Opinião

Carf derruba débito de CSLL de dedução integral da amortização de ágio

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14 de maio de 2023, 7h10

As disposições legais vigentes anteriormente à Lei nº 12.973/14, que disciplinavam a dedutibilidade do ágio derivado da aquisição de participações societárias, eram silentes no tocante ao momento em que tal dedução era permita para efeito de determinação da base de cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Isto é, se logo após a aquisição da participação societária ou somente após o evento de incorporação, como expressamente aplicável em relação ao Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ).

Na primeira hipótese, defendida por muitos contribuintes, a dedução era alcançada com base na amortização contábil do valor do ágio, o que era possível anteriormente à aderência do Brasil ao padrão do IFRS e durante o período de vigência do Regime Tributário de Transição (RTT).

Contudo, a Fazenda Pública se manteve contrária à essa prática, adotando uma interpretação mais restrititiva no sentido de somente admitir a dedução do ágio na da base da CSLL sob as mesmas condições permitidas para efeito do lucro real, qual seja, após o evento de incorporação, o que redundou em diversas autuações fiscais que levaram a discussão ao Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf).

Em recente  decisão da Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF), que não conheceu do Recurso Especial de divergência interposto pela Fazenda Nacional nos autos do processo administrativo fiscal nº 16682.720889/2011-14, tornou-se definitivo o acórdão do Carf que determinou o cancelamento de lançamento fiscal que exigia diferenças de CSLL dos períodos de 2007 e 2008, em razão da suposta indedutibilidade da despesa de amortização de ágio da base de cálculo da referida contribuição.

O débito cancelado teve origem no entendimento da Fazenda federal no sentido de que a despesa com a amortização do ágio teria natureza de "provisão", cabendo sua adição à base de cálculo da CSLL, a despeito da ausência de previsão legal para tanto à época dos fatos geradores (2007 e 2008). A amortização tratada nos autos havia sido reconhecida em período anterior à adoção do IFRS.

Tal racional se fundou tanto na aplicação da regra prevista no artigo 13, I, da Lei nº 9.249/95, o qual veda a dedução de qualquer provisão nas bases do IRPJ e da CSLL, como também no disposto no art. 57, da Lei nº 8.981/95, tomado como fundamento para extender as restrições impostas às deduções da base de cálculo do IRPJ (lucro real), dispostas no Regulamento do Imposto de Renda e no Decreto-Lei nº 1.598/77, também à base de cálculo da CSLL (lucro líquido), por analogia.

Quanto ao argumento de que a despesa de amortização do ágio teria natureza de provisão, este foi afastado em 1ª instância pelo contribuinte, ao demonstrar que o que caracteriza uma provisão é a incerteza em relação à ocorrência de um evento, não sendo aplicável em relação às amortizações do ágio.

Isso porque, nos moldes da Instrução CVM n° 247, de 1996 (e suas alterações posteriores), vigente no período tratado nos autos, a amortização do ágio, então cabível, constituía despesa efetivamente incorrida, o que é determinado pela fluência temporal.  Significa dizer que, se o período esperado para a realização de resultados fosse de dez anos, por exemplo, a cada ano haveria a realização de 10% do ágio, via amortização, sendo os seus efeitos patrimoniais definitivos, seja quantitativa ou qualitativamente, afastando a natureza de provisão imputada de forma equivocada pela Fazenda federal.

Já quanto ao segundo argumento utilizado pela fiscalização, qual seja, de que tais despesas não seriam dedutíveis, em razão da suposta aplicação extensiva à CSLL, do disposto nos arts. 391 do RIR/99 e 25 do Decreto-Lei nº 1.598/77, o mesmo foi afastado em 2ª instância administrativa, na medida em que restou demonstrado pelo contribuinte que, diversamente do Imposto de Renda, inexistia restrição legal à dedutibilidade das amortizações do ágio anteriormente ao evento da incorporação, situação modificada somente após a vigência da Medida Provisória nº 627/2013, convertida na Lei nº 12.973/2014.

Apenas a partir da vigência das regras atuais, a dedutibilidade do ágio passou a ter disciplina jurídica única para ambas as exações fiscais, IRPJ e CSLL (artigos 2º e 50 da referida lei), sendo certo que, à época dos fatos geradores considerados pela fiscalização no caso específico analisado pelo Carf (2007 e 2008), não havia previsão para tanto.

Isso porque, em que pese o art. 57, da Lei nº 8.981/1995 determine que as normas de apuração e de pagamento estabelecidas para o IRPJ serão aplicáveis à CSLL, ressalva expressamente que, em relação à base de cálculo e à alíquota, deve ser observada a legislação específica da CSLL.

E justamente em respeito à legalidade e com base na ressalva imposta pelo artigo 57, da Lei nº 8.981/1995, o Carf cancelou o crédito tributário constituído e discutido nos autos do processo nº 16682.720889/2011-14, entendendo que "Para a amortização contábil dos ágios (qualquer que seja o seu fundamento), o legislador não fez uma previsão expressa determinando a sua adição à base de cálculo da CSLL (apesar de tê-la feito com relação ao lucro real)".

Assim, através da decisão da Câmara Superior de Recursos Fiscais, que deixou de admitir o Recurso Especial fazendário, o entendimento do Carf, no caso específico, se tornou definitivo, fazendo justiça fiscal em mais um caso de clara violação aos conceitos contábeis e princípios que regem o sistema tributário pátrio, e dando aos contribuintes a esperança de julgamentos mais técnicos e acertados.

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