Opinião

Escritórios que habitualmente suscitam IRDRS? Em princípio não existem

Autores

  • Igor Moraes Rocha

    é mestrando em Direito Processual Civil pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (FDSP-USP) graduado em Direito pela UFMG e advogado.

  • Larissa Holanda Andrade Rodrigues

    é mestranda em Processo Civil pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) pós-graduanda em Direito Empresarial (L.L.MIBMEC) pesquisadora do grupo de pesquisa e extensão "Observatório do Judiciário" membro do grupo de pesquisa PROC: Processualismo Constitucional Democrático e Reformas Processuais e do Observatório de Pesquisa Processualistas projeto vinculado ao Grupo de Pesquisa em Processo Civil Contemporâneo (UFC) e advogada.

  • Otávio Vilela

    é mestrando em Processo Civil pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) pós-graduando em Agronegócios pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (USP/Esalq) pesquisador do grupo de pesquisa e extensão "Observatório do Judiciário" e advogado.

18 de junho de 2023, 9h25

Dos institutos mais polêmicos do CPC/15, o incidente de resolução de demandas repetitivas (IRDR) ainda é capaz de chamar a atenção da academia jurídica e de trazer algumas surpresas ao senso (jurídico) comum.

Com o intuito de desbravar os aspectos ainda não explorados do incidente, propomo-nos a desenvolver uma pesquisa, partindo da tipologia ideal de "repeat players" e "one shooters" desenvolvida por Marc Galanter [1], para entender: afinal, existem escritórios de advocacia ou advogadas(os) que estão se especializando na suscitação de IRDRs?

Posto de outra forma, existiria uma prevalência numérica de Incidentes suscitados por um número limitado de escritórios de advocacia ou de advogadas(os), que monopolizariam a sua utilização em benefício de categorias específicas de litigantes, em especial, pessoas jurídicas "jogadores habituais"?

Para responder a essas perguntas, desenvolvemos a referida pesquisa por meio do Observatório do Judiciário [2], grupo de pesquisa e extensão da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), analisando todos os IRDRs suscitados no TJ-MG (Tribunal de Justiça de Minas Gerais) e no TJ-SP (de São Paulo) até 24/1/2021 e 30/1/2021, respectivamente. O total à época foi de 669 incidentes que tiveram suas petições de suscitação analisadas.

Destaca-se que, na realidade, havia 764 incidentes cadastrados nesses tribunais, mas aproximadamente 12,55% foram descartados ou por não tratarem de IRDRs (ex.: cadastro de recurso por engano da parte) ou por tratarem de incidentes suscitados em segredo de justiça ou autos físicos (objeto de exposição em trabalho separado [3], também publicado no Conjur [4]).

No TJ-MG, os patrocinadores que mais suscitaram foram: 1) escritórios de advocacia (47 IRDRs); 2) advogadas(os) individuais (32 IRDRs); 3) procuradoria da administração pública direta ou indireta (14 IRDRs).

Em Minas Gerais, o maior suscitante foi um escritório, com sete IRDRs suscitados, seguido de um advogado com cinco IRDRs.  Em seguida, dois escritórios e duas procuradorias, cada um com quatro IRDRs. Por fim mais uma procuradoria e um advogado com três IRDRs. Os demais suscitaram apenas um cada.

Já no TJ-SP, os patrocinadores que mais suscitaram foram: 1) escritórios de advocacia (223 IRDRs); 2) advogadas(os) individuais (188 IRDRs); 3) procuradoria da administração pública direta ou indireta (44 IRDRs); 4) jurídico interno de empresa (dois IRDRs).

Em São Paulo, o maior suscitante foi um escritório, com 14 IRDRs suscitados, seguido de outro escritório e um advogado com 6 IRDRs cada um. Em seguida, uma procuradoria, dois escritórios e um advogado, cada um com cinco IRDRs. Por fim, cinco patrocinadores suscitaram quatro IRDRs (uma procuradoria, três escritórios e um advogado).

Ambos os tribunais têm padrões semelhantes no que se refere ao perfil dos patrocinadores: nos dois, os escritórios de advocacia foram os que mais suscitaram incidentes, seguidos, em ordem, pelos advogados individuais, procuradorias e, no caso de São Paulo, jurídicos internos.

Apesar disso, em números absolutos, os patrocinadores que atuam no TJ-SP suscitam mais IRDRs do que aqueles que atuam no TJ-MG de modo que, na lista dos dez maiores patrocinadores, sete deles atuam no primeiro, enquanto apenas dois atuam no segundo. No décimo lugar há um empate técnico entre os dois.

Apresentados esses dados, retornando a pergunta inicial, qual seja, se existem escritórios de advocacia ou advogadas(os) que estão se especializando na suscitação de IRDRs, a resposta provisória é de que não, não há especialização.

No TJ-MG, em um universo de 171 incidentes suscitados, o escritório que mais suscitou IRDRs o fez sete vezes (4% dos incidentes). E mesmo que se considerasse esse número, é baixa a quantidade de patrocinadores que suscitaram mais de um incidente (apenas 12% deles). A grande maioria dos patrocinadores (num total de 88%) suscitaram apenas um incidente.

No TJ-SP, dos 498 incidentes suscitados, o escritório com mais IRDRs suscitou 14 (2,8% dos incidentes). Como no TJ-MG, todos os patrocinadores que suscitaram mais de um IRDR cada compõem apenas o percentual de 20%, a despeito dos 80% de patrocinadores que suscitaram somente um incidente:

Por fim, a pesquisa revela ainda que há uma verdadeira pulverização no momento de suscitação dos incidentes, mas não descarta a possibilidade de que, após suscitados ou admitidos, outros patrocinadores assumam a condução dos incidentes.

 


[1] GALANTER, Marc. Por que "quem tem" sai na frente: especulações sobre os limites da transformação no direito. Organização e tradução: Ana Carolina Chasin. São Paulo: FGV Direito SP, 2018. Disponível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace;/handle/10438/25816>.

[2] MAIA, R. C. V.; NEVES, O. V. M.; RODRIGUES, L. H. A.; ROCHA, I. M. Uma análise empírica dos patrocinadores dos suscitantes de IRDR's no TJMG e TJSP: existem patrocinadores que habitualmente suscitam incidentes?. In: YARSHELL, Flávio Luiz Yarshell; COSTA, Susana Henriques da; FRANCO, Marcelo Veiga. (Org.). Acesso à Justiça, Direito e Sociedade: estudos em homenagem ao Professor Marc Galanter. 1 ed. São Paulo: Quartier Latin, 2022, p. 721-748.

[3] ROCHA, Igor Moraes; HOLANDA, Larissa; VILELA, Otávio. IRDRs inacessíveis: ensaio sobre autos em segredo de justiça e autos físicos no TJSP e TJMG. In: GONÇALVES, Gláucio Maciel; MAIA, Renata C. Vieira; ROCHA, Igor Moraes; TEODORO, Giovani Pontes (Org.). Estudos empíricos em processo e organização judiciária. Belo Horizonte: Editora Expert, 2022, p. 514-542. Disponível em: <https://experteditora.com.br/estudos-empiricos-em-processo-e-organizacao-judiciaria/>.

[4] ROCHA, Igor Moraes; HOLANDA, Larissa; VILELA, Otávio. O curioso caso dos IRDRs em segredo de justiça. Revista Eletrônica Consultor Jurídico (ConJur), 30 abr. 2022. Disponível aqui.

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