Opinião

Reajuste do piso da enfermagem e suas implicações para a saúde suplementar

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30 de setembro de 2022, 18h09

No último dia 4 de setembro, o então presidente Jair Bolsonaro aprovou o projeto de Lei nº 2.564/2020 que prevê o aumento do teto salarial dos enfermeiros, técnicos de enfermagem, auxiliares e obstetrizes registrados em todo o país. Todavia, após o recebimento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 7.222, proposta pela Confederação Nacional de Saúde, Hospitais e Estabelecimentos e Serviços (CNSaúde), entre outros entes, a referida lei foi suspensa por decisão liminar do Supremo Tribunal Federal (STF).  

Em razão dos argumentos nela trazidos, o ministro Luís Roberto Barroso suspendeu a vigência da lei, confirmada depois em plenário pelo colegiado do STF, e deu prazo de 60 dias para entes públicos e privados da área da saúde esclarecerem o impacto financeiro, os riscos para empregabilidade no setor e eventual redução na qualidade dos serviços. O ministro destacou que "é preciso atentar, neste momento, aos eventuais impactos negativos da adoção dos pisos salariais impugnados". "Trata-se de ponto que merece esclarecimento antes que se possa cogitar da aplicação da lei".

Pois bem, antes mesmo de esclarecer os principais impactos na área de saúde suplementar, é preciso informar ao leitor, de forma resumida, como se dá a aprovação de uma lei federal e qual o papel do STF neste local.  

Elaborado o projeto de lei pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado (Poderes Legislativos), este é votado nas respectivas casas por maioria simples (maioria dos deputados federais e maioria dos senadores, cada um em sua seara), o projeto segue para sanção ou veto do presidente da República (Poder Executivo). Caso o presidente sancione a Lei, há ainda, em regra, o período de 45 dias de vacância, ou seja, o período entre a data de sua publicação até a sua vigência. Neste ínterim, qualquer ente listado nos incisos de I a IX do artigo 103 da Constituição que se sinta prejudicado pela nova norma pode ingressar com uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI), que visa declarar que uma lei ou parte dela é inconstitucional, ou seja, contraria a Constituição.

Diferentemente do que se ouve nas ruas, o STF não está tentando "barrar" o que já foi aprovado. Mas é preciso cautela para que nenhuma legislação ultrapasse os limites do que assegura a Constituição cidadã. Não que a classe não mereça, compreendam, o que se deve analisar é como melhor aplicar a norma. Por essas razões, comum é a decisão do ministro em suspender a vigência da lei até apuração de todas as provas carreadas à ADI. Consoante exposto acima, fica o questionamento de quais os prejuízos que poderão, então, serem suportados pela saúde suplementar?  

De maneira mais didática, vislumbremos uma ação em trâmite pelo procedimento comum, por exemplo, onde é corriqueiro existir o pedido para que o plano de saúde custeie determinado procedimento. Este procedimento engloba honorários médicos, custos com instrumentador (que pode ser um técnico em enfermagem), enfermeiros, fisioterapeutas etc. Tudo isso tem um valor para a operadora. Logo, com o aumento do piso salarial, esses custos se tornarão mais onerosos, fazendo com que as empresas revejam seus contratos, tornando-os mais caros ao consumidor que desejar aderir a um plano de saúde. Ainda, é possível que os hospitais públicos e privados, por não abarcarem o ônus deste reajuste salarial, se movimentem para readequar seu quadro de funcionários, o que será ainda um possível risco à qualidade de atendimento dos pacientes, bem como poderá implicar na diminuição do número de leitos.  

Conforme se extrai da presente ADI nº 7.222, o incremento financeiro necessário ao cumprimento dos pisos será de mais R$ 4 bilhões ao ano para os municípios, bem como de mais de R$ 1 bilhão ao ano para os estados e de R$ 53 milhões ao ano para a União. Além do custo para as Santas Casas e entidades filantrópicas. Portanto, não são adaptações simples a se fazer caso a lei entre em vigor em parte ou em sua totalidade. Será preciso aumentar os repasses financeiros à área da saúde pública, revisitar contratos privados e assim conceder o benefício legal à classe de enfermagem que merece o reconhecimento salarial por garantirem um serviço indispensável.

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