Abuso sexual vs estupro

Em recurso, defesa vai alegar que Trump foi condenado por acusação errada

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11 de maio de 2023, 8h20

O julgamento do ex-presidente Donald Trump, em um tribunal federal de Nova York, terminou na terça-feira (9/5), com um veredicto que a defesa considerou estranho. Trump foi acusado de estupro, mas foi responsabilizado civilmente por outro delito, o de abuso sexual — bem como por difamar a jornalista E. Jean Carroll, que o acusou de estupro.

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Defesa vai alegar que Trump foi condenado por abuso, e acusação foi de estuproReprodução

O Júri deliberou que Trump deve indenizar Jean Carroll em US$ 5 milhões: US$ 2 milhões em indenização compensatória e US$ 20 mil por indenização punitiva por abuso sexual; US$ 2,7 milhões em indenização compensatória; e US$ 280 mil em indenização punitiva por difamação.

O advogado de Trump, Joseph Tacopina, se apegou ao que ele considera uma discrepância — o fato de seu cliente ter sido condenado por abuso sexual, quando a acusação foi de estupro.

Não haverá controvérsia caso o tribunal considere corretas as instruções que o juiz Lewis Kaplan deu aos jurados, antes de eles se retirarem para deliberações. Primeiramente, ele explicou que havia dois elementos a serem examinados: 1) se Trump sujeitou a demandante a contato sexual sem consentimento, pelo uso de força; 2) se Trump o fez com o propósito de gratificação sexual.

Em seguida explicou que há três tipos de crimes contra a liberdade sexual que devem ser examinados, de acordo com a lei de Nova York: estupro, abuso sexual e toques forçados (forcible touching).

Para concluir que o caso foi de estupro, os jurados devem acreditar que Trump se engajou em intercurso sexual com uso de força física (ou violência). O juízo esclareceu que qualquer penetração genital constitui essa relação.

No caso de abuso sexual, não há intercurso. Ou seja, os jurados devem acreditar que Trump sujeitou Jean Carroll a contatos sexuais com uso de força física. O termo "contato sexual" é definido como tocar as partes sexuais ou íntimas de outra pessoa, disse Kaplan.

Toques forçados, por sua vez, "incluem apertar, agarrar, beliscar, esfregar ou ter outros contatos corporais que envolvem a aplicação de algum nível de pressão às partes sexuais ou íntimas da vítima".

Todas são definições que existem na legislação do estado de Nova York. Os jurados (seis homens e três mulheres) optaram por excluir a acusação de estupro, porque os testemunhos não foram suficientes para convencê-los de que esse foi o caso.

E como o caso é civil, não há condenação criminal contra Trump. As sanções aplicadas a ele são apenas financeiras. Mas, de qualquer forma, se a condenação por abuso prevalecer em grau de recurso, ele será registrado como predador sexual.

Estratégia da acusação
Em seu testemunho, a autora da ação disse que Trump a abordou na loja de departamentos Bergdorf Goodman, em Manhattan, em 1995 ou 1996. Ele teria pedido a ela que o ajudasse a escolher um presente, uma lingerie, para outra mulher, e a levou para a cabine de provas, onde a teria violentado. 

Como os fatos ocorreram há mais ou menos 27 anos, a acusação de estupro já estava prescrita. A estratégia foi, então, acusar Trump por difamação, por chamá-la, entre outras coisas, de mentirosa. Ela moveu a ação em 2019.

Entretanto, em 2022, a governadora de Nova York, Kathy Hochul, sancionou uma lei, a New York’s Adult Survivors Act, que deu um prazo extra de um ano para vítimas adultas de crimes sexuais processarem seus agressores, independentemente do quão antigo fosse o caso.

Os advogados de Jean Carroll aproveitaram a abertura e moveram uma ação civil contra Trump por estupro.

Acusação de difamação incontestada
Em nenhum momento, depois da condenação, Trump ou seus advogados contestaram a acusação de difamação. As provas foram suficientes. Por exemplo, em 2022, Trump escreveu na Truth Social, sua plataforma de mídia social, que as acusações da colunista contra ele eram uma "armação total, uma farsa e uma mentira".

Trump declarou, algumas vezes, que nunca havia se encontrado com tal mulher e que ele não poderia tê-la estuprada por um motivo: "Ela não é o meu tipo."

Porém, essas afirmações desmoronaram quando, em depoimento, em 2022, promotores lhe mostraram uma foto em preto e branco de um evento, em que ele, Jean Carroll e outras pessoas aparecem. Trump a confundiu com uma de suas ex-mulheres: "É Marla", ele disse, em referência a sua segunda mulher, Marla Maples.

Em seu testemunho, Jean Carroll disse aos jurados que o abuso sexual a deixou incapaz de ter qualquer relacionamento romântico. "Ele estilhaçou minha reputação, ao negar os fatos. Perdi o emprego e as pessoas não me olharam mais do mesmo jeito. Pessoas mais próximas passaram a olhar para mim com pena. Os seguidores de Trump me odeiam", disse.

O caso também arrolou duas testemunhas que contaram aos jurados que Carroll lhes havia confidenciado o caso de estupro logo depois de o crime acontecer — o que fortaleceu a acusação.

A jornalista, no entanto, não conseguiu se lembrar, com precisão, quando os fatos ocorreram (disse que foi entre 1995 e 1996) e os advogados não dispunham de uma data para checar se Trump tinha um possível álibi para sua defesa.

Também pesou contra Trump uma gravação, divulgada antes da eleição presidencial de 2016, sob protestos da defesa, em que ele se gabou de, por ser rico e famoso, agarrar as mulheres por suas partes íntimas.

Com informações do New York Times, The Guardian, The Hill, CNN, MSNBC e Reuters

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