Opinião

Como os TCs podem contribuir para a celeridade na retomada de obras

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11 de outubro de 2023, 6h32

Uma obra paralisada ou inacabada não é somente um prejuízo financeiro. É um dano para a coletividade, com impacto na economia e desenvolvimento locais. Se o problema estiver ligado à área da educação, pilar essencial para o avanço de uma sociedade, as consequências se agravam, considerando o efeito negativo no que tange à qualidade do ensino, ao acesso à sala de aula e ao bem-estar dos alunos.

No Tocantins, a população de 42 municípios aguarda a conclusão de 98 obras passíveis de retomada. São escolas e creches, algumas paralisadas ou inacabadas há cerca de 12 anos. Os dados estão no painel de acompanhamento do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), que também traz o total de edificações em situação similar em todo o território nacional: 3.641 registros. Para se ter ideia da indispensabilidade do prosseguimento dessas construções, há casos em que uma única obra teria 14 salas de aula para atender crianças de zero a seis anos de idade, faixa etária designada como "primeira infância", considerada a principal do desenvolvimento do ser humano.

No âmbito do programa Pacto Nacional pela Retomada de Obras e Serviços de Engenharia Destinados à Educação Básica, inaugurado pela MP n° 1174/2023, os 33 Tribunais de Contas existentes em todo o País, sob a coordenação do Tribunal de Contas da União (TCU), poderiam contribuir para solucionar os entraves, resgatar os trabalhos e ajudar a disponibilizar as escolas e creches para a comunidade, sobretudo se considerada a recente Portaria Conjunta MEC/MGI/CGU nº82/2023, a qual dispõe sobre as repactuações entre o FNDE e os entes federativos no campo do Pacto Nacional.

A propósito, nesse sentido, o TCE-TO deu início a um projeto denominado Mãos à Obra, com vistas a orientar os agentes públicos sobre como proceder para obter êxito na repactuação. A iniciativa está sendo desenvolvida por meio de parceria com o FNDE, Instituto Federal do Tocantins (Ifto) e a Agência Estadual de Transportes, Obras e Infraestrutura (Ageto). Ao todo, 12 equipes formadas por servidores públicos, engenheiros, arquitetos e alunos do curso de Engenharia Civil percorrerão as localidades que solicitaram o novo pacto para prestar apoio técnico.

Diante do cenário atual e de iniciativas como o Mãos à Obra, percebe-se, por diversos motivos, a premente necessidade da descentralização da fiscalização do TCU para as demais Cortes de Contas Estaduais e Municipais (TCs), que estão próximas da realidade fiscalizada.

Além de proporcionar celeridade ao desafogar o TCU, por meio de uma distribuição mais equilibrada da carga de trabalho, os TCs possuem conhecimento aprofundado a respeito das particularidades e especificidades dos desafios e demandas das esferas de poder e da realidade das finanças públicas dos entes subnacionais.

Os tribunais locais também se acautelariam ao evitar que o poder público continue iniciando novos empreendimentos sem capacidade financeira, e sem antes ultimar os objetos daqueles recursos já comprometidos, em respeito ao artigo 45 da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

Por meio do controle concomitante (preventivo), os tribunais estaduais e municipais poderiam acompanhar em tempo real os diversos atos que integram a execução do objeto, privilegiando o intento de prevenir irregularidades e ilegalidades e, do mesmo modo, propiciar maior cumprimento, pelos jurisdicionados, de práticas contínuas e permanentes de gestão de riscos, instrumentos de alto relevo pelos termos da Nova Lei de Licitações e contratos administrativos (Lei n° 14.133/2021).

Portanto, para que se altere a realidade apresentada, mostra-se imprescindível o pleno exercício do controle prévio realizado pelos Tribunais de Contas regionais, com o acompanhamento pari passu da execução das obras públicas da educação básica. Dessa forma, diante da proximidade geográfica, tais TCs gerariam um diagnóstico mais confiável, conferindo maior segurança jurídica ao processo, em todas as suas etapas, e atraindo resultados vantajosos para a administração.

Desse modo, com o compartilhamento da fiscalização entre o TCU e os demais Tribunais de Contas, já como etapa inicial, os controladores externos teriam condições técnicas e estruturais para três medidas pertinentes: listar as obras paralisadas na área de educação indicadas pelo gestor responsável pela execução, identificar o real motivo da paralisação e, a partir de uma amostra selecionada por critérios de materialidade e relevância, empreender o confronto da quantia solicitada no cronograma para executar a obra em um exercício financeiro versus dotação orçamentária autorizada e empenhada para o mesmo período.

Somente com essas medidas, já haveria a revisão de uma série de informações constantes dos bancos de dados da União. Isso demonstra a importância da experiência e todo o aparato técnico e estrutural dos Tribunais de Contas, que, adaptados às particularidades dos programas e projetos implementados regionalmente, proporcionarão análises detalhadas e precisas dos gastos públicos, garantindo qualidade na fiscalização.

Outrossim, o TCU, por sua expertise e posição como órgão central de controle, poderia desempenhar um papel importante de coordenação e orientação dos Tribunais de Contas na fiscalização das obras paralisadas/inacabadas objeto da MP n° 1174/2023. Esse é o ponto fulcral do presente artigo.

Nessa esteira, a ideia do TCU como órgão unificador do entendimento dos demais Tribunais de Contas do país pode fortalecer a atuação dessas instituições e garantir uma aplicação mais uniforme das normas de controle e fiscalização, desde que seja implementada com respeito à autonomia e às competências de cada unidade controladora.

Até mesmo porque, além de tudo que já fora exposto, isso minimizaria divergências de interpretação, reduziria inconsistências nas práticas administrativas, sem significar qualquer redução da competência constitucional atribuída à Corte de Contas da União, considerando que, como órgão de controle externo nacional, o TCU possui a capacidade necessária para analisar a conformidade das ações governamentais com as normas vigentes, e, decerto influenciaria positivamente os demais órgãos de controle na atuação primária da fiscalização dos atos relacionados à repactuação das obras.

Mas há, ainda, outros motivos para a descentralização da fiscalização. Com ela, haveria o aumento da transparência e do acompanhamento dos gastos públicos, uma vez que os órgãos de controle estão mais próximos dos cidadãos e das organizações locais. Consequentemente, haveria um incentivo ao controle social e ao combate à corrupção.

O TCU, pelo ordenamento jurídico atual, será sempre o principal agente do controle externo em nível nacional, não obstante a revisão de compreensão que se propõe, ao menos no que concerne às ações inerentes à MP n° 1.174/2023.

Simplificando, reunimos abaixo 10 melhorias que podem advir do compartilhamento da fiscalização no âmbito do Pacto Nacional pela Retomada de Obras e Serviços de Engenharia Destinados à Educação Básica:

1. Minimização dos obstáculos que dificultam o controle e a fiscalização;

2. Acompanhamento pari passu do planejamento dos empreendimentos;

3. Realização de auditorias e inspeções nas obras, com corpo técnico igualmente qualificado e conhecedor da realidade local;

4. Contemporaneidade dos atos de fiscalização, pelos processos de acompanhamento da gestão, em controle concomitante;

5. Acompanhamento dos projetos construtivos – projeto básico e executivo, evitando-se vícios futuros a comprometer a obra;

6. Análise concomitante da existência de capacidade orçamentária e financeira;

7. Melhoria na gestão dos recursos públicos recebidos;

8. Controle da observância do artigo 45 da LRF;

9. Aferição da boa e regular aplicação dos recursos públicos;

10. Aperfeiçoamento dos bancos de dados de obras públicas, qualificando a fidedignidade e a integridade de suas informações, dentre outros.

Quando se trata da proteção e eficácia dos direitos fundamentais, é necessário que, obedecendo ao princípio da legalidade, os órgãos de controle possam agir de forma acoplada e uníssona. Por mais que a competência para a fiscalização das verbas federais esteja centralizada no TCU, este pode exercer tal competência através da expedição de orientações nacionais, porém é essencial que haja a ação direta dos Tribunais de Contas locais.

É preciso, portanto, "compartilhar para avançar", pois se trata de tarefa urgente: a melhoria da qualidade na educação e a garantia de um futuro melhor para as crianças, principalmente as de zero a seis anos de idade.

Dessa forma, a estadualização dos recursos envolvidos no contexto da MP nº 1.174/2023 se revelaria altamente eficaz, uma vez que permitiria a supervisão fiscalizatória por parte dos demais tribunais de contas, resultando nas vantagens positivas mencionadas ao longo deste texto. Esse objetivo poderia ser alcançado ao se incorporar à referida MP o seguinte dispositivo:

"Art. __. O regime jurídico das transferências especiais previstas no artigo 166-A, inciso I, da CF/88 aplica-se parcialmente às transferências inerentes a esta Medida Provisória, observando-se as exigências estabelecidas no artigo 116 da Lei n. 8.666/1993 e nas Leis 14.133/2021 e de Responsabilidade Fiscal."

Em resumo, é fundamental realçar que as ações conjuntas e harmônicas dos órgãos de controle externo são imperativas para garantir o futuro da próxima geração.

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