Até que a morte os separe

Pedido de falência não protege mulher com dívida criada por fraude de marido

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27 de fevereiro de 2023, 13h45

A Suprema Corte dos EUA decidiu, por unanimidade, que uma mulher não pode usar a proteção prevista no Código de Falências para evitar o pagamento de uma dívida de US$ 200 mil resultante de fraude cometida pelo marido — mesmo que ela não tenha conhecimento dos fatos.

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Suprema Corte dos EUA decidiu que pedido de falência não protege mulher com dívida criada por fraude de marido

Na decisão, escrita pela ministra Amy Barrett, a corte afirma que Kate Bartenwerfer é responsável pela dívida, mesmo que ela não soubesse das declarações falsas de seu marido, David Bartenwerfer, sobre as condições da casa, em São Francisco, Califórnia, quando o casal a vendeu ao empreendedor imobiliário Kieran Buckley por mais de US$ 2 milhões.

O casal comprou a casa para reformá-la e revendê-la. Porém, ao fazer a declaração sobre as condições da casa para concretizar a venda, o marido apontou alguns pequenos defeitos, mas omitiu os mais graves, como telhado com vazamentos, janelas emperradas, falta de saída de incêndio e problemas de licenças.

Buckley processou o casal, e um júri lhe concedeu a indenização de US$ 200 mil. Sem poder pagar a indenização e com outros credores, o casal entrou com um pedido de falência, com base no Capítulo 7 do Código de Falências, que, normalmente, permite às pessoas escapar de todas as suas dívidas.

A ação movida pelo comprador tramitou por diversos tribunais por 18 anos, até chegar à Suprema Corte. A pergunta relevante aos ministros da corte foi se uma dívida resultante de fraude praticada por um cônjuge ou sócio pode ser imputada ao parceiro inocente do fraudador, no contexto de um processo da falência.

Parceria legítima
A corte decidiu que a mulher também é responsável pela dívida, devido ao fato de que houve uma parceria legítima entre os cônjuges na compra e venda da casa. Foi uma decisão que resolveu diferenças entre cortes inferiores.

Em seu voto de relatora da ação, a ministra Amy Berrett citou — e reforçou — uma decisão de 1885 da Suprema Corte, segundo a qual dois sócios de uma empresa de lã, em Nova York, eram responsáveis por uma dívida resultante de uma fraude cometida por um terceiro sócio, embora os dois primeiros não pudessem ser considerados culpados de qualquer ato ilícito.

Em sua petição, o casal sugeriu que cada um deveria ser responsabilizado individualmente, em uma tentativa de deixar a mulher fora do imbróglio. Alegou que a seção relevante do código de falências, escrito na voz passiva, quando se refere a “dinheiro obtido através de fraude”, se refere, na verdade, a “dinheiro obtido através fraude individual do devedor”.

Mas, em seu voto, a ministra descartou esse argumento: “Pessoas inocentes são responsabilizadas, algumas vezes, por fraude que não cometeram pessoalmente e, se elas declaram falência, o código de falências proíbe a quitação desse débito. Esse é o caso de Kate Bartenwerfer e nós somos sensíveis às dificuldades que ela enfrenta”, escreveu a ministra.

A ministra acrescentou: “Nem todas as dívidas são quitadas [em processo de falência]. O Código faz várias exceções. Uma delas é a deste caso: A Seção 523(a)(2)(A) proíbe a quitação de qualquer dívida, oriunda de dinheiro obtido por pretextos falsos, declarações falsas ou fraude real”.

A ministra Sonia Sotomayor escreveu em voto separado, também assinado pela ministra Ketanji Brown Jackson, que a decisão envolve pessoas que agiram juntas, em parceria. “Não se trata de uma situação envolvendo fraude, praticada por uma pessoa que não tem relação de negócios ou de parceria com o devedor”.

A dívida inicial do casal de US$ 200 mil já chegou a US$ 1,1 milhão, com a aplicação de juros, disse à CNBC e ao site Commercial Litigation Update a advogada Janet Breyer, que representa o comprador.

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