Opinião

Recuperação extrajudicial do produtor rural: um instrumento a considerar

Autor

  • Juliana Biolchi

    é mestre em Direito das Relações Sociais pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e em Direitos Humanos e Desenvolvimento pela Universidad Pablo de Olavide de Sevilla na Espanha especialista em Direito Público pela Universidade Luterana do Brasil (Ulbra) e em Direito Tributário pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) diretora geral da Biolchi Empresarial conselheira independente coordenadora do Observatório Brasileiro de Recuperação Extrajudicial (Obre) conselheira na Câmara Especial de Resolução de Conflitos em Reestruturação de Empresas (CamCMR especialista em Negociações Complexas e em Recuperação Extrajudicial e membro da Task Force de Mediação para Empresas em Recuperação do Instituto de Mediação e Arbitragem do Brasil (Imab).

22 de setembro de 2022, 11h04

O ano de 2022 entrará para a história da agricultura do Brasil, principal produtor e exportador de soja global, como o da maior quebra desta cultivar. Não há dúvida de que o impacto será sentido pelos produtores rurais que, muitas vezes, buscam crédito para financiar o plantio. O perigo da inadimplência é real e concreto e deverá ser o desafio enfrentado, principalmente na região sul do país.

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Além da disponibilidade de ajuda do governo, que costuma socorrer o agronegócio (ainda que os desafios próprios do ano eleitoral possam trazer algum abalo a esse movimento), pontua-se que existem meios legais que podem auxiliar o produtor na renegociação de seu endividamento junto a seus credores, notadamente a recuperação judicial e a recuperação extrajudicial, ambas previstas na Lei de Recuperação de Empresas, Lei 11.101/2005.

O empresário rural, assim considerado o agricultor que, por opção, inscreve-se no registro público de empresas mercantis, a cargos das Juntas Comerciais, desde 2005 já tem à sua disposição o acesso aos instrumentos previstos na referida legislação. Essa possibilidade foi reforçada em 2013, com a Lei 12.873, que flexibilizou a comprovação do exercício da atividade há, pelo menos, dois anos, equiparando o período antes do registro na Junta.

Entretanto, o tema nunca foi tranquilo. Não só pela mencionada equiparação para comprovação do exercício regular da atividade há pelo menos dois anos, mas também sob o argumento de seria uma opção que poderia vir depois de já firmados os contratos eventualmente geradores de créditos sujeitos a plano de recuperação. Incomodava o mercado a possibilidade de mudança das regras do jogo com ele já em andamento. Tais questões foram motivo de discussões, levadas ao Superior Tribunal de Justiça. Muita insegurança jurídica se criou a partir desses pontos.

Em 2021, com a reforma da Lei de Recuperação de Empresas (pela Lei 14.112/2020), o art. 49, ganhou alguns parágrafos, que limitaram a abrangência da recuperação judicial do produtor rural: somente estarão sujeitos créditos que decorram exclusivamente da atividade rural e que constem na escrita contábil do produtor; não tenham sido concedidos no escopo da política de crédito rural; não tenham sido renegociados nos termos de ato do Poder Executivo e que não sejam oriundos de dívida constituída nos três últimos anos, anteriores ao pedido, com a finalidade de aquisição de propriedades rurais, bem como as respectivas garantias.

Por um lado, veio a almejada segurança jurídica. Por outro, a recuperação judicial do produtor rural acabou se tornado menos abrangente.

Ocorre que essas limitações são exclusivamente para a recuperação judicial. Na recuperação extrajudicial, instrumento semelhante, mas que se caracteriza pela renegociação fora dos Tribunais, não se tem as amarras específicas do crédito rural, porque o artigo 161, da Lei, não as prevê (vigem apenas as limitações do artigo 49, §3º, e do artigo 86, da Lei 11.101/2005, que também se aplicam à recuperação judicial).

Resultado: ela é mais aberta e, a depender do caso concreto, uma alternativa possivelmente mais atrativa. Por isso, em um cenário de crise liquidez (impossibilidade de pagamento das obrigações contratadas), decorrente da enorme quebra de safra anunciada, a Lei de Recuperação reserva, ao empresário rural, um instrumento que pode ser a saída para a superação das dificuldades que o cenário apresenta. Ou seja, uma opção a ser seriamente avaliada.

Autores

  • é advogada, mestre e especialista em revitalização de empresas, empresária, palestrante de congressos nacionais e internacionais na área de insolvência empresarial e diretora da Biolchi Empresarial.

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