Anuário da Justiça

Com ESG e compliance, empresas tomam posição perante a sociedade

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7 de outubro de 2023, 8h51

*Reportagem publicada na 1ª edição do Anuário da Justiça Direito Empresarial. A versão online é gratuita (clique aqui para ler) e a versão impressa está à venda na Livraria ConJur (clique aqui para comprar).

O que vale mais: retorno a longo prazo ou dinheiro na mão? Distribuição de lucros ou reinvestimento? A “alma do negócio” ou a lucratividade? Nos anos 1920, a família proprietária da Ford se perguntava o que fazer com o dinheiro da empresa que sobrava: poderia ser usado para investimento em outros negócios ou teria de distribuir os dividendos aos acionistas? Investir em outras áreas não seria desvirtuar o objeto social da empresa e trair a expectativa dos acionistas?

Assim como a ideia de família vem ganhando uma nova definição, o conceito de empresa passa também por uma revisão. O conceito tradicional, de empresa com um dono, vem sendo superado pelo compromisso com novos valores do mundo contemporâneo.

Questões sobre governança já eram discutidas um século atrás, mas, de lá pra cá, houve uma (r)evolução. Hoje, além de obter resultados positivos, a empresa precisa demonstrar ao mercado que chegou ao lucro de forma responsável e que investe parte de seu ganho para minimizar impactos de sua atividade no equilíbrio social e na conservação ambiental.

Dessa forma, surgiu o ESG (do inglês Environmental, Social and Governance): os pilares da sustentabilidade Ambiental, Social e Governança Corporativa da empresa. “A empresa que passa a adotar os padrões e práticas ESG demonstra o cuidado e diligência com a sustentabilidade empresarial e os seus reflexos na sociedade”, comenta o advogado trabalhista Ricardo Calcini.

A pauta ESG abarca assuntos diversos como mudanças climáticas; uso de recursos naturais; direitos humanos; saúde e segurança do trabalhador; qualidade de vida.

Muitos empresários, no início, viram o ESG como burocracia e custo. Mas, com o tempo, perceberam que se trata de investimento — e pode dar ainda mais dinheiro. “É um dos fatores determinantes para a empresa conseguir investimentos junto ao mercado financeiro, de igual modo os clientes ponderam se a empresa possui ou não consciência social e ambiental”, observa Calcini.

“A agenda nasceu da preocupação com a mitigação de riscos dos investidores. Portanto, é uma atitude protetora do capital. Criaram essa sigla na perspectiva de dar mais segurança aos investimentos”, conta Caio Magri, diretor-presidente do Instituto Ethos. Ele destaca que, com o passar dos anos, houve uma mudança de perspectiva nas empresas. “Elas perceberam que, para ser, de fato, ESG, precisa responder aos interesses dos investidores e também a outros membros da sociedade”, afirma.

“O ESG é uma questão de fazer escolhas melhores para ter benefícios melhores. Então não há custo nesse aspecto”, afirma Leonardo Barem advogado especializado na área. Para ele, o ESG coloca o ambiente corporativo diante de escândalos como o racismo estrutural, o trabalho escravo, o etarismo, o capacitismo e a corrupção (nesse sentido, dialogando com o compliance). “Evoluímos, mas não resolvemos grande parte dessas questões ainda”, diz.

Por que algumas empresas muitas vezes do mesmo segmento, com mais ou menos o mesmo tamanho e mesma idade, parecidas, enfim, por que algumas valem mais do que as outras? A resposta está na governança corporativa. “A governança foca na empresa em si e não propriamente no dono. Temos que buscar um certo equilíbrio entre esses interesses”, diz Barem.

Especialmente após os casos de corrupção no país, que vieram à tona com a “lava jato”, o compliance ganhou espaço e passou a ser visto como área importante para as empresas no quesito governança e transparência. Na esteira da cobrança das empresas, e como reação às manifestações pelo “fim da corrupção”, o Congresso entregou o marco para melhoria de práticas no ambiente de negócios, a Lei 12.864/2013.

Conhecida como “Lei Anticorrupção”, a norma prevê sanções para empresas envolvidas em atos de corrupção e a possibilidade de atenuantes às penas previstas caso adotem programas de integridade. O compliance funciona como uma gestão de riscos. Ajuda as companhias a evitar fraudes, a regular os processos internos da empresa e a monitorar o comportamento dos fornecedores.

Pesquisa promovida pelo Anuário da Justiça Direito Empresarial (clique aqui para ler) verificou que o impacto da implementação do compliance na governança das empresas é avaliado de forma positiva por 84% dos executivos que responderam ao levantamento, enquanto 14% enxergam pouco ou nenhum impacto. De acordo com os principais gestores de empresas do país, os departamentos de compliance se subordinam atualmente aos presidentes ou às diretorias e menos aos departamentos jurídicos.

Medir a eficiência de um programa de integridade e compliance ainda é um desafio, conforme diz a advogada Ligia Maura Costa, presidente da Comissão de Governança e Integridade da OAB-SP e diretora do centro de estudos FGV Ethics. “Uma forma de fazer isso é pela diminuição do número de ocorrências consideradas sujeitas à não conformidade, nos termos do mapeamento de risco feito pela empresa.”

A especialista considera fundamental estabelecer indicadores-chave de desempenho como: tempo para resolução de reclamações no canal de denúncia; número de comunicações sobre o tema; bônus de performance com componentes de integridade, além do fator performance financeira. Para Lígia Costa, um bom programa de boas práticas não deve ser lançado como custo, mas como investimento, já que com as condicionantes impostas pela lei, “os entes públicos já não conseguem contratar uma empresa sem compliance”.

Mais recentemente as empresas passaram a ser exigidas em mais um quesito de compliance e governança que é a proteção de dados digitais. Desde 2018, vigora a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD, Lei 13.709/2018), que estabelece uma série de requisitos para que haja tratamento adequado dos dados pessoais dos cidadãos. Em 2022, foi promulgada a Emenda Constitucional 115, que inseriu o inciso LXXIX no rol de direitos e garantias fundamentais do artigo 5º da Constituição: “É assegurado, nos termos da lei, o direito à proteção dos dados pessoais, inclusive nos meios digitais.”

Assim como o poder público, empresas também guardam em suas bases de dados informações pessoais, sujeitas a protocolos para garantir a privacidade desde a coleta dos dados até o processamento e o armazenamento. Embora seja majoritária a percepção de alto impacto (59%) da implementação da lei, a pesquisa conduzida por este Anuário da Justiça aponta para número relevante de executivos que avaliam que as novas regras trouxeram pouco ou nenhum impacto na governança (38%).

Mas há benefícios quando se trata da organização e do gerenciamento de dados interna corporis, assim como da regulação e do relacionamento entre a empresa e o consumidor. É o que destaca o Sebrae também quanto à melhoria do marketing, já que as empresas precisam “eliminar informações irrelevantes, como endereços de e-mail inexistentes, (…) e se comunicar apenas com os clientes que querem realmente saber mais sobre a sua marca”.

A aplicação de penas e sanções administrativas, em caso de violação às regras de proteção de dados pessoais, cabe à Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD). As punições variam de advertência a multas, que podem chegar a 2% sobre o faturamento do negócio, limitadas a R$ 50 milhões por infração. Há ainda previsão de multa diária, que, ao final, também não pode passar de R$ 50 milhões.

ANUÁRIO DA JUSTIÇA DIREITO EMPRESARIAL 2023
1ª edição
Número de Páginas: 156
Editora: Consultor Jurídico
Versão impressa: R$ 40, na Livraria ConJur
Versão digital: É gratuita, acesse pelo site https://anuario.conjur.com.br ou pelo app Anuário da Justiça

Anunciaram nesta edição
Advocacia Del Chiaro
Arruda Alvim & Thereza Alvim Advocacia e Consultoria Jurídica
Ayres Britto Consultoria Jurídica e Advocacia
Bottini & Tamasauskas Advogados
Caselli Guimarães Advogados
Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil
Décio Freire Advogados
Dias de Souza Advogados
Heleno Torres Advogados
JBS S.A.
Laspro Consultores
Leite, Tosto e Barros Advogados
Lemos Jorge Advogados Associados
Machado Meyer Advogados
Sergio Bermudes Advogados
Unisa – Universidade Santo Amaro
Warde Advogados

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