Opinião

Domicílio judicial eletrônico:
uma nova fase processual

Autor

  • Tiago Carneiro Rabelo

    é analista do TJ-DF pós-graduado em Direito Digital e professor de processo judicial eletrônico no TJ-DF resoluções do CNJ (Justiça 4.0) na OAB-DF e Direito Digital no Gran.

26 de agosto de 2023, 17h05

Na era contemporânea, marcada por avanços tecnológicos e transformações digitais em todas as esferas da sociedade, o sistema judiciário não permanece alheio a essas mudanças. Uma notável expressão desse progresso é o "Domicílio Judicial Eletrônico", uma inovação que centraliza as bases de uma nova fase processual e que promete reconfigurar a forma como as comunicações processuais, especialmente a citação e a intimação eletrônica, ocorrem, bem como a maneira como os envolvidos interagem com o sistema legal.

O domicílio eletrônico atua como um centro de comunicações processuais no ambiente virtual do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), operando dentro da Plataforma Digital do Poder Judiciário (PDPJ). Ele recebe as comunicações dos tribunais (com exceção do Supremo Tribunal Federal — STF) e as direciona para pessoas físicas e jurídicas, independentemente de serem partes ou não na relação processual, contanto que estejam registradas no sistema.

Antes de prosseguirmos, é importante esclarecer alguns pontos relevantes:

1) O Domicílio Judicial Eletrônico estabelece um endereço virtual destinado a centralizar as comunicações processuais, incluindo citações, intimações e notificações, de maneira eletrônica, abrangendo tanto pessoas jurídicas quanto físicas.

2) Especificamente no âmbito do Processo Judicial Eletrônico (PJe), haverá uma modificação no sistema que indicará o envio de comunicações através do Domicílio Judicial Eletrônico na tela de acompanhamento dos trâmites dos autos digitais. Isso fornecerá um indício de que o expediente foi encaminhado via plataforma do Domicílio Judicial Eletrônico.

3) No caso de indisponibilidade da plataforma do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o sistema apresentará o seguinte alerta: "Aviso: Domicílio Eletrônico offline! Embora o Domicílio Eletrônico esteja temporariamente indisponível, os expedientes serão gerados no PJe e transmitidos automaticamente assim que a comunicação for restabelecida".

4) É importante ressaltar que o Domicílio Judicial Eletrônico não assume a responsabilidade pelo controle dos prazos processuais.

A introdução de uma nova plataforma de comunicação eletrônica traz consigo uma série de procedimentos importantes. Por exemplo, no que diz respeito aos expedientes de citação, será necessário aguardar o registro da ciência por parte do destinatário ou de seu representante legal, dentro de um prazo de três dias úteis.

No caso de não haver esse registro dentro desse prazo, o sistema automaticamente encerrará o expediente no Processo Judicial Eletrônico (PJe), conforme previsto no §1º-A do artigo 246 do CPC. Essa situação exigirá que a unidade judicial tome medidas adicionais, como a renovação da diligência através de outros meios, como o Correio, Oficial de Justiça ou Edital.

Em relação a outros cenários, se não ocorrer o aperfeiçoamento da comunicação processual em até dez dias corridos, a contar da data do envio da comunicação processual ao Domicílio Judicial Eletrônico, a realização da comunicação será considerada automaticamente feita na data do término desse período. Isso está alinhado com o artigo 5º, §3º, da Lei nº 11.419/2006, e não se aplica ao intervalo de tempo o disposto no artigo 219 do CPC/2015.

Percebe-se, desse modo, que a plataforma do Domicílio Judicial Eletrônico não tem a função de gerenciar os prazos processuais. Ela se configura como um meio singular e centralizado para o recebimento e a disponibilização de comunicações judiciais entre os atores processuais. Destaca-se, portanto, que essa abordagem visa a simplificação para os destinatários, permitindo que todas as comunicações sejam recebidas em um único local, desde que os mesmos estejam habilitados no Domicílio Judicial Eletrônico.

A criação do Domicílio Judicial Eletrônico, que está presente em dez tribunais brasileiros, é resultado da preferência pela citação em meio eletrônico, que foi estabelecida no CPC de 2015 por meio da Lei nº 14.195, de 26 de agosto de 2021, in verbis:

"Artigo 246. A citação será feita preferencialmente por meio eletrônico, no prazo de até 2 (dois) dias úteis, contado da decisão que a determinar, por meio dos endereços eletrônicos indicados pelo citando no banco de dados do Poder Judiciário, conforme regulamento do Conselho Nacional de Justiça.
§1º As empresas públicas e privadas são obrigadas a manter cadastro nos sistemas de processo em autos eletrônicos, para efeito de recebimento de citações e intimações, as quais serão efetuadas preferencialmente por esse meio.
§1º-A A ausência de confirmação, em até três dias úteis, contados do recebimento da citação eletrônica, implicará a realização da citação:
I – pelo correio;
II – por oficial de justiça;
III – pelo escrivão ou chefe de secretaria, se o citando comparecer em cartório;
IV – por edital.
§1º-B Na primeira oportunidade de falar nos autos, o réu citado nas formas previstas nos incisos I, II, III e IV do § 1º-A deste artigo deverá apresentar justa causa para a ausência de confirmação do recebimento da citação enviada eletronicamente.
§1º-C Considera-se ato atentatório à dignidade da justiça, passível de multa de até 5% do valor da causa, deixar de confirmar no prazo legal, sem justa causa, o recebimento da citação recebida por meio eletrônico.
§2º O disposto no §1º aplica-se à União, aos Estados, ao Distrito Federal, aos Municípios e às entidades da administração indireta.
§3º Na ação de usucapião de imóvel, os confinantes serão citados pessoalmente, exceto quando tiver por objeto unidade autônoma de prédio em condomínio, caso em que tal citação é dispensada.
§ 4º As citações por correio eletrônico serão acompanhadas das orientações para realização da confirmação de recebimento e de código identificador que permitirá a sua identificação na página eletrônica do órgão judicial citante."

No universo do Domicílio Judicial Eletrônico, a obrigatoriedade de cadastro abraça uma ampla gama de entidades, equiparando a União, os estados, o Distrito Federal, os municípios, as entidades da administração indireta e tanto as empresas públicas quanto privadas. Além desse leque, o Ministério Público, a Defensoria Pública e a Advocacia Pública também ingressam como participantes, tal como estabelecido pelo artigo 1.050 do CPC de 2015, inclusive em relação ao recebimento das intimações.

No tocante às pessoas físicas, a abordagem é delineada pelo artigo 77, inciso VII, do CPC de 2015, concedendo-lhes o acesso ao cadastro no Domicílio Judicial Eletrônico. Esse acesso lhes permite a realização de consultas públicas e a facilidade de receber citações e intimações eletrônicas. No que concerne a autenticação, os caminhos são diversos. Pode-se optar pelo uso de certificado digital ou, alternativamente, pelo acesso via login único na Plataforma Digital do Poder Judiciário (PDPJ), validado pelo serviço gov.br (em nível prata ou ouro).

Com efeito, é incontestável a variedade de critérios empregados na publicação de atos judiciais pelos diversos tribunais brasileiros. E assim, diante desse verdadeiro mosaico de critérios dignos de um quebra-cabeças judicial, surge uma solução que parece ter saído diretamente dos sonhos dos profissionais do direito: a Plataforma Digital do Poder Judiciário Brasileiro (PDPJ-Br).

Com a PDPJ-Br, o Diário de Justiça Eletrônico Nacional (DJEN) e o Domicílio Judicial Eletrônico se unem, criando uma paisagem processual mais clara e acessível para todos os usuários. É um passo em direção à simplificação, onde a variedade de critérios cede espaço para uma abordagem coesa e facilitada.

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