Opinião

Aspectos gerais da due diligence imobiliária

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6 de setembro de 2022, 13h09

O que é?
"Due diligence" ("DD") consiste em um procedimento de análise detalhada de documentos e informações de um determinado negócio, com o objetivo de mapear eventuais passivos, contingências e/ou riscos a ele inerentes.

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A partir dos passivos, contingências e/ou riscos identificados durante a DD, as partes adquirem subsídios para a melhor definição de suas obrigações, responsabilidades, termos e condições no negócio pretendido.

A due diligence imobiliária é justamente o procedimento acima definido aplicado a negócios que envolvam, direta ou indiretamente, a aquisição de quaisquer direitos, reais ou pessoais, sobre bens ou ativos imobiliários.

Quais tipos de negócios demandam due diligence imobiliária?
A DD imobiliária deve ser realizada em quaisquer negócios que envolvam a constituição de direitos, aquisição ou investimento em ativos ou em veículos que investem ou empreendem sobre base de ativos imobiliários.

Partindo dessa premissa, tem-se que todos os negócios elencados a seguir demandam realização de DD, no mínimo para verificar a legitimidade da contraparte para firmar o contrato relativamente ao imóvel:

— aquisição ou locação de imóveis para fins residenciais ou comerciais;

— desenvolvimento imobiliário (incorporações imobiliárias, built-to-suit, etc);

— contratos de direitos reais de garantias ;

— investimento em sociedades ou veículos de investimento voltados para o mercado imobiliário, ou seja, em setores que demandam uma base significativa de ativos imobiliários (energia; mineração; agronegócios etc.)

Em geral, busca-se verificar tanto a aptidão dos imóveis às destinações pretendidas (por exemplo: uso direto ou desenvolvimento imobiliário) quanto a existência de passivos, contingências e riscos associados aos imóveis e/ou aos seus proprietários ou titulares de outros direitos sobre os imóveis.

Não existe uma lista ("checklist") de documentos única a adequada a toda due diligence imobiliária, de modo que cada negócio e cada imóvel pretendido demandará a análise dos documentos e informações pertinentes. Dentre outros aspectos, busca-se verificar:

1) a existência de eventuais ônus sobre o imóvel-alvo, por meio da análise, principalmente, de sua certidão de matrícula vintenária [1], de seu título aquisitivo pelo proprietário e de contratos que tenham como objeto direitos ou obrigações sobre o bem;

2) a regularidade das construções eventualmente existentes no imóvel, pela análise de alvará de construção (para obras em andamento) e de "habite-se" (para obras concluídas),

3) a existência de débitos tributários, por meio da análise de certidões de tributos imobiliários;

4) a existência de processos judiciais, em que o vendedor é parte, que possam levar a posterior reconhecimento de fraude contra credores ou fraude à execução em caso de transferência do imóvel, por meio da análise de certidões de distribuição de ações cíveis e trabalhistas e do conteúdo dos processos;

5) da saúde financeira do vendedor, se pessoa jurídica, pela análise de balanços patrimoniais; e

6) de situações específicas que surjam ao longo da realização da due diligence.

Nos casos de DDs realizadas no contexto de operações de fusão e aquisição ("M&A") e no âmbito do mercado de capitais, que tangenciem indiretamente ativos imobiliários, a tendência (porém não a regra) é de que o foco seja a análise de documentos e informações básicas do ativo imobiliário em si, bem como de licenças imobiliárias que permitam o funcionamento das atividades nos imóveis exercidas pelas pessoas que as ocupam.

Quando fazer?
Em regra, a realização de uma DD é feita previamente à concretização do negócio pretendido, isto é, antes da celebração dos seus documentos definitivos. No caso dos negócios imobiliários, quando esses buscam a constituição ou transferência de direitos reais sobre bens imóveis (por exemplo: propriedade, servidão, usufruto, alienação fiduciária, hipoteca etc) [2], geralmente, tais documentos definitivos são firmados sob a forma de escrituras públicas, por força do artigo 108 do Código Civil [3].

Porém, normalmente, as DDs são precedidas da celebração de contratos unilaterais ou não vinculantes entre as partes, os quais estabelecem as premissas básicas do negócio e o prazo de execução da DD (p.ex.: opções, protocolos de intenções, propostas não vinculantes, memorandos de entendimentos, term sheets etc.).

Uma vez concluída a DD, e, via de consequência, com a devida identificação dos passivos, contingências e riscos, as partes, subsidiadas por suas informações, negociam os contratos vinculantes do negócio desejado (promessas de compra e venda ou compras e vendas sob condições suspensivas e resolutivas), nos quais são refletidos os resultados da DD nas obrigações, responsabilidades, termos e condições contratuais.

Uma vez implementadas as condições definidas nos contratos vinculantes a partir da DD, as partes finalmente celebram os documentos definitivos.

Qual o resultado da due diligence imobiliária?
Tanto no caso de transações de caráter puramente imobiliário, como no caso de operações societárias, após a realização da DD, geralmente é elaborada uma matriz de risco ou relatório, indicando todos os pontos de atenção apurados (passivos, contingências e riscos), com direcionamentos para a negociação e elaboração dos contratos vinculantes da operação.

Tais contratos são irrevogáveis e irretratáveis, sendo elaborados em casos em que há condições que precisam se implementar antes da celebração dos documentos definitivos. São as chamadas condições suspensivas para o fechamento da operação [4], em geral relacionadas à obtenção de licenças e autorizações, à regularizações imobiliárias prévias, às aprovações prévias, a financiamentos e até mesmo ao resultado satisfatório da DD.

Uma vez implementadas as condições suspensivas, as partes partem para a elaboração dos documentos definitivos, que, via de regra, são posteriormente registrados junto aos cartórios de registro de imóveis para  a constituição, modificação ou extinção de direitos reais sobre os imóveis pretendidos (escrituras públicas, atos societários ou contratos com força de escritura).

Como se vê, a DD é etapa de extrema relevância, uma vez que seus resultados direcionam a realização do negócio, como a definição do preço, das condições das cláusulas de declarações e garantias, e de indenização entre as partes.


[1] Documento expedido pelo Cartório de Registro de Imóveis competente que possui o histórico de todas as alterações e transferências que ocorreram sobre o imóvel nos últimos vinte anos. Pela análise da certidão de matrícula, é possível verificar a cadeia dominial e a regularidade das transferências ocorridas ao longo do tempo.

[2] Em grande medida, direitos reais são aqueles previstos no artigo 1.225, da Lei federal nº 10.406/2002 ("Código Civil").

[3] Artigo 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário-mínimo vigente no País.

[4] Artigo 125, do Código Civil.

Autores

  • é bacharel e mestre em Direito Administrativo pela Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), advogado e sócio responsável pela área de Direito Público e Regulatório do Freitas Ferraz Capuruço Braichi Riccio Advogados.

  • é associada do Freitas Ferraz Advogados.

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