Opinião

STJ e a taxa de juros para empréstimos no julgamento do REsp 2.015.514/PR

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14 de julho de 2023, 6h08

No momento atual, no qual uma das principais pautas no país é a crise de crédito que atinge o Brasil, arrefecida por uma conjunção de fatores que resultou na "tempestade perfeita" que afeta grandes grupos, médias e pequenas empresas, e especialmente a pessoa física, não poderia ter sido mais oportuna e esclarecedora a recente decisão da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça em relação ao Recurso Especial 2.015.514/PR, que trata do tema das taxas remuneratórias para empréstimos concedidos à pessoa física, a qual abordaremos com o detalhamento adequado ao longo deste texto.

O Brasil registrou 71,90 milhões de pessoas inadimplentes em maio, segundo dados do Serasa Experian. E a inadimplência dos cartões de crédito rotativos e parcelados permaneceu em patamares recordes nos últimos meses, atingiu em março e abril deste ano quase um terço do saldo de crédito de 135,6 bilhões de inadimplentes, sendo esse o maior nível mensal da série histórica que vem desde março de 2011.

No ano, bancos e instituições já puseram pelo menos R$ 22 bilhões em contratos inadimplentes à venda. Chama a atenção o fato de a maior parte dessas inadimplências estarem sendo devolvida aos bancos de origem por existir poucas chances de reaver os valores devidos.

Em meio a esse contexto, mostra-se pertinente o recente julgado do REsp. 2.015.514/PR pela 3ª Turma do STJ, que entendeu que, em contratos de mútuo bancário, o fato de a taxa de juros remuneratórios ser superior a determinado patamar prefixado -uma vez e meia, o dobro ou o triplo da taxa média do mercado-, por si só, não configura abusividade.

 O Sistema Financeiro Nacional prestigia a liberdade de pactuação, assim, instituições financeiras não estariam sujeitas à Lei da Usura (Decreto 22.626/33), e a simples estipulação da taxa de juros acima de 12% ao ano não indicaria um comportamento abusivo. No entendimento do STJ, a mera análise das taxas de juros não é o suficiente para indicar que houve abusividade ou não da parte da instituição financeira sobre o cliente.

 No caso do Recurso Especial 2.015.514/PR, como não havia ocorrido pelas instâncias inferiores a análise das peculiaridades do caso concreto, o julgamento do tribunal estadual foi anulado e o processo devolvido pelo STJ à instância inferior para que desta vez sejam levados em consideração em sua análise, entre outros fatores, a situação da economia à época da contratação do empréstimo, o custo da captação dos recursos, o risco envolvido na operação, o relacionamento mantido pelo cliente com a instituição financeira e as garantias apresentadas, para só depois reconhecer ou não se a taxa contratual foi abusiva. Ou seja, para o STJ, cada caso tem que ser analisado dentro de suas especificidades.

Numa linguagem popular, uma coisa é emprestar dinheiro para um cliente conhecido da instituição financeira há anos, empregado, que oferece garantias como carro ou imóvel, que tem o nome limpo, e outra para uma pessoa que não reúna essas características, o que pede prêmio pelo risco. Retornando ao tribunal de origem, a Turma julgadora terá que observar os critérios definidos na decisão do STJ a respeito do REsp 2.015.514/PR e com base nas provas elencadas no processo, proferir uma nova decisão, observando os parâmetros definidos na decisão superior.

O julgado do REsp 2.015.514/PR reforça duas outras decisões que vão no mesmo sentido, a do REsp 1.061.530/RS, de 2008 que visa pacificar a jurisprudência, e a do REsp 1.821.182/RS, com ligeiras diferenças. O REsp 1.601.530/RS, submetido ao rito dos recursos especiais repetitivos, fixara o entendimento de que "é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada) fique cabalmente demonstrada ante as peculiaridades do julgamento em concreto".

 Já o REsp 1.821.182/RS foi produto de uma ação coletiva contra uma instituição financeira, onde o Ministério Público do Rio Grande do Sul pretendia que as taxas de juros em todos os contratos  com seus clientes fossem limitadas. O pedido foi afastado com a decisão do STJ que, com base no julgado do REsp 1.061.530/RS, de 2008, entendeu que a taxa média de mercado apurada pelo Banco Central para cada segmento de crédito é referencial útil para controle da abusividade, mas o simples fato de a taxa efetiva cobrada no contrato estar acima da taxa média de mercado não significa, por si só, abuso. A média de mercado não pode ser considerada limite, justamente por se tratar de média; incorpora as menores e maiores taxas praticadas pelo mercado, em operações de diferentes níveis de risco.

A tabela com a taxa média do Banco Central é, como indica o nome, apenas uma tabela que indica o nome da instituição e a taxa de juros que ela aplica normalmente em empréstimos para pessoas físicas. Cada banco tem seu próprio perfil de consumidor, no caso concreto as taxas de juros remuneratórios são mais elevadas ao considerar o risco.

 A decisão do STJ afastou o entendimento de que o judiciário poderia criar, mesmo que informalmente, um teto. O que prevalece é que não há um teto de juros remuneratórios, mas sim a análise das peculiaridades (risco) do caso concreto para definição para que a taxa seja de "X" ou "Y".

Assim, na linha do entendimento recente do STJ (AgInt no REsp nº 1.949.441/SP, relator ministro Luís Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 23/8/2022) a verificação da abusividade dos juros não é taxativa, não observa critérios genérico e universais, de modo que o fato de a taxa de juros remuneratórios contratada ser o dobro ou triplo ou outro múltiplo da taxa apurada pelo Banco Central não determina o reconhecimento de abusividade.

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