Lugar errado

CNJ mantém decisão que negou vaga de cotista a candidato branco no Rio

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4 de outubro de 2022, 21h44

O Plenário do Conselho Nacional de Justiça decidiu nesta terça-feira (4/10) que é procedente um procedimento de controle administrativo (PCA) aberto para excluir um candidato da lista de aprovados em um concurso para ingresso na magistratura.

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TJ-RJTribunal de Justiça do Rio de Janeiro terá
de excluir candidato da listra de cotistas 

Segundo a entidade, o concorrente não preenche os requisitos necessários para disputar vaga reservada a candidato negro. A decisão foi tomada, por maioria de votos, na 357ª Sessão Ordinária do CNJ. O pedido foi proposto pela Associação Nacional da Advocacia Negra (Anan) contra o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.

O relator do processo, conselheiro Vieira de Mello Filho, defendeu que as ações afirmativas se destinam a pessoas negras e ressaltou que a medida tem por finalidade reduzir as desigualdades raciais no serviço público. "São ações voltadas a permitir que mais pessoas tenham acesso a cargos para que possam refletir em mudança da própria representação da sociedade."

Durante a defesa de seu voto, o conselheiro afirmou que a atuação da comissão formada pela banca do concurso do TJ-RJ para analisar o pertencimento racial dos candidatos que concorriam à vaga reservada a pessoas negras estava em desacordo com a própria normativa do tribunal e com a Lei nº 12.990/2014, que reserva aos negros 20% das vagas oferecidas em concursos públicos na administração pública federal.

"Era para ser uma comissão multidisciplinar e, dos três integrantes, dois não participaram do exame do candidato; e a médica que o examinou observou apenas seus dedos, não considerando os demais elementos do fenótipo do candidato", disse o relator da matéria, que defendeu uma melhor avaliação do pertencimento racial nos concursos, a fim de evitar fraudes, desvios e deturpações das políticas de cotas raciais no Poder Judiciário.

Em maio, o Plenário já havia ratificado liminar no mesmo caso, que havia determinado a criação de uma comissão de heteroidentificação multidisciplinar formada por três especialistas em Direito da Antidiscriminação e com larga experiência teórica e prática na área, que concluiu que o candidato não preenchia os requisitos necessários para enquadrar-se como cotista — o concorrente não teria conseguido passar pela primeira etapa do certame caso não estivesse pleiteando a vaga dentro do sistema de cotas.

A presidente do CNJ, ministra Rosa Weber, acompanhou o voto do relator. "O Estado atua por meio de suas políticas públicas justamente para igualar diante de desigualdades materiais. No entanto, não vejo isso se materializar nesse caso concreto. Aqui, o candidato a magistrado não integra um grupo que tenha o passivo de sofrer o preconceito, a discriminação que eu entendo ser visual, no Brasil."

Abrindo voto divergente ao do relator, o conselheiro Richard Pae Kim salientou que o TJ-RJ cumpriu as regras do concurso, cujo edital foi publicado em 2019, portanto antes de entrar em vigor a Resolução do CNJ 457/2022, que instituiu a obrigatoriedade de os tribunais criarem comissões de heteroidentificação formadas necessariamente por especialistas em questões raciais e antidiscriminação.

"Todas as regras foram cumpridas e, como sabemos, o edital é a lei do concurso", afirmou Pae Kim, que sugeriu a criação de um grupo de trabalho para analisar com mais profundidade questões relativas à heteroidentificação, para fins de ações afirmativas no Judiciário.

Embora o voto tenha ficado vencido, ainda que acompanhado dos conselheiros Sidney Madruga, Marcos Vinícius e Marcelo Terto, o Plenário acolheu sua proposta de criação de grupo de trabalho para discutir critérios de heteroidentificação racial para os concursos de ingresso na carreira da magistratura.

Histórico
A Resolução CNJ 203/2015 dispôs sobre a reserva de 20% das vagas oferecidas nos concursos públicos para provimento de cargos efetivos e de ingresso na magistratura para pessoas negras. Antes de 2013, o número de juízes negros não chegava a 16%; em 2018, três anos após a reserva das vagas entrar em vigor, esse número havia subido para 18%.

Em 2021, pesquisa do CNJ mostrou que o número chegou a 21,6% dos juízes em relação ao ano anterior, ritmo considerado lento pelos pesquisadores. Seguindo nessa velocidade, o fim da desigualdade entre negros e brancos na magistratura só vai acontecer em 2049, segundo os dados do levantamento.

Por essa razão, em abril deste ano o Plenário do Conselho aprovou a Resolução CNJ 457, que alterou as Resoluções CNJ 203/2015 e 75/2009 para excluir a incidência da cláusula de barreira sobre a nota dos cotistas negros, assim como instituir a obrigatoriedade da instituição de comissões de heteroidentificação nos concursos de servidores e magistrados. Com informações da assessoria de imprensa do CNJ.

Processo 0002371-92.2022.2.00.0000

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