Opinião

Matriz de materialidade, negócios de impacto e projetos incentivados

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13 de setembro de 2023, 18h24

Qual é o propósito de tudo isso? Esta é uma pergunta existencial que aflige os seres humanos desde tempos imemoriais, mas que agora segue sendo repetida diariamente no mundo corporativo, especialmente quando profissionais se deparam com as exigências do chamado novo capitalismo de stakeholder.

As exigências do tripé ESG (ou ASG: ambiental, social e governança) impostas por autoridades regulatórias (em especial a Comissão de Valores Mobiliários) são a principal expressão desse novo tempo e fazem com que as empresas sujeitas à atividade de fiscalização da CVM (dadas as suas categorias A e B) elaborem relatórios periódicos nos quais informam ou explicam, isto é, descrevem uma série complexa de informações ou justificam a sua falta de divulgação.

Como são empresas que captam recursos no mercado, devem então ter um alto grau de transparência e, por siso, devem relatar os efeitos relevantes da regulação estatal sobre suas atividades e, principalmente, devem informar o histórico de cumprimento das obrigações legais e regulatórias ligadas a questões ambientais e sociais.

Este relatório deve expor ainda a sua metodologia e informar se é auditado ou não por terceira parte independente, se leva em consideração uma matriz de materialidade e indicadores-chave de desempenho ASG, assim como deve informar se considera os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) estabelecidos pela Organização das Nações Unidas e as recomendações da Força-Tarefa para Divulgações Financeiras Relacionadas às Mudanças Climáticas (TCFD), indicando também se há inventários de emissão de gases do efeito estufa ou não.

Ou melhor, as empresas submetidas às normas da CVM devem ser capazes de identificar os temas que são caros à comunidade que lhe cerca por meio da matriz de materialidade e relatá-los às autoridades e ao mercado, assim como devem ser capazes de mostrar com muita assertividade como lidam com esses temas sociais e ambientais que identificam. Em síntese, devem demonstrar que têm propósito. Mas é certo que ter propósito não é prerrogativa apenas das empresas reguladas pela CVM.

Ao contrário, toda e qualquer empresa pode ter propósito. Afinal, o artigo 154 da Lei das S.A. determina que a toda companhia deve satisfazer "as exigências do bem público e da função social da empresa". A questão então passa a ser: como encontrar o seu propósito e como colocá-lo em prática? E a resposta que parece ser mais assertiva é a seguinte: a matriz de materialidade é a ferramenta de diagnóstico, assim como os negócios de impacto e os projetos incentivados são as ferramentas para a sua concretização.

Em outras palavras, uma alternativa para as empresas enfrentarem esse desafio de satisfazer ou resolver os temas identificados na matriz de materialidade é investindo em negócios de impacto, que são os "empreendimentos com o objetivo de gerar impacto socioambiental e resultado financeiro positivo de forma sustentável", passaram a ter uma nova regulamentação, o Decreto Federal nº 11.646/2023, que revogou o anterior de 2019 e promete criar as condições institucionais para ampliar a oferta de capital público e privado direcionado para o financiamento dessas atividades que são capazes de demonstrar o seu propósito sustentável (tanto do ponto de vista social quanto do ambiental), por meio de políticas públicas e mudanças institucionais e jurídicas sugeridas pelo o Comitê de Economia de Impacto, no qual haverá participação de entidades estatais, do mercado e da sociedade civil organizada.

Outra forma de enfrentar os temas identificados na matriz de materialidade é por meio do empreendedorismo social realizado com projetos incentivados por renúncia fiscal, que são aprovados pelas instâncias da União, estados e municípios competentes para a formulação de políticas públicas de cultura, audiovisual, meio ambiente, esporte e de proteção da criança, do adolescente, do idoso, do PCD etc.

Por exemplo, as empresas contribuintes do Imposto de Renda pelo regime do lucro real podem destinar até 8% do seu imposto devido, sendo 4% para cultura com base na Lei Rouanet, 2% com base na Lei de Incentivo ao Esporte, 1% para Fundo do Idoso e 1% para o Fundo da Infância e Adolescência. A propósito, esses investimentos não são concorrentes entre si e, pelo contrário, complementam-se na medida em que podem ser realizados dentro do mesmo ano fiscal. Do mesmo modo, as empresas contribuintes de ICMS ou ISS também podem investir parte dos tributos que deixam de recolher de acordo com as normas regionais e locais.  

Enfim, historicamente as empresas que investiam em projetos incentivados tinham o foco na promoção da sua imagem institucional, ainda na busca de um melhor posicionamento de suas marcas no mercado e, por conta disso, a escolha dos projetos se dava, predominantemente, com critério da maior exposição possível. Essa abordagem, apesar de legítima, vem sendo paulatinamente substituída por uma outra em que o propósito é definido pelos resultados almejados a partir do diagnóstico da matriz de materialidade.

Ou seja, a escolha de projetos incentivados passa a se dar a partir de uma identificação clara acerca das questões que são caras à comunidade de trabalhadores, consumidores, vizinhos e investidores na qual a empresa está inserida. Assim, as empresas que investem em projetos incentivados e negócios de impacto com governança e transparência podem efetivamente alcançar o propósito desejado, satisfazendo efetivamente os seus stakeholders.

Por fim, cabe dizer então aos profissionais que se preparem para identificar e aproveitar essas oportunidades. Afinal, o mercado está cada vez mais orientado por padrões ESG de performance, o quais exigem um avanço em relação aos standards anteriores de gestão.

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