Opinião

Execução provisória dos honorários sucumbenciais em face da apelação cível

Autor

  • Kennedy Bispo

    é graduando da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT) e membro do Grupo de Pesquisa em Direito Constitucional e Hermenêutica (Gconst).

14 de abril de 2024, 9h12

Questão interessante é sobre a possibilidade de ser instaurado o cumprimento provisório de sentença na pendência do julgamento de um recurso de apelação.

Em regra, pela leitura conjunta dos artigos 520 e 1.012 do CPC/15, seria possível responder que não há essa possibilidade, pois a apelação é o recurso ordinário por excelência e, pela previsão contida no Código de Ritos, possui efeito suspensivo ope legis, ou seja, que independe de declaração judicial, uma vez que decorre da lei.

Tal entendimento comporta exceções previstas na própria lei adjetiva.

Trata-se dos casos enunciados no artigo 1.012, § 1º do CPC/15.

Caso a sentença contra a qual o apelo é movido, por exemplo, conceder, modificar ou revogar uma tutela de urgência, os efeitos serão cindidos, ou seja, o título recorrido terá mais de um capítulo.

Segundo José Roberto dos Santos Bedaque, em casos como esses, “no que se refere aos efeitos antecipados, o julgamento é imediatamente eficaz, ainda que suscetível de apelação”. Em outras palavras, embora a sentença seja una, mesmo na pendência de uma apelação, pode-se executar antecipadamente o título.

A lógica processual de prestação antecipada da tutela advém justamente da compreensão de que o bem da vida não pode, após uma primeira cognição de mérito, ficar sujeitado ao trânsito em julgado adquirido no esgotamento de inúmeros recursos possíveis.

Mais exceções

Entretanto, isso ainda comporta novas exceções a serem observadas.

É que apenas quanto ao conteúdo – ou capítulo – da tutela de urgência que a sentença poderá ser executada, embora na pendência de um recurso com efeito suspensivo. Essa cautela, no mais das vezes, não é fielmente observada.

Spacca

Imaginemos, pois, que em uma sentença fora (1) concedida uma tutela cujo conteúdo versava sobre a obrigação de entregar coisa certa, (2) arbitrado o percentual dos honorários de sucumbência e (3) imposta uma condenação de pagar quantia certa.

Nessa ordem de ideias, havendo o manejado de um apelo, apenas pode ser executada provisoriamente a obrigação de entregar coisa certa, mas os demais capítulos da sentença ficariam preservados no efeito suspensivo ope legis do artigo 1.012 do CPC/15.

Execução dos honorários

Contudo, quando em vez é constatada a execução dos honorários sucumbenciais na pendência do julgamento da apelação. Salvo raras exceções, isso não é possível. Embora o honorário não constitua capítulo independente, ele possui autonomia bastante para cindir o título judicial.

Isso porque na sistemática do CPC/15, como a sucumbência constituí um direito subjetivo do advogado, embora dependente e assessória, não se trata de questão meramente processual, mas igualmente material, o que autoriza inclusive sua execução ou recurso em apartado.

Melhor explicando, com relação à condenação em honorários, na sentença, ela é capítulo autônomo – veja, não se fala em capítulo independente [1]. Entretanto, sabe-se que é um capítulo autônomo e um capítulo subordinado [2] ao principal e, aqui, não é atraída a gravitação jurídica para que, aos fins de recorribilidade, a sorte dos efeitos conferidos ao capítulo principal seja atribuía ao subordinado, pois é possível apelar e executar autonomamente apenas esse capítulo (sucumbencial), pois veicula direitos subjetivos do advogado [3].

Nessa ordem de ideias, sendo um capítulo autônomo, não acompanha a sorte daqueles sobre os quais versam os incisos do § 1º do artigo 1.012 do CPC/15, pelo que – prima facie – não é possível falar na sua exigibilidade na pendência da apelação.

No passado, o Superior Tribunal de Justiça pronunciou que “Sobre os efeitos do recebimento da Apelação, o entendimento desta Corte é de que o art. 520, VII, do CPC deve ser interpretado de forma teleológica, razão pela qual, ainda que a antecipação da tutela seja deferida na própria sentença, a Apelação contra esta interposta deverá ser recebida apenas no efeito devolutivo em relação à parte em que foi concedida a tutela” [4].

Portanto, neste particular é induvidosa a existência dos efeitos cindidos sobre o recurso de apelação ao modo de obstar o manejo do cumprimento provisório de sentença das verbas sucumbências – capítulo autônomo e subordinado de conteúdo material e processualmente considerado – na pendência do seu julgamento pelo Tribunal de Justiça.

Tudo isso, a meu vezo, decorre da interpretação do sistema recursal instituído pelo CPC/15, o que torna inexigível, nesses casos, a declaração judicial quando ao efeito em que o apelo é recebido, mesmo porque, como cediço, em tal espécie recursal ainda é exercida uma atividade cognitiva ampla e, a sucumbência, não é certa.

* O presente artigo é objeto dos debates entre este pesquisador e o advogado tributarista Lucas Henrique Müller Pirovani.

 


[1] Na teoria dos capítulos de sentença, autonomia não é sinônimo de independência, havendo capítulos que comportariam julgamento em outro processo e também, em alguns casos, capítulos que não o comportariam (especialmente o que rejeita preliminares). DINAMARCO, Cândido Rangel. Capítulos de sentença. 7. ed. São Paulo: Malheiros. p. 42.

[2] Existem capítulos que sobrevivem por si e em si, não necessitando de outros para a produção de seus regulares efeitos. São os capítulos principais. Contudo, existem determinados capítulos em que sua existência depende do capítulo principal. Os honorários e a correção monetária são subordinados à existência de outro capítulo. SÁ, Renato Montans de. Manual de direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 483.

[3] A natureza dos honorários advocatícios já foi estabelecida em Recurso Especial representativo de controvérsia (STJ, REsp. 1.113.175/DF, min. CASTRO MEIRA, Corte Especial, DJe. 07/08/2012.).

[4] STJ, AgRg no AREsp. 469.551/SP, min. Sidnei Beneti, DJe. 28/04/2014.

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