Opinião

​​​​​​​O ICMS Paulista e a espera que não acaba

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26 de agosto de 2023, 6h30

Historicamente, sempre houve grande dificuldade dos contribuintes paulistas em reaver ativos de ICMS, apesar das expressas garantias para sua imediata restituição dadas tanto pela Constituição Federal quanto pela Lei Kandir.  

Estão nesse contexto créditos acumulados decorrentes de exportações, diferenças de alíquotas ou outras operações desoneradas total ou parcialmente com direito a manutenção do imposto constante das compras; assim como os créditos vinculados a ressarcimentos do ICMS substituição tributária.

Para os créditos acumulados a fazenda paulista tem apresentado nos últimos anos algumas soluções para tornar mais eficiente sua monetização, como é o caso do Programa Pro Ativo que concede maior liquidez a quem investe em São Paulo, facilitando a utilização pelos contribuintes com histórico de aquisições de bens destinados ao ativo imobilizado.

Por sua vez a Portaria SRE nº 54/2022 autorizou a apropriação de créditos acumulados, antes da verificação pelo fisco para contribuintes classificados nas categorias "A+", "A" ou "B" do Programa de Estímulo à Conformidade Tributária  "Nos Conformes", instituído pela Lei Complementar nº 1.320/2018, desde que observados os enquadramentos e prestação de garantias por ela estipulados.

Não obstante tais iniciativas, as mesmas ainda representam barreiras e condições para devolução de créditos, relativizando o direito a ressarcimento há muito assegurado pelo Congresso Nacional. A Sefaz/SP cria categorias de contribuintes para fruição de um mesmo direito, o que se mostra desarrazoado e inconcebível, a despeito do volume que se apresenta para análise.

O que dizer então dos pedidos de ressarcimento de ICMS-ST decorrentes de saídas para fora do estado e principalmente da diferença entre o preço presumido considerado pelos substitutos tributários e o praticado com consumidores finais, que se sujeitam ao moroso e complicado trâmite da Portaria CAT º 42/2018. Com base nela, o fisco paulista se vale tanto de barreiras tecnológicas como da ausência de um prazo legal de análise dos pleitos protocolizados, para represar a validação e a liberação de créditos legítimos.

Desde a decisão vinculante proferida pelo STF em outubro de 2017 que ratificou definitivamente o direito ao ressarcimento do imposto retido em relação a preços presumidos que não se concretizam integralmente, passou a haver uma assoberbada demanda de pedidos formulados por contribuintes, restando claro pelos tempos de espera não haver estrutura estatal suficiente para dar vazão a suas auditorias.

Há muito vem sendo prometido a conclusão do sistema (e-ressarcimento) que propicie maior agilidade na análise e liberação de créditos de ICMS-ST, todavia a data de início de seu pleno funcionamento com o módulo de conta corrente ainda faltante, vem sendo constantemente adiada pelo fisco paulista. Em tempos de inteligência artificial e inúmeras ferramentas tecnológicas, difícil compreender tamanha inércia estatal em estabelecer um rito célere para validação dos créditos ressarcíveis de ICMS.

A desídia é tão grande que diferente de outras unidades da federação, nosso Poder Executivo, sequer se dá ao luxo de incorporar expressamente na legislação paulista, a previsão do artigo 10 da Lei Kandir que garante o direito de apropriação escritural para créditos objeto de pedido de ressarcimento não analisados no prazo de 90 dias. Importante esclarecer que fiscalização paulista não se opõe a este permissivo, mas como dito não o normatiza internamente como fazem outras unidades da federação.

Já as demais formas de monetização de ressarcimento prevista atualmente como emissão de notas de transferência para substitutos tributários e recebimento em espécie, dependem do resultado de auditorias fiscais cujo prazo para realização é completamente incerto.

Esta constante ausência de prestação estatal na análise de pedidos de apropriação de crédito acumulado e pleitos de ressarcimento de ICMS-ST, tem levado as empresas a se socorrem do judiciário paulista para obter provimentos que impulsionem a efetivação destas auditorias.

Sensibilizado pelo cenário em comento, o Tribunal de Justiça em várias oportunidades, com base no artigo 33 da Lei Estadual nº 10.177/1998 e no princípio constitucional da eficiência aplicável à Administração Pública, tem proferido decisões que determinam a imediata conclusão da análise de pedidos formulados há mais de 120 dias, sendo exemplos cabais deste entendimento os acórdãos proferidos nas apelações nº 1005894-20.2022.8.26.0405 e 1021485-79.2020.8.26.0053.

Apesar de ser reconfortante saber que o Poder Judiciário está atento a inércia fazendária, aplicando-lhe a devida reprimenda, tornar regra a necessidade do uso desta via para materializar garantias asseguradas há décadas pelo Congresso Nacional, mostra-se como um descompasso ao Estado Democrático de Direito.

Não se nega aqui o necessário zelo que deve pautar a ação revisora do fisco paulista para reconhecimento de créditos de ICMS. Por outro lado, ele não pode se sobrepor a mandatória eficiência constitucional aplicável na execução desta tarefa. Ainda que a morosidade atual possa também estar motivada por razões orçamentárias, não é justo repassar seu ônus ao contribuinte, sob pena do Estado interferir indevidamente no assegurado direito de livre iniciativa que permeia o  pleno exercício da atividade econômica.

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