Opinião

Possibilidades e implicações do controle externo do TCU sobre a OAB

Autor

  • Fernando Paiva

    é pós-graduado em Direito Processual Civil pela Universidade Estácio de Sá (RJ) ex- conselheiro federal suplente OAB/AL ex-conselheiro federal titular OAB/AL ex-vice-Presidente da Comissão Nacional de Precatórios ex-vice-presidente da Associação dos Advogados Trabalhistas de Alagoas (Aatal) ex-conselheiro Federal Titular OAB/AL ex-vice-presidente da Comissão Nacional de Precatórios e titular do escritório ALNPP Advogados.

29 de março de 2023, 15h18

O Supremo Tribunal Federal (STF), em 7/6/2019, no plenário virtual, por maioria, vencido o ministro Edson Fachin, reconheceu a existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada no Recurso Extraordinário n° 1.182.189, onde será julgado o tema relativo à obrigatoriedade da Ordem dos Advogados do Brasil de prestar contas ao Tribunal de Contas da União (TCU), matéria de grande relevância para a entidade advocatícia.

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A OAB representa os advogados brasileiros e é responsável por regulamentar a profissão e defender as prerrogativas dos profissionais, além de atuar na defesa dos direitos fundamentais e na promoção da justiça.

A discussão diz respeito à independência e autonomia da Ordem, conforme reconhecido no artigo 44, §1º, da Lei nº 8.906/1994, atraindo efeitos não apenas à Seccional recorrida no caso sob a análise, mas a todo o sistema. Ademais, desafia o entendimento firmado pelo Supremo no bojo da ADI 3.026/DF, na qual o Conselho Federal foi parte.

O debate sobre a necessidade de prestação de contas da OAB já foi objeto de debate, quando se consolidou o entendimento de que as prestações de contas do Conselho Federal, órgão máximo da advocacia e que consolida a atuação das seccionais, não se submetia ao TCU, tendo esse entendimento se consolidado por meio do julgamento da ADI 3.026/DF e de julgamentos do próprio tribunal de contas, por meio do Acórdão nº 1765/2003-Plenário.

Trata-se da rediscussão da coisa julgada originada da ADI nº 3.026-4/DF, que decidiu, por conclusão lógica, que a OAB não estaria sujeita a prestação de contas perante o TCU. Essa nova apreciação da questão tem implicações importantes para o exercício e autonomia institucional da entidade, gerando preocupação em toda a classe quanto à independência da representação da advocacia, principalmente em relação aos temas relacionados a sua missão constitucional.

Inobstante o entendimento consolidado e a coisa julgada oriunda da ADI 3.026/DF, o Ministério Público Federal (MPF) no recurso extraordinário que está submetido a julgamento no STF, entende que a OAB é uma entidade que exerce uma função pública e, por isso, deve prestar contas. Por esta razão, o tema volta à tona, envolvendo a seccional da Bahia, afeto ao Supremo, que apreciará a controvérsia sob a égide do Tema 1.054, com a relatoria do ministro André Mendonça, que avaliará a necessidade da OAB, entidade de natureza privada (sui generis), ser obrigada a prestar contas ao Estado, pelo TCU.

É de conhecimento que, para que haja fiscalização por parte do TCU, é necessário que o ente fiscalizado integre a administração pública direta ou indireta, ou que receba recursos públicos federais e, assim, qualquer discussão que envolva a prestação de contas ao tribunal deverá atender o balizamento definido na Constituição, ou seja, limita-se a saber se a OAB se enquadra ou não nos ditames do artigo 70 da Carta.

O artigo 70, parágrafo único, da Constituição, dispõe que "prestará contas qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza pecuniária". Ou seja, a redação proposta no artigo não dá margem para subjetividades, isto é, o sistema de fiscalização das contas públicas atuará onde houver recursos públicos.

Embora a OAB não receba recursos públicos, o que por si só a diferencia daquelas entidades diretamente submetidas a prestação de contas ao TCU, a Ordem tem gestão própria e pública das suas prestações de contas, que são julgadas ano a ano, submetidas às seccionais e ao Conselho Federal, em sessões específicas de apreciação de contas da administração. Por esse motivo, no que diz respeito a OAB, nenhum desses pressupostos estão presentes, se entendendo que sua submissão a fiscalização de suas contas através do TCU pode ser considerada ilegal e, principalmente, inconstitucional, uma vez que constatada a indevida ingerência do Estado em entidade da sociedade civil sem que a Constituição assim discipline.

Independentemente da submissão do tema de Repercussão Geral nº 1.054, que terá apreciação pelo STF, a OAB já adota medidas que garantem a transparência e a eficiência na gestão dos seus recursos, como a prestação de contas da aplicação dos recursos provenientes de contribuições — anuidade — de seus inscritos, prevista na Lei nº 8.906/94, e no Regulamento Geral do Eaoab, para as Seccionais.

Às seccionais cabe a apreciação do relatório anual e deliberação sobre o balanço e as contas de sua diretoria (artigo 58, IV, Lei no 8.906/94), cabendo ao Conselho Federal apreciar o relatório anual e deliberar sobre o balanço e as contas de sua diretoria, bem como homologar o balanço e as contas dos conselhos seccionais (artigo 54, XI e XII, Lei no 8.906/94).

O julgamento do RE n° 1182189 pelo STF, que foi interposto pelo Ministério Público Federal, a partir da alínea "a" do inciso III do artigo 102 da CF, contra acórdão proferido pela 7ª Turma do TRF-1, que, aludindo ao julgamento da ADI n° 3.026, afastou a obrigação de a OAB-BA prestar contas perante o TCU, este é aguardado com expectativa, pois poderá ter importantes repercussões na relação entre a Ordem e os órgãos de controle externo.

A Constituição não destinou à OAB prescrições relacionadas à prestação de contas sob o regime público, mas, sim, aos órgãos e entidades vinculadas ou integrantes da administração pública, conforme disciplina seu artigo 70. Dessa forma, aplicando todo o entendimento já esposado pelo STF no julgamento da ADI-3.026-DF, em respeito à coisa julgada e a própria Constituição, se espera que o julgamento do Tema 1.054 mantenha irretocável a independência da Ordem dos Advogados do Brasil.

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  • é pós-graduado em Direito Processual Civil pela Universidade Estácio de Sá (RJ), ex- conselheiro federal suplente OAB/AL, ex-conselheiro federal titular OAB/AL, ex-vice-Presidente da Comissão Nacional de Precatórios, ex-vice-presidente da Associação dos Advogados Trabalhistas de Alagoas (Aatal), ex-conselheiro Federal Titular OAB/AL, ex-vice-presidente da Comissão Nacional de Precatórios e titular do escritório ALNPP Advogados.

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