversos aspectos jurídicos e constitucionais relevantes. Ao contrário da interpretação apresentada pelo ministro, a prorrogação da desoneração da folha de pagamento para os 17 setores mencionados não viola preceitos constitucionais, tendo em vista que se ancora em sólidas bases legais e constitucionais.

Primeiramente, é fundamental reconhecer que a desoneração da folha de pagamento, enquanto mecanismo de incentivo fiscal, tem sido um instrumento eficaz na promoção do emprego e na dinamização da economia em setores estratégicos. A extensão dessa política, que permite a substituição da contribuição previdenciária patronal de 20% por alíquotas que variam de 1% a 4,5% sobre a receita bruta, não configura a instituição de um novo benefício, mas sim a prorrogação de uma medida já existente. Essa continuidade é essencial para assegurar a estabilidade econômica e a segurança jurídica necessária para o planejamento empresarial.

No que tange à constitucionalidade da medida, é imprescindível destacar que a desoneração em questão está fundamentada no § 9° do artigo 195 da Constituição, modificado pela Emenda Constitucional n° 47, de 2005. Esta norma autoriza expressamente a diferenciação das alíquotas ou bases de cálculo das contribuições sociais em razão de variados critérios, como a atividade econômica ou a utilização intensiva de mão-de-obra. Portanto, a desoneração da folha não se distancia dos limites constitucionais previstos para a política tributária.

Ademais, é crucial considerar que a Emenda Constitucional n° 103, de 2019, conhecida como reforma da Previdência, não eliminou a possibilidade de prorrogação das desonerações já autorizadas anteriormente. O artigo 30 da Emenda Constitucional n° 103 estabelece claramente que a vedação à adoção de base de cálculo diferenciada não se aplica às substituições instituídas antes de sua entrada em vigor. Portanto, a prorrogação da desoneração da folha de pagamento, uma medida já em vigor, está em plena conformidade com o texto constitucional.

Além disso, a posição adotada pelo STF por meio do voto do então ministro Ricardo Lewandowski e a manifestação favorável da Procuradoria-Geral da República reforçam a legalidade da desoneração. Estes órgãos, que são pilares do sistema jurídico brasileiro, reconheceram a constitucionalidade da medida e a importância de sua manutenção para a estabilidade econômica, especialmente em um contexto desafiador como o da pandemia de covid-19.

Outro ponto a ser enfatizado é que a extensão da desoneração da folha de pagamento não viola o princípio da razoabilidade e da proporcionalidade. Pelo contrário, representa uma ação equilibrada do Estado, que busca fomentar a economia em setores vitais, sem comprometer o financiamento da seguridade social. A medida se alinha ao objetivo maior da Constituição de promover o desenvolvimento econômico e social.

A interpretação restritiva das normas que criam excepcionalidades, como orienta a hermenêutica constitucional, apoia a tese de que a prorrogação da desoneração está em conformidade com a Constituição. A legislação em vigor, instituída antes da Emenda Constitucional n° 103, é resguardada pela norma transitória do artigo 30 da referida emenda, assegurando a continuidade das políticas fiscais já estabelecidas.

É também relevante notar que a manutenção da desoneração da folha de pagamento não implica em renúncia fiscal irresponsável ou descontrolada. Pelo contrário, trata-se de uma escolha política e econômica deliberada, que se insere no contexto mais amplo da política fiscal do país e tem demonstrado resultados positivos em termos de manutenção e geração de empregos.

Por fim, é preciso considerar a importância da segurança jurídica e do planejamento econômico. A desoneração da folha de pagamento, ao ser prorrogada, oferece às empresas dos setores beneficiados a previsibilidade necessária para planejar investimentos e estratégias de longo prazo. Essa estabilidade é crucial para a manutenção do emprego e o crescimento econômico, especialmente em um período de recuperação pós-pandemia.

A medida válida, em plena conformidade com a Constituição e as normas tributárias vigentes, é um instrumento necessário para assegurar o desenvolvimento econômico sustentável e a estabilidade do emprego no país, respeitando os preceitos constitucionais e legais.

Autores

  • é advogado, sócio da RMS Advogados, mestre em Administração e Finanças pela Ohio University, especialista em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), bacharel em Ciências Contábeis pelo Centro Universitário Leonardo da Vinci (Uniasselvi), especialista em Direito Tributário pela FGV, bacharel em Administração pela Universidade do Vale do Itajaí (Univali) e bacharel em Direito com Dupla Titulação Internacional pela Univali.

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