Assistência jurídica constitucional

Operadores do Direito se unem contra crise da Defensoria Pública nos EUA

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18 de agosto de 2023, 9h47

Um juiz federal no estado de Oregon, nos EUA, mandou o xerife do Condado de Washington soltar todos os presos que, detidos por 10 dias na cadeia pública, ainda não tiverem assistência jurídica, seja por defensor público ou advogado dativo.

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Para o juiz, manter pessoas presas, sem representação por advogado, é uma violação da 6ª Emenda da Constituição, que garante os direitos dos réus, entre os quais o de ter "assistência jurídica de um advogado em sua defesa".

São 37 presos, entre eles réus acusados de crimes violentos, crimes contra a liberdade sexual e de abuso infantil. No estado, há 170 presos a ponto de voltar para as ruas, porque em Oregon, como em outros tantos estados dos EUA, se agravou a "crise da defensoria pública".

Com essa ordem, o juiz federal aderiu à luta dos defensores públicos de Oregon que, por sinal, já haviam conquistado alguns aliados pouco prováveis: promotores dos condados do estado. Os promotores também têm suas razões para defender a Defensoria Pública.

O chefe da Promotoria do Condado de Washington, Kevin Barton, por exemplo, divulgou uma declaração em que pede ao governador e parlamentares do estado "ações imediatas e significativas para resolver a crise de réus sem assistência jurídica".

O promotor pediu mais verbas para a Defensoria Pública, que precisa de mais profissionais e mais recursos. Ele argumenta em sua declaração:

"Os réus têm direito a um advogado, as vítimas têm o direito de levar o réu a julgamento e o público tem o direito a um sistema de justiça criminal funcional, que mantenha as pessoas seguras. Todos esses três direitos têm de ser honrados;"

O processo foi iniciado pelo chefe da Defensoria Pública de Oregon, Fidel DuCloux. Ele moveu uma ação contra o xerife Pat Garrett, em julho, a favor de diversos presos na cadeia do Condado de Washington.

Na ação ele alega que manter os réus na cadeia ou colocá-los em condições restritivas porque não têm advogados, devido à alta escassez de defensores públicos, viola o direito que lhes é garantido pela Sexta Emenda da Constituição, que estabelece:

"Em todos os processos criminais, o acusado terá o direito a julgamento rápido e público, por um júri imparcial do estado e do distrito em que o crime foi cometido, distrito esse que deve ter sido previamente confirmado por lei, de ser informado sobre a natureza e a causa da acusação, de confrontar as testemunhas contra ele, de ter um processo compulsório para obter testemunhas a seu favor e de ter a assistência de um advogado em sua defesa."

Nas décadas de 60 e 70, a Suprema Corte expandiu o direito do réu a um advogado em "Gideon v. Wainwright", estabelecendo que o estado deve arcar com os custos da defesa de réus que não podem pagar um advogado, através de defensor público ou advogado dativo.

Em Argersinger v. Hamlin, a corte decidiu que nenhum réu indigente pode ser preso, nem mesmo por uma contravenção penal, a não ser que lhe seja garantido o direito a um advogado.

Esse é o problema de Oregon, bem como do Colorado, Delaware, Illinois, Indiana, Louisiana, Mississippi, Missouri, Nevada, Novo México, Oregon, Rhode Island,  Utah e Wisconsin, segundo levantamentos da American Bar Association (ABA) e do Sixth Amendment Center.

A ABA afirma, no estudo de 2022, que Oregon tem apenas 31% dos defensores públicos necessários para cumprir a missão que lhes foi destinada pela Constituição. Assim, cada defensor público tem a carga de trabalho que caberia a três defensores — e pouco tempo para cuidar de cada caso.

Defensores públicos pedem demissão frequentemente, porque o salário é muito baixo e a carga de trabalho é muito alta — impossível de ser cumprida, aliás, mesmo que estendam o expediente todos os dias.

Atualmente, o estado de Oregon tem 592 defensores públicos trabalhando em tempo integral. Para cuidar de toda a carga de trabalho, cada defensor teria de trabalhar 26,6 horas por dia, segundo a ABA. O estudo sugere que Oregon precisaria contratar pelo menos mais 1.296 defensores públicos, para trabalhar em tempo integral.

De acordo com o Oregon Judicial Department, o Condado de Washington tem 311 réus sem representação (37 dos quais na cadeia), o terceiro maior número do estado, depois do Condado de JacKson que tem 530 e do Condado de Multnomah com 505 presos sem advogados.

No Condado de Multnomah, por sinal, 285 processos criminais foram trancados, de fevereiro a outubro de 2022, porque os réus não tinham assistência jurídica, devido à falta de defensores públicos.

O promotor do Condado, Mike Schmidt, divulgou uma declaração, pedindo ações do estado para salvar a Defensoria Pública, sob pena de se enviar uma mensagem de que não há responsabilização penal para pessoas que cometem crimes.

Um relatório do Departamento de Justiça afirma que, no país, 80% dos réus acusados de crimes violentos e 66% dos réus acusados de crimes federais dependem de defensores públicos ou advogados dativos. Pelo menos metade desses réus — e dois terços dos réus que contratam advogados — conseguem responder ao processo em liberdade.

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