Opinião

ICMBio não deve se manifestar quando não precisa de licenciamento ambiental

Autor

  • Lucas Dantas Evaristo de Souza

    é advogado e consultor jurídico na área ambiental especialista em Direito e Gestão Ambiental professor de pós-graduação lato sensu do Complexo de Ensino Superior de Santa Catarina (Cesusc) secretário-geral da Comissão de Meio Ambiente da OAB-SC e sócio do escritório Buzaglo Dantas Advogados.

24 de março de 2022, 17h18

Não é novidade que nos termos da legislação em vigor (Lei Federal nº 9.985/2000 — Sistema Nacional de Unidades de Conservação — Snuc), o órgão competente para criar, implantar, gerir e fiscalizar unidades de conservação federal é o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).

Como no nosso país virou moda a criação de unidades de conservação federal — algumas com grande importância, outras consideradas de "papel" —, sempre que a instalação ou operação de empreendimentos de significativo impacto ambiental tenha o potencial de afetá-las ou suas zonas de amortecimento, o licenciamento ambiental dependerá de prévia "autorização" do ICMBio (artigo 36, §3º).

Sem adentrar no alcance da palavra "autorização" a que alude a norma, se com poder vinculante ou apenas opinativo/sugestivo, tendo em vista o aparente conflito existente entre a norma e o disposto no artigo 13, §1º, da Lei Complementar nº 140/2011, o fato é que a manifestação prévia do órgão gestor não deve ocorrer em todos os casos, mas apenas quando se tratar de atividade a ser licenciada mediante EIA/Rima (Estudo Prévio de Impacto Ambiental).

Regulamentando o tema, a Resolução Conama nº 428/2010 (com alteração ditada pela Resolução Conama nº 473/2015) definiu os casos em que há necessidade expressa de autorização do órgão gestor (artigo 1º, caput). Previu, também, que se a unidade de conservação não tiver instituída zona de amortecimento (o caso de muitas unidades de conservação, mas, por exemplo, pode-se se citar a Estação Ecológica Carijós (Esec), situada em Florianópolis, ou a APA da Baleia Franca, que abrange alguns munícipios catarinenses), o órgão gestor dever ser ouvido previamente, caso o empreendimento esteja situado a menos de três quilômetros dos limites da UC, ressalvando quando se tratar de RPPNs, APAs e Áreas Urbanas Consolidadas (§2º).

Percebe-se, portanto, que a autorização prévia, a simples anuência ou a ciência do órgão gestor da unidade de conservação federal somente deve ocorrer nos casos de obra potencialmente poluidora de significativo impacto ambiental ou quando exigível licenciamento ambiental.

Assim, em se tratando de atividades que não dependam de licenciamento ambiental (entenda-se aquelas expressamente constantes do artigo 10 da Lei nº 6.938/81, com nova redação dada pela LC nº 140/11, Resolução Conama nº 237/97 e eventuais normas existentes em âmbito estadual/municipal que disciplinem a matéria), não há obrigatoriedade de qualquer manifestação do órgão gestor, ainda que dentro dos limites da UC, em sua zona de amortecimento ou mesmo quando puder vir a afetá-la.

Corrobora este entendimento o teor da IN nº 10/2020, do ICMBio, que expressamente fez constar que o órgão somente se manifestará em casos de "processos de licenciamento ambiental", ou seja, se a atividade não exige licenciamento, não há qualquer disciplina normativa que exija a manifestação do órgão gestor.

Assim, ao contrário do que costumaz se verifica na prática, não há qualquer irregularidade ambiental quando uma atividade não passível de licenciamento ambiental é implantada dentro dos limites de unidade de conservação ou em sua zona de amortecimento sem autorização/anuência/ciência do ICMBio, pois as normas que tratam da matéria não exigem seu consentimento.

A tese, bastante sólida e sustentável juridicamente, em sua grande maioria não é aceita pelos principais atores envolvidos, o Ministério Público Federal ou o ICMBIo, razão pela qual, não raras vezes nos deparamos com estas situações no âmbito do Poder Judiciário, que no final das contas é quem terá a última palavra.

Autores

  • é advogado e consultor jurídico na área ambiental, especialista em Direito e Gestão Ambiental, professor de pós-graduação lato sensu do Complexo de Ensino Superior de Santa Catarina (Cesusc), secretário-geral da Comissão de Meio Ambiente da OAB-SC e sócio do escritório Buzaglo Dantas Advogados.

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