Opinião

Justiça Eleitoral não pode impor censura prévia a artistas e público

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27 de março de 2022, 15h49

Acordei neste domingo provocado por Jackliny Larchet a responder se também estava proibido o “fora Bolsonaro”, diante da notícia de que o Tribunal Superior Eleitoral havia proibido propaganda eleitoral no Lollapaloooza.

Spacca
Impedido eticamente de debater, em qualquer meio de comunicação, causa sob o patrocínio de outro advogado (artigo 42, II, do Código de Ética da Advocacia[1]), deixo de analisar seja a petição inicial, seja a decisão proferida pelo ministro Raul Araújo, do TSE, na Representação 11.541, limitando-me a fazer avaliação, em tese.

A questão é saber, em tese, se a Justiça Eleitoral pode proibir manifestação política e propaganda eleitoral em um evento particular para shows artísticos.

Como se sabe, toda interpretação deve se dar da Constituição para as leis, e não das leis para a Constituição. Então, comecemos com ela.

A Constituição Federal de 1988 garante a liberdade de manifestação (artigo 5º, IV, da Constituição[2]) e a livre expressão da atividade artística (artigo 5º, IX, da Constituição[3]), prevendo direito de resposta, proporcional ao agravo, além de indenização por dano material, moral ou à imagem (artigo 5º, V, da Constituição[4]), e, ainda, veda qualquer tipo de censura de natureza política, ideológica e artística (artigo 220, parágrafo 2º, da Constituição[5]).

A mesma Constituição atribui competência privativa à União para legislar sobre direito eleitoral (artigo 22, I, da Constituição[6]), cria os órgãos da Justiça Eleitoral (artigo 118 da Constituição[7]), e atribui a lei complementar dispor sobre sua competência (artigo 121 da Constituição[8]).

É a mesma Constituição de 1988 que estabelece a pena de cassação de mandato por abuso do poder, corrupção ou fraude (artigo 14, parágrafo 10, da Constituição[9]), fixa algumas inelegibilidades (artigo 14, parágrafos 4º[10], 5º[11], 6º[12] e 7º[13], da Constituição) e remete para lei complementar estabelecer outras hipóteses de inelegibilidades, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato considerada a vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do pode econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta (artigo 14, parágrafo 9º, da Constituição).

Como se vê, não há regra expressa sobre propaganda eleitoral na Constituição Federal, mas, sendo da União a competência para legislar sobre a matéria de direito eleitoral, nosso microssistema eleitoral possui diversas leis que a regulamentam, sendo as mais importantes, o Código Eleitoral (Lei 4.737/65) e a Lei das Eleições (Lei 9.504/97). Sua interpretação e aplicação, no entanto, só pode se dar, à luz das regras e princípios constitucionais.

Além disso, tendo o Código Eleitoral atribuído ao Tribunal Superior Eleitoral o poder de o regulamentar (artigo 1º, parágrafo único, do Código Eleitoral[14]), é dele a competência para baixar instruções sobre propaganda eleitoral. Neste momento, para as eleições de 2022, vigora a Resolução TSE 23.610/2019, alterada pela Resolução TSE 23.671/2021.

Destaca-se desse conjunto normativo constitucional que é garantida liberdade de manifestação e vedada censura política, assegurado o direito de resposta e a indenização, e que é juridicamente possível conter o abuso do poder político ou econômico nas eleições, nos termos da lei federal, âmbito no qual se encontra o tema da propaganda eleitoral.

A Lei das Eleições só permite propaganda eleitoral, a partir de 15 de agosto do ano da eleição (artigo 36 da Lei das Eleições[15]), mas, expressamente, estabelece que “não configuram propaganda eleitoral antecipada, desde que não envolvam pedido explícito de voto, a menção à pretensa candidatura, a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos” (artigo 36-A da Lei das Eleições[16]), e, ainda, um conjunto de atos, que poderão ter cobertura dos meios de comunicação social, inclusive via internet (artigo 36-A, incisos I a VII, da Lei das Eleições[17]).

A Lei das Eleições, por outro lado, proíbe, expressamente, a realização de showmício e de evento assemelhado para a promoção de candidatos, bem, como a apresentação remunerada ou não de artistas com a finalidade de animar comício e reunião eleitoral (artigo 39, parágrafo 7º, da Lei das Eleições[18]).

Disso resulta que a legislação eleitoral proíbe propaganda eleitoral, antes de 16 de agosto do ano da eleição, exclui da vedação, desde que não envolvam pedido explícito de voto, a menção à pretensa candidatura ou a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos, e, ainda, proíbe showmício.

A questão jurídica, então, deve ser o que é e o que não é propaganda eleitoral?

Foram tantas as questões jurídicas decorrentes da aplicação da regra do artigo 36 da Lei das Eleições que várias foram as leis que buscaram torná-la mais clara.

Por exemplo, a Lei 12.034/2009 esclareceu que a multa pela violação da regra que proíbe propaganda antecipada só alcançaria o beneficiário, quando comprovado o seu prévio conhecimento. Em 2015, a Lei 13.165, acrescentou a regra do artigo 36-A, acima reproduzida, segundo a qual “não configuram propaganda eleitoral antecipada, desde que não envolvam pedido explícito de voto, a menção à pretensa candidatura, a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos”.

O conceito de propaganda eleitoral foi sendo definido pela jurisprudência do TSE, diante da regra proibitiva de propaganda antecipada na Lei das Eleições (artigo 36), que é, em sua redação original, de 30 de setembro de 1997.

A jurisprudência é abundante, sirvo-me de precedente do ministro Dias Toffoli parta destacar a definição do conceito: a propaganda eleitoral é aquela que leva ao conhecimento geral, ainda que de forma dissimulada, a candidatura, a ação política que se pretende desenvolver ou as razões que façam inferir ser o beneficiário o mais apto para o exercício da função pública[19].

A questão é que, após a inclusão do artigo 36-A, na Lei 9.504/97, não basta isso, é preciso que seja levada ao conhecimento geral e que haja pedido expresso de voto. Por isso, naquele precedente, foi descaracterizada a propaganda antecipada.

Desde então, a jurisprudência do TSE parece caminhar em direção a uma interpretação mais próxima do texto legal. Além daquele precedente do ministro Dias Toffolli, seguem, alguns julgados.

Ministro Luiz Fux
A configuração da propaganda eleitoral extemporânea exige que seja levado ao conhecimento geral, ainda que de forma dissimulada, referência à pretensa candidatura, pedido de voto, ações políticas que se pretende desenvolver ou a ideia de que o beneficiário é o mais apto para o desempenho da função pública eletiva[20].

Ministros Tarcisio Vieira de Carvalho Neto e Ministro Herman Benjamim
A veiculação de mensagens com menção a possível candidatura, sem pedido explícito de votos, como ocorreu na espécie, não configura propaganda eleitoral extemporânea, nos termos da redação conferida ao art. 36-A pela Lei nº 13.165/2015[21].

Ministro Jorge Mussi
Pedido explícito de voto. Ausência […] mera divulgação de fotos em rede social de pessoas junto ao pré-candidato, ‘portando cartazes com o número e a sigla do partido por meio do qual viria a se candidatar’ […] configura apenas divulgação de pré-candidatura, o que é admitido pela norma de regência e encontra amparo no vigente entendimento do Tribunal Superior Eleitoral acerca do tema[22].

Ministra Rosa Weber
O que o artigo 36-A fez foi enumerar uma série de condutas as quais não serão consideradas propaganda antecipada, desde que não haja pedido expresso de voto nem proibição decorrente de outra norma. Assim, por exemplo, desde que não haja pedido explícito de voto, não configura propaganda antecipada a divulgação de posicionamento pessoal sobre questão política, nos termos do inciso V do artigo 36-A da Lei das Eleições[23].

Penso ser paradigmática dessa posição firme do TSE o julgado de relatoria do ministro Tarcisio Vieira de Carvalho Neto:

A veiculação de expressões e frases com clara intenção de promover a reeleição de candidato, mas sem pedido explícito de votos, não encontra vedação na norma[24].

Considero ser útil, ainda, destacar que é igualmente firme a jurisprudência do TSE no sentido de que as limitações à propaganda eleitoral antecipada não violam as garantias constitucionais da livre manifestação. Note-se este precedente da ministra Laurita Vaz:

A jurisprudência do TSE é pacífica no sentido de que as restrições impostas à propaganda eleitoral não causam prejuízo aos direitos constitucionais de livre manifestação do pensamento e de liberdade de comunicação e informação (artigo 220 da Constituição Federal), os quais devem ser interpretados em conformidade com os preceitos da soberania popular e da garantia do sufrágio[25].

Por outro lado, a propaganda pode ser tanto a positiva (favorável) quanto a negativa (desfavorável). Note-se o precedente firmado pela relatoria do ministro Sergio Banhos: "A divulgação de publicação, antes do período permitido, que ofende a honra de possível futuro candidato constitui propaganda eleitoral negativa extemporânea"[26].

Aqui, o tema ganha complexidade. Assim como é proibida propaganda antecipada, é, igualmente, através dela, ofensa a honra de pré-candidatos. O problema surge com a censura prévia e não com a sanção às injurias calúnias e difamações[27].

O Código Eleitoral dispõe expressamente que não será tolerada propaganda que caluniar, difamar ou injuriar quaisquer pessoas e que o fendido poderá, sem prejuízo da ação penal, buscar reparação cível (artigo 243, IX, do Código Eleitoral[28]).

Mas, evidentemente, a regra penal que proíbe os crimes contra a honra submetem-se a interpretação sistemática, e submetem-se à regra constitucional que proíbe censura prévia.

Por fim, as questões atinentes aos shows artísticos.

Em primeiro lugar, para fins eleitorais, bens particulares de uso comum do povo sofrem restrições de propaganda eleitoral.

A regra legal veda veiculação de propaganda eleitoral de qualquer natureza, nos bens cujo uso dependa de cessão ou permissão do poder público ou que a ele pertença (artigo 37 da Lei das Eleições[29]). Em seguida, o dispositivo legal proíbe veiculação de material de propaganda em bens públicos ou particulares (artigo 37, parágrafo 2º, da Lei das Eleições[30]). Depois, acrescenta que: bens de uso comum, para fins eleitorais, são os assim definidos pelo Código Civil e também aqueles a que a população em geral tem acesso, tais como cinemas, clubes, lojas, centros comerciais, templos, ginásios, estádios, ainda que de propriedade privada[31].

Assim, penso que lugares privados para shows artísticos podem sofrer os efeitos das restrições para propaganda eleitoral se forem daqueles que a população em geral tem acesso, pois configurariam bens de uso comum para fins eleitorais.

O problema não é esse!

O problema é limitar, indevidamente, manifestações políticas de artistas e do público em geral, que não configuram propaganda eleitoral antecipada, em especial, quando se trata de censura judicial prévia!

Nesse ponto a jurisprudência do TSE aponta para a possibilidade de controle da propaganda posterior, não configurando limitação à liberdade de manifestação, mas, evidentemente, não permite controle prévio. A aplicação das regras legais deve se dar em harmonia com as regras constitucionais[32].

No precedente do REsp 15.637, do ministro Eduardo Alckmin, ficou assentado que as normas que disciplinam a veiculação de propaganda eleitoral não afetam a liberdade de manifestação do pensamento constitucionalmente garantida, porque não estabelecem qualquer controle prévio sobre a matéria a ser veiculada, sendo equivalentes, na ordem constitucional, o referido princípio com o da lisura e legitimidade dos pleitos, com o que a compatibilização de ambos torna possível a repressão dos abusos cometidos.

Diante disso, creio que é possível concluir que a Justiça Eleitoral não pode, previamente, impedir a livre manifestação de artistas e do público em geral, mas, uma vez ocorrendo, pode aplicar as sanções previstas em lei: direito de resposta e multa, na seara da propaganda eleitoral[33].

Termino, sugerindo uma reflexão. A Justiça Eleitoral é um patrimônio do Brasil que tem prestado grandes serviços à cidadania, especialmente, através do controle dos mais variados tipos de abusos econômicos e políticos. Atua bem quando busca os controlar, seja no âmbito da propaganda eleitoral, seja fora dele, não havendo qualquer inconstitucionalidade na aplicação das sanções legais.

Todo esse debate se resume em saber se e em quais condições a liberdade de manifestação política pode ser controlada. Nossa legislação eleitoral por si já fixou vários desses limites, declarando ilícitas as propagandas eleitorais, antes de 16 de agosto do ano da eleição, mas, por outro lado, excluindo a ilicitude se não houver pedido de votos.

Assim, as manifestações políticas, a favor ou contra pré-candidatos fazem parte do amplo debate democrático e podem ser veiculados em shows que não configurem comícios. Se houver extrapolação desses limites para uma verdadeira propaganda eleitoral, podem incidir sim as sanções eleitorais, mas, estas, em caso algum, podem configurar censura prévia.

Em show que haja manifestação “fora Bolsonaro” ou “fica Bolsonaro” de artista ou do público não haverá propaganda eleitoral, mas, mesmo que, em certas circunstâncias de fato, a configurar, não poderiam gerar ordem judicial contra outros artistas que ainda não se apresentaram. Isso, na verdade, seria censura judicial indevida.

Em uma sociedade que se pretende aberta e democrática, não há permissão constitucional para a instituição de censores judiciais em nenhum grau de jurisdição. Isso é parte de um jogo muito perigoso.

Nesses momentos limítrofes, prefiro a voz de Otávio Mangabeira, ex-governador da Bahia: “Para os males da democracia, o remédio é mais democracia”.

[1] Art. 42. É vedado ao advogado: II – debater, em qualquer meio de comunicação, causa sob o patrocínio de outro advogado.

[2] É livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato.

[3]É livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença.

[4] É assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem.

[5] Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição. § 2º É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.

[6] Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: I – direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho.

[7] Art. 118. São órgãos da Justiça Eleitoral: I – o Tribunal Superior Eleitoral; II – os Tribunais Regionais Eleitorais; III – os Juízes Eleitorais; IV – as Juntas Eleitorais.

[8] Art. 121. Lei complementar disporá sobre a organização e competência dos tribunais, dos juízes de direito e das juntas eleitorais.

[9] § 10 – O mandato eletivo poderá ser impugnado ante a Justiça Eleitoral no prazo de quinze dias contados da diplomação, instruída a ação com provas de abuso do poder econômico, corrupção ou fraude.

[10] § 4º São inelegíveis os inalistáveis e os analfabetos.

[11] § 5º O Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal, os Prefeitos e quem os houver sucedido, ou substituído no curso dos mandatos poderão ser reeleitos para um único período subseqüente.

[12] § 6º Para concorrerem a outros cargos, o Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal e os Prefeitos devem renunciar aos respectivos mandatos até seis meses antes do pleito.

[13] § 7º São inelegíveis, no território de jurisdição do titular, o cônjuge e os parentes consangüíneos ou afins, até o segundo grau ou por adoção, do Presidente da República, de Governador de Estado ou Território, do Distrito Federal, de Prefeito ou de quem os haja substituído dentro dos seis meses anteriores ao pleito, salvo se já titular de mandato eletivo e candidato à reeleição.

[14] Art. 1º Este Código contém normas destinadas a assegurar a organização e o exercício de direitos políticos precipuamente os de votar e ser votado. Parágrafo único. O Tribunal Superior Eleitoral expedirá Instruções para sua fiel execução.

[15] Art. 36. A propaganda eleitoral somente é permitida após o dia 15 de agosto do ano da eleição.

[16] Art. 36-A. Não configuram propaganda eleitoral antecipada, desde que não envolvam pedido explícito de voto, a menção à pretensa candidatura, a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos e os seguintes atos, que poderão ter cobertura dos meios de comunicação social, inclusive via internet:

[17] I – a participação de filiados a partidos políticos ou de pré-candidatos em entrevistas, programas, encontros ou debates no rádio, na televisão e na internet, inclusive com a exposição de plataformas e projetos políticos, observado pelas emissoras de rádio e de televisão o dever de conferir tratamento isonômico; II – a realização de encontros, seminários ou congressos, em ambiente fechado e a expensas dos partidos políticos, para tratar da organização dos processos eleitorais, discussão de políticas públicas, planos de governo ou alianças partidárias visando às eleições, podendo tais atividades ser divulgadas pelos instrumentos de comunicação intrapartidária; III – a realização de prévias partidárias e a respectiva distribuição de material informativo, a divulgação dos nomes dos filiados que participarão da disputa e a realização de debates entre os pré-candidatos; IV – a divulgação de atos de parlamentares e debates legislativos, desde que não se faça pedido de votos; V – a divulgação de posicionamento pessoal sobre questões políticas, inclusive nas redes sociais; VI – a realização, a expensas de partido político, de reuniões de iniciativa da sociedade civil, de veículo ou meio de comunicação ou do próprio partido, em qualquer localidade, para divulgar ideias, objetivos e propostas partidárias.VII – campanha de arrecadação prévia de recursos na modalidade prevista no inciso IV do § 4o do art. 23 desta Lei.

[18] Art. 39. A realização de qualquer ato de propaganda partidária ou eleitoral, em recinto aberto ou fechado, não depende de licença da polícia. § 7o É proibida a realização de showmício e de evento assemelhado para promoção de candidatos, bem como a apresentação, remunerada ou não, de artistas com a finalidade de animar comício e reunião eleitoral.

[19] “[…] Propaganda eleitoral antecipada. Não configuração. Divulgação de discursos proferidos em evento partidário na sede do sindicato dos metalúrgicos. Público determinado. Caráter restrito. Pedido expresso de voto. Ausência […] 4. Segundo a jurisprudência deste Tribunal, a propaganda eleitoral é aquela que leva ao conhecimento geral, ainda que de forma dissimulada, a candidatura, a ação política que se pretende desenvolver ou as razões que façam inferir ser o beneficiário o mais apto para o exercício da função pública. No caso em tela, não houve pedido expresso de votos e não ficou caracterizado o caráter geral das manifestações. A realização de inscrição para participar da reunião reforça o seu caráter restrito, o que afasta a incidência do art. 36 da Lei n° 9.504/97 […]” (Ac de 19.12.2014 no R-Rp nº 83193, rel. Min. Dias Toffoli.)

[20] “[…] Propaganda eleitoral extemporânea. Divulgação de matéria em jornal. Finalidade eleitoral […] 1. A ratio essendi subjacente à vedação do art. 36, caput, da Lei das Eleições, que preconiza que a propaganda eleitoral somente será admitida após 5 de julho do ano das eleições, é evitar, ou, ao menos, amainar a captação antecipada de votos, o que poderia desequilibrar a disputa eleitoral, vulnerar o postulado da igualdade de chances entre os candidatos e, no limite, comprometer a própria higidez do prélio eleitoral. 2. In casu, a instância a quo assentou o conhecimento prévio do Recorrido e a finalidade eleitoral do conteúdo divulgado, reconhecendo a prática de propaganda eleitoral antecipada. Constatou, ainda, que ‘o material foi divulgado em publicação de quase uma página interia do jornal, trazendo a informação do cargo eletivo ocupado pelo representado e sua plataforma de governo’ […] e que ‘é possível vislumbrar a sua finalidade eleitoral, na medida em que o seu real objetivo é fazer fixar, na mente do eleitor, a imagem do potencial candidato’ […] 5. A configuração da propaganda eleitoral extemporânea exige que seja levado ao conhecimento geral, ainda que de forma dissimulada, referência à pretensa candidatura, pedido de voto, ações políticas que se pretende desenvolver ou a ideia de que o beneficiário é o mais apto para o desempenho da função pública eletiva […]”. (Ac. de 16.4.2015 no AgR-AI nº 26055, rel. Min. Luiz Fux.)

[21] “[…] Propaganda eleitoral antecipada. Placas de plástico. Pedido explícito de votos. Ausência. Art. 36-A da Lei nº 9.504/97. Incidência […] 1. Este Tribunal Superior, em julgamento recente, assentou que, ‘com a regra permissiva do art. 36-A da Lei nº 9.504, de 1997, na redação dada pela Lei nº 13.165, de 2015, retirou-se do âmbito de caracterização de propaganda antecipada a menção à pretensa candidatura, a exaltação das qualidades pessoais de pré-candidatos e outros atos, que poderão ter cobertura dos meios de comunicação social, inclusive via internet, desde que não haja pedido expresso de voto’ […] 2. A veiculação de mensagens com menção a possível candidatura, sem pedido explícito de votos, como ocorreu na espécie, não configura propaganda eleitoral extemporânea, nos termos da redação conferida ao art. 36-A pela Lei nº 13.165/2015. […]” (Ac de 26.6.2018 no AgR-AI nº 924, rel. Min. Tarcísio Vieira de Carvalho Neto; no mesmo sentido o Ac de 16.2.2017 na Rp nº 29487, rel. Min. Herman Benjamin.)

[22] “[…] Propaganda antecipada. Art. 36-A da Lei 9.504/97. Facebook. Fotos com o número e sigla do partido. Divulgação. Pré-candidatura. Possibilidade. Pedido explícito de voto. Ausência […] mera divulgação de fotos em rede social de pessoas junto ao pré-candidato, ‘portando cartazes com o número e a sigla do partido por meio do qual viria a se candidatar’ […] configura apenas divulgação de pré-candidatura, o que é admitido pela norma de regência e encontra amparo no vigente entendimento do Tribunal Superior Eleitoral acerca do tema […]” (Ac de 11.9.2018 no AgR-REspe 13969, rel. Min. Jorge Mussi)

[23] “[…] Representação por propaganda extemporânea. Outdoor. Divulgação de pesquisa de opinião apontando o prefeito como o mais bem avaliado. Ausência de pedido explícito de voto. Conduta que configuraria propaganda vedada se praticada durante o período eleitoral. Princípio da segurança jurídica […] 3. A ênfase que – na discussão dos processos sobre propaganda antecipada – tem sido dada ao debate sobre a existência ou não de pedido explícito de voto pode induzir à conclusão errônea de que, não havendo pedido explícito de voto, tudo é permitido. 4. O que o art. 36-A fez foi enumerar uma série de condutas as quais não serão consideradas propaganda antecipada, desde que não haja pedido expresso de voto nem proibição decorrente de outra norma. 5. Assim, por exemplo, desde que não haja pedido explícito de voto, não configura propaganda antecipada a divulgação de posicionamento pessoal sobre questão política, nos termos do inciso V do art. 36-A da Lei das Eleições. Todavia, se, para divulgação desse posicionamento pessoal, o pré-candidato contrata espaço publicitário na televisão, certamente haverá propaganda não só antecipada como vedada. […]” (Ac. de 2.10.2018 no AgR-REspe nº 1262, rel. Min. Rosa Weber.)

[24] “[…] Propaganda eleitoral antecipada. Art. 36-A da Lei nº 9.504/97. Pedido explícito de votos. Ausência. […] 1. A veiculação de expressões e frases com clara intenção de promover a reeleição de candidato, mas sem pedido explícito de votos, não encontra vedação na norma. […]” (Ac. de 7.2.2019 no REspe nº 2564, rel. Min. Tarcísio Vieira de Carvalho Neto.)

[25] “[…] Propaganda eleitoral antecipada. […] 1. A Corte Regional, com base na apreciação do conjunto probatório dos autos, assentou que o Agravante, em programa de rádio, antes do período permitido para propaganda eleitoral, emitiu opiniões favoráveis à futura candidata e críticas a grupo político oponente […] 3. A jurisprudência do TSE é pacífica no sentido de que as restrições impostas à propaganda eleitoral não causam prejuízo aos direitos constitucionais de livre manifestação do pensamento e de liberdade de comunicação e informação (artigo 220 da Constituição Federal), os quais devem ser interpretados em conformidade com os preceitos da soberania popular e da garantia do sufrágio […]” (Ac. de 10.12.2013 no AgR-REspe nº 16394, rel. Min. Laurita Vaz.)

[26] “[…] Propaganda eleitoral antecipada. Propaganda negativa. Multa. […] 3. No mérito, o Tribunal a quo manteve a condenação, mas reduziu o valor da multa imposta na sentença para R$ 5.000,00, tendo concluído pela configuração de propaganda eleitoral antecipada negativa, por ter o representado veiculado em sua página pessoal do Instagram notícias acerca da gestão do então pré–candidato à reeleição ao cargo de Governador do Estado. 4. No termos da jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral: ‘A divulgação de publicação, antes do período permitido, que ofende a honra de possível futuro candidato constitui propaganda eleitoral negativa extemporânea’ […] 5. O TRE ao analisar o contexto no qual ocorreu a veiculação da mensagem postada, destacou que ‘mesmo considerando que a divulgação dos recorrentes digam respeito às vicissitudes na gestão da saúde pública durante o governo do candidato do recorrido (atual Governador do Estado e candidato à reeleição), não há comprovação nos autos de que o mesmo [sic] desvia dinheiro da saúde para a política, e há nítida comparação entre gestões, o que é suficiente para demonstrar o caráter eleitoreiro da postagem e a realização de propaganda eleitoral antecipada negativa’ […] Acresça–se que descabe potencializar somente o teor da mensagem veiculada, a fim de afastar a propaganda eleitoral antecipada negativa, diante das premissas expostas no acórdão recorrido. […]” (Ac. de 17.9.2019 no AgR-REspe nº 060009906, rel. Min. Sergio Banhos.)

[27] Os crimes contra a honra – injúria, calúnia e difamação são punidos seja pelo Código Penal (138-139-140CP) seja pelo Código Eleitoral, neste caso, se veiculadas em propaganda eleitoral (324-325-326CE).

[28] Art. 243. Não será tolerada propaganda: IX – que caluniar, difamar ou injuriar quaisquer pessoas, bem como órgãos ou entidades que exerçam autoridade pública. § 1º O ofendido por calúnia, difamação ou injúria, sem prejuízo e independentemente da ação penal competente, poderá demandar, no Juízo Civil a reparação do dano moral respondendo por êste o ofensor e, solidariamente, o partido político dêste, quando responsável por ação ou omissão a quem que favorecido pelo crime, haja de qualquer modo contribuído para êle.

[29] Art. 37. Nos bens cujo uso dependa de cessão ou permissão do poder público, ou que a ele pertençam, e nos bens de uso comum, inclusive postes de iluminação pública, sinalização de tráfego, viadutos, passarelas, pontes, paradas de ônibus e outros equipamentos urbanos, é vedada a veiculação de propaganda de qualquer natureza, inclusive pichação, inscrição a tinta e exposição de placas, estandartes, faixas, cavaletes, bonecos e assemelhados.

[30] § 2º Não é permitida a veiculação de material de propaganda eleitoral em bens públicos ou particulares, exceto de: I – bandeiras ao longo de vias públicas, desde que móveis e que não dificultem o bom andamento do trânsito de pessoas e veículos; II – adesivo plástico em automóveis, caminhões, bicicletas, motocicletas e janelas residenciais, desde que não exceda a 0,5 m² (meio metro quadrado).

[31] § 4o Bens de uso comum, para fins eleitorais, são os assim definidos pela Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 – Código Civil e também aqueles a que a população em geral tem acesso, tais como cinemas, clubes, lojas, centros comerciais, templos, ginásios, estádios, ainda que de propriedade privada.

[32] Recurso especial. Processo. Contagem de prazo. Propaganda eleitoral. Restrições. Liberdade de Imprensa. Jornal. Divulgação de opinião favorável a candidato. Lei nº 9.504/97, art. 43. 1. Também na Justiça Eleitoral, os prazos que se contam em dias têm início naquele seguinte ao da intimação. Aplicação da regra do art. 184 do CPC. 2. As normas que disciplinam a veiculação da propaganda eleitoral não afetam a liberdade de imprensa nem cerceiam a manifestação do pensamento, visto que as garantias constitucionais devem ser interpretadas em harmonia. 3. Ao contrário das emissoras de rádio e de televisão, cujo funcionamento depende de concessão, permissão ou autorização do Poder Executivo, os jornais e os demais veículos impressos de comunicação podem assumir posição em relação aos pleitos eleitorais, sem que tal, por si só, caracterize propaganda eleitoral ilícita. Os abusos e excessos são passíveis de apuração e punição, na forma do artigo 22 da Lei Complementar nº 64, de 1990. 4. A aplicação da sanção prevista no art. 43 da Lei nº 9.504, de 1997, só é possível quando se tratar de propaganda eleitoral paga ou produto de doação indireta. 5. Recurso conhecido e provido. (RESPE nº 18802 – de 08/02/2001 -Relator(a) Min. Fernando Neves).

[33] Deixo a observação que se a propaganda antecipada configurar crime contra a honra poderá ser objeto da cabível perseguição penal na justiça eleitoral ou na justiça comum, a depender das circunstâncias fáticas.

Autores

  • é advogado, conselheiro federal da OAB da Bahia, vice-presidente da Associação Brasileira de Constitucionalistas Democratas, membro do IAB Nacional e da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político.

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