Opinião

Supremo volta a analisar a partir de hoje o voto de qualidade no Carf

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  • Thabitta Rocha

    é advogada tributarista no Martinelli Advogados pesquisadora do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT-Jovem) e do Núcleo de Pesquisas do Mestrado Profissional em Direito Internacional do IBDT (Nupem) MBA em Gestão Tributária pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (USP/ESAlq) e especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (Ibet).

  • Paulo Boechat

    é advogado do Mauler Advogados.

24 de março de 2022, 12h12

Na tarde desta quinta-feira (24/2), o Supremo Tribunal Federal julgará as Ações Diretas de Inconstitucionalidade nº 6.399, 6.403 e 6.415 em que se debate a (in)constitucionalidade da extinção do chamado "voto de qualidade", "voto de minerva" [1] ou "voto de desempate" no âmbito do Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais), instância final do contencioso administrativo federal. O julgamento é muito aguardado pela comunidade jurídica.

Até então o julgamento conta com dois votos. O relator, ministro Marco Aurélio, votou pela inconstitucionalidade formal do artigo 28 da Lei nº 13.988/2020 e, em caráter eventual, entende que não há vício material. Afirma que a adoção no contencioso fiscal de solução favorável ao contribuinte, em caso de empate na votação, não conflita com nossa Constituição Federal, sendo, portanto, opção legítima e razoável do legislador, estando em harmonia com o sistema de direito e também de garantias fundamentais.

Já o ministro Roberto Barroso votou pela constitucionalidade da norma, propondo, contudo, a possibilidade de a Fazenda Nacional ingressar no Judiciário com relação aos casos que forem decididos favoravelmente ao contribuinte por aplicação do mencionado artigo 19-E. O julgamento será retomado hoje no Plenário físico para apresentação de voto-vista do ministro Alexandre de Moraes.

Diferentemente dos Tribunais Superiores que, na grande maioria, elege o presidente entre seus pares, em sistema de alternância e observando a antiguidade do cargo, o Carf possui apenas presidentes do Fisco, os quais detém o voto de qualidade. Fato que diverge do Judiciário, no qual (i) os colegiados são compostos por número ímpar de ministros e (ii) o voto de qualidade é utilizado em casos excepcionais e contingentes.

Vale lembrar que o processo administrativo fiscal nada mais é do que a forma que a Administração Pública dispõe para realizar o controle de legalidade dos seus próprios atos. De modo diverso do Judiciário, a principal função do processo administrativo tributário não é solucionar conflitos de interesses entre o Poder Público e particulares, ainda que isso aconteça também. Seu principal objetivo é controlar a legalidade dos atos de constituição do crédito tributário.

Importa destacar que a "criação" do voto de qualidade coincide com a própria criação do Carf, através do artigo 25 da Lei nº 11.941/2009 que incluiu o § 9º ao art. 25 do Decreto nº 70.235/1972 para dispor que: "Os cargos de Presidente das Turmas da Câmara Superior de Recursos Fiscais, das câmaras, das suas turmas e das turmas especiais serão ocupados por conselheiros representantes da Fazenda Nacional, que, em caso de empate, terão o voto de qualidade, e os cargos de Vice-Presidente, por representantes dos contribuintes".

A disposição legal surge em decorrência de se adotar um critério de desempate para os julgamentos colegiados, considerando a composição paritária do Tribunal Administrativo. Em contraposição, vários projetos foram propostos e, nos casos de empate no julgamento, a matéria é solucionada da forma mais favorável ao contribuinte, como é de se ver no PL nº 1127/2020.

E não se pode alegar que a extinção do voto de qualidade fere a presunção de legalidade dos atos administrativos, posto que esta já é preservada por outros meios durante o curso do processo administrativo, como por exemplo o julgamento colegiado.

Aguarda-se, portanto, a conclusão do julgamento pelo Supremo Tribunal Federal.

[1] O termo decorre de episódio da mitologia grega, no qual Orestes foi submetido a julgamento pelo crime que foi acusado. Após o empate, ele foi inocentado por decisão proferida pela deusa Minerva. O relato de Thomas Bullfinch quanto ao episódio: “But Orestes was not yet relieved from the vengeance of the Erinnyes. At lenght he took refuge with Minerva at Athens. The goddess afforded him protection, and appointed the court of Aeropagus to decide his fate. The Erinnyes brought forward their accusation, and Orestes made the command of the Delphic oracle his excuse. When the court voted and the voices were equally divided, Orestes was acquitted by the command of Minerva.” BULLFINCH, Thomas. The age of fable. Bullfinch’s Mythology. Londres: Spring Books, 1967.

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