Opinião

Tesouro oculta valor total da dívida pública

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17 de outubro de 2022, 18h06

Como vem acontecendo há muitos anos, a Secretaria do Tesouro Nacional (STN) também ocultou parte importante da Dívida Pública Federal (DPF) no Relatório Mensal (RMD) de agosto de 2022 (clique aqui e acesse o documento original).

Ao consultarmos detidamente anexo desse relatório constatamos que o valor do Estoque da DPF, ou seja, o valor total da DPF, atinge o valor de R$ 7,873 trilhões e não o valor de R$ 5,781 trilhões, como é informado, com destaque, tanto apresentação quanto no texto desse mesmo relatório.

Portanto, para sabermos o valor total da DPF é preciso agregar aos R$ 5,781 trilhões informados outros R$ 2,092 trilhões, ou seja, precisamos agregar mais 36% à importância divulgada.

Dessa forma, como o valor total da DPF é de R$ 7,873 tri, a STN oculta, tanto na apresentação quanto no texto do RMD, 27% deste valor.

Com base nestes mesmos documentos, passo a demonstrar a ocultação.

Na apresentação do RMD, o valor de R$ 5,781 trilhões é apresentado como sendo o valor total da DPF, conforme demonstrado no quadro 1.

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Da mesma forma, o texto do RMD informa, em dois momentos, o valor de R$ 5,781 tri como sendo o valor total da DPF, conforme demonstrado nos quadros 2 e 3.

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É importante registrar que esse ocultamento adquire grande importância na medida em que o anúncio enfático desse valor pela STN passa a ser amplamente difundido e analisado, especialmente pela mídia, pela academia e pelo mercado financeiro.

Contudo, na tabela anexada ao RMD a STN confessa que o valor total da DPF é de R$7,873 tri, mas essa confissão é feita de forma escamoteada ao não computar na totalização da tabela Anexo 2.1 — Estoque da DPF a importância de R$ 2,092 tri, conforme verificamos no quadro 4.
 

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Após vencer as barreiras da descompactação do arquivo e do domínio de uma planilha de cálculos o leitor ainda é induzido a crer que o valor de R$ 5,781 tri é a totalização da tabela, ou seja, que o total colocado em destaque seja o valor total da DPF.

Como podemos observar, a tabela tem o título de Estoque da DPF e tem os subtítulos 1) DPMFi (Dívida Pública Mobiliária Federal interna); 2) DPFe (Dívida Pública Federal externa); e 3) DPMFi em poder do Banco Central (Dívida Pública Mobiliária Federal interna em Poder do Banco Central), mas, mesmo que os valores apresentados sejam informados como sendo de dívidas do ente federado União, eles não são integralmente somados.

Com efeito, somando-se todos os valores da tabela, verificamos que no valor da barra superior — que visualmente sugere ser a totalização das parcelas abaixo — não está incluída a parcela de R$ 2,092 tri.

Um pequeno parêntese: somente esse valor ocultado de R$ 2,092 tri equivale a 121% das receitas tributária e de contribuições do ente federado União do ano de 2021, que totalizaram R$ 1,735 tri (clique aqui para acessar o Balanço Geral da União de 2021).

Voltando.

Uma observação mais atenta ainda nos mostra que o valor de R$ 5,781 tri é o resultado da soma da DPMFi (R$ 5,535 tri) com a DPFe (R$ 246 milhões) e que o valor da DPMFi em poder do Banco Central (R$ 2,092 tri) é totalmente desconsiderado na totalização da tabela, apesar de esta ter como título Estoque da DPF.

Ora, os títulos da Dívida Mobiliária Federal interna em poder do Banco Central devem obrigatoriamente compor o valor total da DPF, pois 1) são títulos financeiros emitidos pela STN; 2) têm preço; 3) têm prazo de vencimento; 4) têm taxas de juros; 5) têm método de atualização monetária, que compõem a rentabilidade total; e 6) são utilizados, principalmente, para a realização das chamadas operações compromissadas entre o Banco Central e o sistema financeiro onde esses títulos são entregues como garantia dessas operações.

Aliás, segundo a definição da própria STN, a Dívida Pública Federal (DPF) refere-se a todas as dívidas (contratual e mobiliária, interna e externa) assumidas pela esfera federal (clique aqui para acessar o glossário da STN).

A Secretaria do Tesouro Nacional (órgão da Secretaria-Especial de Fazenda, subordinado ao Ministério da Economia) tem em seu organograma os setores do Controle e Pagamento da Dívida Pública, do Planejamento Estratégico da Dívida Pública e das Operações da Dívida Pública, portanto a STN centraliza todas as decisões relacionadas ao gerenciamento da Dívida Pública Federal tanto a interna quanto a externa (clique aqui para acessar o livro Dívida Pública – A Experiência Brasileira, lançado pela STN).

Além desses, ela também têm os setores de Planejamento e Programação Financeira, Tesouraria, Informações de Custos e do Sistema Integrado de Gestão Patrimonial, Normas de Contabilidade Aplicadas à Federação, Contabilidade da União, Estudos Econômico-Fiscais, Planejamento e Riscos Fiscais, Execução e Controle de Operações Fiscais, Operações Fiscais, Participações Societárias, Haveres Financeiros, Análise Financeira dos Estados e Municípios, Operações de Crédito de Estados e Municípios e de Análise, Informações e Execução de Transferências Financeiras Intergovernamentais.

Como um importantíssimo órgão do ente federado União, a STN não pode se permitir prejudicar a transparência e as análises das contas públicas e continuar ocultando o real valor total da Dívida Pública Federal.

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