Opinião

Comentários sobre a nova Lei de Agrotóxicos

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17 de janeiro de 2024, 19h12

O ano de 2023 se iniciou com a vigência da nova Lei nº 14.785/2023, publicada em 27 de dezembro de 2023, que regula a utilização de agrotóxicos, dentre outras disposições, substituindo a antiga Lei nº 7.802/1989. Essa mudança trouxe um perfil mais técnico e descritivo ao diploma legal, que abrange aspectos relacionados aos resíduos, suas embalagens, o registro, classificação, controle, inspeção e a fiscalização de agrotóxicos e outros produtos de controle ambiental e correlatos. Já no artigo 2º da lei, verificam-se classificações importantes, que podem servir de guia à intepretação do próprio texto legislativo, mas também tendem a estabelecer parâmetros à intepretação de regulamentos diversos, relacionados ao setor agrícola.

Outro ponto de destaque consta no artigo 3º da lei, que fixa prazos máximos para a conclusão dos pleitos de registro dos produtos, enfim alocando bases importantes à regulamentação do setor, trazendo segurança e possibilidade de planejamento aos operadores do âmbito privado, afastando-se entraves burocráticos típicos ao setor estatal, ainda criando o Registro Especial Temporário (RET), a fim de prospectar novos produtos destinados à pesquisa e experimentação.

A nova lei também exclui hipóteses externas de impugnação aos registros de agrotóxicos e afins, como partidos políticos, entidades de classe, dentre outros, afastando o caráter meramente político desses pleitos, agora estabelecendo a função fiscalizatória precipuamente aos órgãos governamentais relacionados à agricultura e ao meio ambiente, com perfis notoriamente mais técnicos. Os registros dos produtos abrangidos pela lei devem ser realizados junto ao órgão federal vinculado à agricultura, enquanto os órgãos vinculados à saúde e meio ambiente possuem função consultiva, de apoio revisional ou registral, neste último caso, quando os produtos possuírem relevância específica ao controle ambiental.

No aspecto legislativo e regulamentar, cabe precipuamente à União a edição das normas correlatas, concedendo aos estados e Distrito Federal competência suplementar no que concerne a todo o conteúdo da lei. Aos municípios a competência suplementar se adere apenas ao uso e armazenamento dos agrotóxicos, dos produtos de controle ambiental e seus consectários. A fiscalização continua sob o exercício dos órgãos respectivos da União, estados e municípios. Porém, aos estados e Distrito Federal é franqueado o acesso aos registros existentes em órgãos federais, subsidiando o exercício fiscalizatório.

Na lei também foi instituído o Sistema Unificado de Cadastro e de Utilização de Agrotóxicos e de Produtos de Controle Ambiental Informatizado, que englobará o trato oficial da emissão de registros e receituários, os quais seguirão parâmetros preestabelecidos em sistema, além de anotar todos os operadores do setor, incluindo pessoas jurídicas, engenheiros agrônomos, produtores, dentre outros. Esse sistema denota um avanço relevante no setor agrícola, a par da regulamentação ainda pendente, e demandará adequação nos próximos meses. Sobretudo, o sistema unificado afastará subjetivismos na interpretação da regulamentação em âmbito privado, novamente homenageando a segurança jurídica, celeridade e transparência no trato com os agrotóxicos e produtos de controle ambiental.

 A responsabilização com base na nova Lei nº 14.785/2023 restou dividida de forma mais clara, constando capítulos específicos, sendo o primeiro para responsabilidade civil e administrativa e o segundo para os crimes e suas penas. Em leitura criteriosa, a lei ainda mantém alto grau de abstração e subjetividade no que concerne aos crimes nela previstos, já que, de acordo com o artigo 57, qualquer comercialização de agrotóxicos que se considere em desacordo com suas disposições, ainda pode se interpretar crime, punível com pena de reclusão de dois a quatro anos e multa.  É verdade que o artigo 51 da nova lei absorve quase que a literalidade do artigo 15 da antiga Lei nº 7.802/1989, redirecionando seus termos para infração administrativa, enxugando a aplicabilidade de gravosas responsabilizações criminais, especialmente voltado ao exercício das atividades dos engenheiros agrônomos. Mas o excesso de abertura do sequencial artigo 57 ainda traz grandes riscos, que devem ser monitorados no exercício de qualquer atividade, quando o seu fim resultar na efetiva comercialização de agrotóxicos.

Em suma, a Lei nº 14.785/2023 corresponde a mais um passo importante e positivo na organização do setor agrícola, premiando-o com maior segurança jurídica. Porém, necessário acompanhar a regulamentação da lei por meio de decretos e regulamentos administrativos, os quais detalharão os parâmetros de efetividade no dia a dia do campo. Ademais, a responsabilização no âmbito criminal ainda possui alto grau de abstração e subjetividade, o que exige atenção dos operadores, a fim de garantir a legalidade e adequação no exercício das suas atividades com o exigido pela legislação.

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