Opinião

A regulamentação das sustentações orais

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20 de outubro de 2023, 9h19

Consta que, pouco antes de morrer, Mozart recebeu uma carta de um menino de 15 anos de Praga, indagando como fazer uma sinfonia, e respondeu: ainda é muito cedo. Insistente, o menino redarguiu, alegando que Mozart tinha feito sua primeira sinfonia aos nove anos. O gênio respondeu: mas eu não perguntei a ninguém como se fazia.

Estar ou não preparado para desafios importantes na vida é sempre um dilema. Como – e quando – um advogado está pronto para fazer uma sustentação oral? E para sustentar perante o Supremo Tribunal Federal? Esse momento, que é — ou deveria ser — motivo de elevada honra para qualquer advogado que milite no contencioso, merece ser vivenciado com liturgia e sobriedade.

Todavia, episódios recentes escancararam uma mazela conhecida há muito pela comunidade jurídica: o despreparo de alguns advogados para atuar nas tribunas, especialmente a da Corte Suprema.

Ao ocuparem a tribuna sagrada, alguns colegas insistem na leitura de textos, repetição das peças do processo ou até em manifestações de caráter estritamente político, com ataques aos ministros e pouca ou nenhuma manifestação de natureza técnica. Há, é evidente, uma verdadeira banalização do uso da palavra, agravada pelo cada vez mais incontido desejo de "lacrar" nas redes sociais.

No Brasil, com mais de um milhão de advogados, não há nenhuma restrição para sustentações orais. É comum que se veja advogados defendendo teses já superadas, inclusive em precedentes de natureza vinculante proferidos pelo STJ e STF, enquanto os julgadores lutam para reduzir o enorme estoque de casos pendentes de decisão. A consequência é óbvia: os julgadores passam a prestar cada vez menos atenção às sustentações, e o momento que deveria ser solene e determinante no rumo de um caso judicial, vira apenas a hora de se cumprir tabela.

O momento traz à tona um importante debate: seria hoje necessária a criação de certos filtros para que um advogado sustente oralmente?

Ao redor do mundo, há exemplos. Nos Estados Unidos, além do manual de orientações, há necessidade de uma habilitação específica: o advogado, para se inscrever na Suprema Corte, deve ter sido admitido para exercer a advocacia no mais alto tribunal de um Estado, por um período de pelo menos três anos; não deve ter sido alvo de qualquer ação disciplinar adversa durante esse período; e deve comprovar à Corte ter bom caráter moral e profissional, devendo, ainda, apresentar ao escrivão a declaração de dois "patrocinadores" endossando que possui tais qualificações.

No Reino Unido é necessário que se obtenha um certificado específico de qualificação, enquanto na Alemanha, para atuação em casos cíveis (na Corte equivalente ao STJ), se exige um credenciamento a partir de uma comissão formada por juízes e advogados, sendo necessário ter ao menos 35 anos de idade e cinco anos ininterruptos de advocacia.

Sempre existirá debates sobre qual seria o melhor critério: habilitação especial, obtida por meio de prova, como ocorre, por exemplo, na Holanda? Tempo de atuação no contencioso judicial? Aprovação por um conselho específico? Qual seria a melhor composição de eventual conselho?

Cada critério tem seus prós e contras, que devem ser aprofundados. Para isso, é necessário que se inicie o debate.

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