Opinião

Matriz pode responder por débitos tributários e compensar créditos de filiais?

Autor

  • Dante Filipe Pucci Prunk

    é pós-graduado em Direito Público pela e em Direito Administrativo pela Unyleya Faculdade Unyleya e cursando MBA em Gestão Tributária pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq/USP).

22 de novembro de 2022, 20h32

Empresas matrizes que se deparam diariamente com cobranças de débitos tributários de suas filiais também questionam se podem compensar créditos tributários entre elas. Esses assuntos resultaram em posicionamentos diversos nos Tribunais Regionais Federais e nos Tribunais Superiores.

O conceito de empresa é extraído do artigo 966 do Código Civil [CC]: "quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços". Assim, o desempenho de uma atividade econômica visa à obtenção de lucro.

Em regra, espera-se que uma sociedade empresária, em meio à sua atuação, seja onerada por diversas responsabilidades, como: pagamento de funcionários, compra de insumos, recolhimento de tributos, bem como o cumprimento de sua atividade fim.

Todavia, ocorre que, às vezes, as empresas não conseguem adimplir com suas obrigações. E, quando o inadimplemento é de sua filial, suas respectivas matrizes acabam, também, por se tornar alvos de cobranças judiciais.

Feitas essas considerações, passa-se a trazer breve conceito do que é uma empresa matriz e uma filial. Uma empresa matriz é considerada um estabelecimento principal, enquanto sua filial, sob uma ótica hierárquica e organizacional da empresa, é tida como uma ramificação da matriz  um estabelecimento subordinado , porém com certa autonomia decisória [1].

A autonomia da filial é delimitada ao âmbito administrativo e operacional para fins fiscalizatórios, porém, essa autonomia, não se estende à autonomia jurídica, conforme fixado pelo do Superior Tribunal de Justiça [STJ] [2]:

"3.O fato de as filiais possuírem CNPJ próprio confere a elas somente autonomia administrativa e operacional para fins fiscalizatórios, não abarcando a autonomia jurídica, já que existe a relação de dependência entre o CNPJ das filiais e o da matriz."

Sob a ótica tributária, é necessário destacar o princípio da autonomia dos estabelecimentos, a fim de se verificar as obrigações e as responsabilidades da empresa filial perante a Fazenda Pública. Esse princípio preceitua que os estabelecimentos empresariais devem ser considerados como unidade autônoma e independente nas relações jurídico-tributárias perante a Fazenda Pública, como bem explicado pelo ministro Mauro Campbell Marques:

"[…]O princípio tributário da autonomia dos estabelecimentos, cujo conteúdo normativo preceitua que estes devem ser considerados, na forma da legislação específica de cada tributo, unidades autônomas e independentes nas relações jurídico-tributárias travadas com a Administração Fiscal, é um instituto de direito material, ligado à questão do nascimento da obrigação tributária de cada imposto especificamente considerado e não tem relação com a responsabilidade patrimonial dos devedores prevista em um regramento de direito processual, ou com os limites da responsabilidade dos bens da empresa e dos sócios definidos no direito empresarial.[…] [3]."

Todavia, não se deve confundir o princípio da autonomia tributária dos estabelecimentos com a não responsabilização da matriz por inadimplementos tributários de sua filial. Conforme exposto, a filial não possui autonomia jurídica nem patrimonial.

Nesse sentido, o STJ passou a considerar que a matriz responde pelo débito tributário da sociedade empresária como um todo, mesmo que o tributo seja decorrente de fato gerador imputável apenas a uma das empresas:

 [4]."[…] Apesar do princípio da autonomia dos estabelecimentos, filial e matriz respondem com o seu patrimônio pelo débito tributário da sociedade empresária, ainda que relativo a tributo decorrente de fato gerador imputável apenas a uma delas […]"

Porém, posto que as filiais não gozam de autonomia jurídica, também passou a ser considerado que a matriz pode pleitear a restituição ou compensação dos valores pagos a maior por suas filiais. Nesse sentido, o STJ formou o seguinte o entendimento [5]:

"4.Os valores a receber provenientes de pagamentos indevidos a título de tributos pertencem à sociedade como um todo, de modo que a matriz pode pleitear restituição ou compensação tributária relativamente a indébitos de suas filiais."

Corroborando com ambos os entendimentos, foi publicado o Informativo de Jurisprudência do STJ nº 700, de 14 de junho de 2021, que apresenta os seguintes pontos:

"A sucursal, a filial e a agência não têm um registro próprio, autônomo, pois a pessoa jurídica como um todo é que possui personalidade, sendo ela sujeito de direitos e obrigações, assumindo com todo o seu patrimônio a correspondente responsabilidade.
As filiais são estabelecimentos secundários da mesma pessoa jurídica, desprovidas de personalidade jurídica e patrimônio próprio, apesar de poderem possuir domicílios em lugares diferentes (artigo 75, §1º, do CC) e inscrições distintas no CNPJ.
O fato de as filiais possuírem CNPJ próprio confere a elas somente autonomia administrativa e operacional para fins fiscalizatórios, não abarcando a autonomia jurídica, já que existe a relação de dependência entre o CNPJ das filiais e o da matriz.
Os valores a receber provenientes de pagamentos indevidos a título de tributos pertencem à sociedade como um todo, de modo que a matriz pode discutir relação jurídico-tributária, pleitear restituição ou compensação relativamente a indébitos de suas filiais."

Conclui-se, portanto, que se deve considerar que as filiais possuem obrigações pessoais com o Fisco, conforme o princípio da autonomia dos estabelecimentos. Porém, em caso de inadimplemento de suas obrigações, o estabelecimento matriz pode ser responsabilizado por débitos de sua filial.


[1] Ricardo Negrão apud James Eduardo Oliveira, Código Civil anotado E COMENTADO, 2ª ed., Forense, p. 864-865.

[2] AgInt no AREsp nº 731.625/RJ.

[3] REsp: 1355812 RS 2012/0249096-3.

[4] AgInt nos EDcl no AREsp nº 1.612.356/MS.

[5] AgInt no AREsp nº 731.625/RJ.

Autores

  • é pós-graduado em Direito Público pela e em Direito Administrativo pela Unyleya Faculdade Unyleya e cursando MBA em Gestão Tributária pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq/USP).

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