Opinião

28 anos da Lei dos Juizados Especiais: ainda vale a pena?

Autor

  • Saulo Gomes da Silva

    é advogado da seccional de Pernambuco atuante em Direito Constitucional e Administrativo e pós-graduado em Direito Público pela Escola Paulista de Direito (EPD).

21 de fevereiro de 2023, 17h06

Tempos de guerra ou de grandes calamidades possuem dois lados: o negativo, ou seja: mortes, destruições. Mas há o "positivo". E qual seria? O desenvolvimento célere de tecnologias científicas que possam servir a humanidade, como o exemplo das vacinas de combate à Covid-19.

Direito é ciência. Mas paira o seguinte indagar: se esse é ciência, tende a uma evolução? De quanto em quanto tempo? E qual o sentido desta evolução? Social? Teleológico? Doutrinário? Muitas dúvidas para poucas respostas.

Aplicando a evolução da ciência do direito, mais especificamente a ciência do direito processual, e mais ainda à (injustamente famigerada) Teoria Geral do Processo, podemos notar evoluções e mudanças no desenvolver tanto da teoria geral como das áreas da ciência processual.

Processo deixou de ser considerado direito adjetivo, pois era apenas mero meio de execução do direito material para uma ciência autônoma, com todas as suas valias. De fato, sem esta ciência não poderíamos ter hoje um desenvolvimento tão grandioso, como por exemplo com o surgimento do novo CPC (Código de Processo Civil).

Falando deste, de maneira específica, percebemos uma grande evolução em menos de cem anos: temos um CPC de 1939; o de 1972 (com suas diversas reformas) e o CPC de 2015, o qual foi construído especialmente por professores notáveis na área do processo civil, como Luiz Fux, Fredie Didier, Alexandre Freitas Câmara, a título de exemplo.

O que já seria diferente da esfera processual penal por exemplo, pois estamos ainda com o CPP de 1942, o qual na sua maior parte não foi recepcionado pela Constituição, além de haver em tramitação um projeto de Lei que envolve e faz um novo CPP.

O CPC tornou-se essencialmente didático, lógico, direto. Se tornou autoaplicável em sua divisão sistemática, facilitando a prática forense cível, ainda mais com o processo judicial eletrônico. Mas esqueceu-se de um detalhe: os juizados especiais.

Sabemos: juizados especiais são motivos de amor e ódios de muitos. Mas este instituto jurídico está aí. Por isso surge a pergunta: em quase trinta anos dos juizados, ainda vale a pena manter o "rito sumaríssimo", ou temos a necessidade de uma nova norma?

Esse é outro ponto de controvérsia que paira sobre nossas cabeças, como a exemplo: se houve a extinção do procedimento sumário, onde tudo passou a ser procedimento comum, os juizados seriam procedimento sumaríssimo? Ou rito especial? Ou ainda: seria um rito próprio?

Infelizmente este artigo não tem como entrar nesses debates de uma maneira aprofundada, o que gostaríamos muito de fazer. Mas, existem dois pontos que podem ser suscitados: a falha do CPC em ter regulado por inteiro a questão dos juizados, seja como rito especial ou rito específico; ou a criação de uma nova lei dos juizados especiais com base em quase trinta anos de seguimento da Lei.

A primeira questão está na denominada: "teoria da perda de uma chance" aplicada ao CPC. Quando houve sua elaboração poderia ser inserido dentro do CPC um capítulo específico ou um rito especial específico que fizesse a inserção do rito dos juizados especiais com as devidas melhoras.

Melhoras estas, surgentes com os fóruns dos juizados, seja a nível nacional ou estadual. Como sabe-se: muitos dispositivos do CPC/15 são súmulas ou entendimentos jurisprudenciais consolidados em forma de lei. Por qual razão não poderia haver um estudo e melhor elaboração de uma lei com base nos e diversos enunciados feitos.

Quando houve o surgimento da Lei nº 9.099/95 houve um grande avanço, mas de toda a forma ela saiu "desatualizada" pois, acreditava-se que iria resolver questões processuais em "poucos dias". Sabemos ser isto algo distante de nossa realidade, pois processos nos juizados podem demorar anos.  

Os fóruns de juizados são contributivos, especial nestes tempos de pandemia. A título de exemplo: com base no princípio da concentração de atos e celeridade, no juizado haverá apenas uma "audiência una".  Mas qual a razão disso? Tão somente produção de provas e peças processuais até a audiência. Sendo que na maioria das vezes acontecem antes.

Mas veio (com a graça divina) o PJE o qual permite a juntada de peças de quaisquer lugares, e agora com a pandemia a questão de audiências por vídeo conferência. Algo que parecia irreal, hoje é preferível pela maior parte dos agentes processuais, dada as suas comodidades.

Mas em qual lugar queremos chegar? Andamos por uma via de mão dupla, onde a "veículos" em ambos os sentidos. Se houve uma "transfusão" de conceitos da Lei 9.099/95 ao CPC, qual o óbice de uma aplicação do CPC aos juizados? Nenhuma. Tanto é: há complementariedade prevista na própria lei.

A título de exemplo: ação demandada entre indivíduo pedindo danos morais e materiais. Após o protocolo, surge no sistema:  audiência marcada para daqui a seis meses. Muito antes disso, a empresa de telefonia junta contestação.

O que podemos observar: primeiro é a distância da resolução efetiva do caso, ou seja: seis meses em algo que exige prova meramente documental. Segundo é: se houve juntada de contestação, é sinal de que a empresa de telefonia não vai reconhecer seu erro ou abrir proposta de acordo.

Proposta de acordo esta que pode ser juntada a qualquer momento por escrito. A pergunta é: preciso esperar seis meses para participar de uma audiência a qual será infrutífera? A resposta é simples: não.

Foi neste entendimento que o Fórum de Juizados de Pernambuco (Fojepe), com o seu enunciado de nº 99, trouxe uma "luz ao fim do túnel" o qual diz:

"ENUNCIADO 99: Em virtude da situação excepcional imposta pela pandemia da Covid-19, sendo a matéria tão somente de direito, é possível a dispensa da audiência UNA, mediante prévia intimação das partes, com o julgamento antecipado do pedido, a teor do disposto no artigo 355, I, CPC, que tem aplicação subsidiária na hipótese."

Ipsis Líteris, se assim podemos dizer, o atendimento do TJ-PE foi: se não há necessidade de ouvidas de partes ou testemunhas em audiência, especialmente se as provas são documentais, não há necessidade de se esperar tanto tempo apenas para um ato o qual restará infrutífero.

Se formos colocar de forma analógica o CPC em seu artigo 3º, §3º vemos que a possibilidade e estímulo de acordos entre as partes é durante todo o curso do processo. Surge outra indagação: qual a razão para isso não ser aplicado aos rito dos juizados? Resposta é: nenhuma.  

Pois bem, o intuito deste breve artigo é demonstrar o seguinte: estamos tendo diversas análises e colhendo frutos dos CPC/15 com seus oito anos de entrada no ordenamento jurídico brasileiro. Mas, surge a questão: será que não deveríamos ter esse olhar à Lei 9.099/95?

Não podemos massacrar o instituto jurídico que é os juizados e sim modificar ou até mesmo alterar, visando não somente a melhora do ponto de vista jurídico, mas o tratamento e resolução de problemas simples, os quais literalmente deixam o judiciário brasileiro.

Esperamos que em breve, nossos pedidos possam ser atendidos, e que da mesma maneira que houve uma saída de recursos específicos ao CPC da Lei 9.099/95, possa esta receber determinados institutos os quais tem sido muito bem aproveitado no judiciário brasileiro.

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  • é advogado da seccional de Pernambuco, atuante em Direito Constitucional e Administrativo e pós-graduado em Direito Público pela Escola Paulista de Direito (EPD).

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