Opinião

Autorregularização tributária avança no Congresso: o que se pode esperar

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16 de outubro de 2023, 16h18

Não é nada incomum no cenário jurídico-tributário brasileiro a promulgação e a implementação de legislação que institui regimes especiais de refinanciamento de débitos cujo escopo, via de regra, é auxiliar os contribuintes que não estão em dia com as suas obrigações tributárias a regularizarem sua situação perante a Receita Federal, promover um estímulo arrecadatório relativamente a um passivo que, como regra, é de difícil reparação e diminuir a litigiosidade judicial e administrativa.

Fartos são os exemplos da adoção deste tipo de medida pelo governo federal [1]. Neste sentido, citamos o Programa de Recuperação Fiscal (Refis) criado por meio da Medida Provisória nº 1.923/1999 (posteriormente convertido na Lei nº 9.964/2000), o Parcelamento Especial (Paes), instituído pela Lei nº 10.684/2003, o Refis da Crise, criado por meio da Lei nº 11.941/2009, o Programa Especial de Regularização Tributária (Pert), regulamentado pela Lei nº 13.496/2017 e Programa Especial de Regularização Tributária-Saúde (Pert-Saúde), previsto na Lei nº 14.375/2022.

É neste contexto que vem tramitando junto ao Congresso o Projeto de Lei (PL) 4.287/2023, cujo objeto é, justamente, dispor sobre a autorregularização incentivada de tributos administrados pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil (RFB).

No Senado, o PL tramitou diretamente na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), que foi a casa iniciadora da proposta legislativa, dispensada, em princípio a tramitação perante o Plenário da Casa Legislativa, por prerrogativa da previsão do artigo 91, §§3º a 5º do Regimento Interno do Senado.

Em 19 de setembro de 2023 foi concluída a apreciação da proposta, tendo sido proferida decisão favorável na Comissão.

Uma vez concluída a instrução da matéria de forma terminativa pela CAE, foi aberto prazo de cinco dias úteis para interposição de recurso, por um décimo dos membros da Casa, para que a matéria seja apreciada pelo Plenário, o qual se encerou em 27 de setembro de 2023, sem oposição.

Em 28/09/2023 a proposta foi remetida à Câmara de Deputados (Casa Revisora) para apreciação, tendo, na mesma data, sido apresentado em Plenário.

Segundo o texto final do Projeto de Lei Ordinária da CAE, a autorregularização incentivada concerne aos tributos administrados pela Receita Federal que se enquadrem em uma das seguintes hipóteses:

1) tributos administrados pela Receita que ainda não tenham sido constituídos até a data da publicação da legislação, inclusive em relação aos quais já tenha sido iniciado procedimento de fiscalização; e

2) créditos tributários que venham a ser constituídos entre a publicação da lei e o termo final do prazo de adesão.

Não podem ser incluídos no programa de autorregularização incentivada aqueles débitos tributários apurados pelo regime do Simples Nacional (Lei Complementar nº 123/2006).

O PL prevê prazo de adesão de 90 dias contados a partir da publicação de eventual regulamentação da legislação pela Receita.

No que toca aos benefícios previstos no projeto, constam reduções de 100% dos juros de mora, quando houver o pagamento de ao menos 50% do débito à vista e o restante parcelado em até 48 prestações mensais.

No texto também está estipulado o afastamento da incidência de multas de mora e de ofício, além da possibilidade de utilização de créditos provenientes de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa de CSLL ou de precatórios (próprios ou adquiridos de terceiros) para pagamento da entrada de 50% do valor do débito.

Assim como mencionamos anteriormente, no Parecer emitido pela senador relator do PL na CAE no Senado, consta na justificativa da apresentação da proposta que seus objetivos são "incentivar a autorregularização tributária, reduzir o volume de créditos em cobrança e, consequentemente, aumentar a arrecadação tributária" [2], propósito este, registramos, que foi referendado pelo parecer do senador relator.

Esta proposição legislativa, parece-nos, foi em alguma medida estimulada pelo insucesso da "denúncia espontânea incentivada", criada por meio do artigo 3º da Medida Provisória nº 1.160/2023, que não teve a adesão esperada pelo Ministério da Fazenda.

Neste cenário, fica nítido que as condições altamente vantajosas inscritas no PL 4.287/2023 tem por escopo tornar este novo programa um sucesso arrecadatório e de adesão de contribuintes que se enquadrem no regime.

Em tempos de relativa insegurança em relação aos rumos que está tomando a tramitação da reforma tributária junto ao Congresso e considerando que há uma alta probabilidade que a autorregularização incentivada seja aprovada perante o Parlamento, esta será uma ótima oportunidade para que empresas regularizem seus passivos tributários mediante condições virtualmente atraentes, preparando-se, assim, para a “nova era” tributária que está por vir com a aprovação da reforma.

 

 


[1] BOTTEGA, et al. Passivo tributário: uma análise dos programas de recuperação fiscal. Revista Observatorio de la economia latino-americana, Curitiba, v. 21, nº 07, p. 7522-7551, 2023.

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