Opinião

Educação: direito fundamental e responsabilidade compartilhada

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30 de junho de 2023, 13h18

O acesso à educação, direito de todo brasileiro à luz do artigo 205 da Constituição, notoriamente encontra óbices diversos para se ver implementado. O Estado, muitas vezes, por um plexo de diferentes motivos, simplesmente não consegue propiciar um ensino de qualidade, moderno e que faça frente às necessidades da sociedade. 

É evidente que todos, brasileiros conscientes e que desejam um país desenvolvido e mais justo, anseiam que essa diretriz fundamental da constituição do indivíduo seja atendida. Mas, para além do anseio, o dado, concreto e incontestável, é que essa omissão abriu espaço para um amplo espaço para desenvolvimento da iniciativa privada.

Edilson Rodrigues/Agência Senado
Edilson Rodrigues/Agência Senado

Com efeito, a formação no ensino privado passou a ser realidade para mais de 10 milhões de alunos somente etapa fundamental, com expansão de cerca de 10% em relação a 2021, segundo dados de 2022, divulgados em fevereiro último pelo Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), órgão vinculado ao Ministério da Educação. 

Essa especial realidade do país parece, de outro lado, ter alçado a iniciativa privada para um lugar excepcional. Para o que importa para o presente artigo, tal constante expansão da rede privada trouxe consigo um grave efeito colateral: a inadimplência, que, aliás, por vezes, supera a marca de 10% dos recebíveis, segundo mostram, por exemplo, dados do Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino do Estado de São Paulo. 

Naturalmente, a debilidade de receitas pode comprometer a devida formação dos profissionais de ensino, a aquisição de materiais, a condição de infraestrutura, e uma infinidade de outros componentes do serviço educacional.Tudo isso ocorre enquanto os prestadores se espremem entre o aumento de custos, até por impacto inflacionário, e dificuldades, sejam de natureza mercadológicas, de aplicaram reajustes. 

Neste contexto é que foi bem festejada a decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça), objeto desta breve análise,que reconheceu a solidariedade material dos genitores pelas despesas relacionadas à educação dos filhos. O entendimento excepciona o princípio da relatividade, autorizando, basicamente, que o(a) genitor(a) que não contratou seja responsabilizado pelas dívidas educacionais. 

Na oportunidade, em interessante precedente, o STJ reconheceu que "[o]s pais, detentores do poder familiar, tem o dever de garantir o sustento e a educação dos filhos, compreendendo, aí, a manutenção do infante em ensino regular, pelo que deverão, solidariamente, responder pelas mensalidades da escola em que matriculado o filho".

O entendimento se fundamenta na aplicação dos artigos 265, 1.566, IV, 1.643, 1644 do CC/2002 e 21, 22 e 55 do Estatuto da Criança e do Adolescente (“ECA”). O racional é compreensível: se a lei atribui solidariedade material aos pais, pouco importa que somente um tenha formalizado a relação juridica-obrigacional.

Embora, mais recentemente, a 4ª Turma do STJ tenha passado a se orientar no sentido de que reconhecimento dessa responsabilidade prescinde de litisconsórcio passivo necessário em ação de conhecimento própria (de forma que não seria possível a inclusão do(a) genitor(a) no curso de uma demanda executiva, por exemplo) é certo que foi mantido o reconhecimento dessa solidariedade material. 

Se o universo de 10 milhões de estudantes é tão relevante, também é a questão da responsabilidade de genitores. E, pelo relevo social que a atividade possui, é mesmo necessário que o tema ganhe observação detida e cuidadosa pelos operadores do Direito, com, inclusive, a devida insistência para que se veja corretamente aplicado — mais do que isso, pacificado — no Judiciário. 

A manutenção do entendimento quanto à solidariedade de genitores parece mesmo fundamental, não só porque reforça o combate à inadimplência, mas também porque instiga um outro e necessário debate sobre a responsabilidade conjunta de genitores em outros aspectos da criação e desenvolvimento das crianças.

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