Opinião

Março, tempo de renovar a luta por dignidade

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23 de março de 2022, 21h22

Neste mês da mulher, aviva-se o debate sobre a igualdade de gênero, ocasião perfeita para discutirmos temas relevantes sobre os direitos das mulheres. Qualquer observador com mínima sensibilidade para a vida em sociedade e o bem comum pode afirmar que há muito por ser conquistado, mas também avanços que precisam ser celebrados. A igualdade de gênero é uma expressão do princípio da dignidade humana plasmado no artigo 1º, III, da Constituição Federal.

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Comecemos pela OAB, que no ano passado aprovou a implementação de cotas raciais e de gênero em suas eleições. Temos agora mais mulheres atuando no sistema, em prol da advocacia e da sociedade. Na OAB Paraná, pela primeira vez uma mulher foi eleita presidente. A diretoria da seccional conta também com mais três advogadas — Roberta Santiago Sarmento, Marion Bach e Fernanda Valério Garcia da Silva.

Sou a primeira presidente da OAB Paraná e minha grande motivação é a convicção de que muitas outras virão depois. Mas o que mais me anima é saber que não serei a última. O estado também está bem representado no Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, com metade das cadeiras que nos cabem ocupadas por grandes advogadas — Ana Cláudia Pirajá Bandeira, Silvana Niemczewski de Oliveira e Graciela Marins.

O sistema OAB está claramente em novo patamar no que se refere à meta de garantir equidade de gênero. Um esforço que dialoga com os números: somos hoje 634 mil advogadas — 50,5% do 1,25 milhão de profissionais inscritos nos quadros da Ordem em todo o país. É claro que essa situação nos entusiasma. Assim como nos alegra olhar em perspectiva histórica e saber que a escolarização das meninas avança, que as mulheres cada vez mais atuam em áreas cujos antigos paradigmas apontavam como exclusivamente masculinas e que seu interesse pela vida pública só cresceu nos últimos 90 anos, quando o voto feminino foi instituído. Sabemos, contudo, que é preciso seguir na caminhada, derrubar obstáculos, vencer o preconceito, buscar apoio para a conciliação da vida profissional com a pessoal.

Sabemos também que, dado o caráter público da advocacia, precisamos ajudar as mulheres a vencer esses e outros desafios em todas as profissões e camadas sociais. Num momento em que vamos saindo de uma pandemia que nos fez mergulhar em recessão econômica, vemos as marcas indeléveis da crise em quase todas as famílias. Não podemos ignorar que a fome, a dificuldade de acesso a serviços de saúde, a insegurança e as barreiras para a educação dos filhos pesaram e pesam ainda mais para as famílias de menor renda — muitas delas sustentadas exclusivamente por mulheres. Como alimentar a família com trabalhos precários? Como aguardar meses por exames em unidades públicas de saúde? Como ajudar as crianças em aula remota num domicílio em que, além do básico para a subsistência, faltam computadores e conexão com a internet? São questões que estão presentes na vida de grande parte das brasileiras e que precisam ser resolvidas com políticas públicas assertivas, trocando o assistencialismo por estímulo ao desenvolvimento pessoal de cada mulher.

Com preocupação, observamos também que o problema da violência doméstica que há muito tem sido atacado pela OAB Paraná — tanto com debates quanto em ações concretas — restou amplificado pelo isolamento social decorrente da pandemia. Uma em cada quatro mulheres acima de 16 anos afirma ter sofrido algum tipo de violência em 2020 no Brasil, segundo pesquisa divulgada em junho pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP).

Isso significa que cerca de 17 milhões de mulheres (24,4%) sofreram violência física, psicológica ou sexual em 2020. Embora o índice geral mostre pouca oscilação em relação a períodos anteriores, o levantamento deixa claro que a violência caiu nos espaços públicos, em decorrência do isolamento, e avançou em larga medida no ambiente doméstico. É alarmante. No lar, o refúgio onde todos nós esperamos acolhimento e segurança, as brasileiras estão sendo ofendidas, feridas, abusadas, estupradas, assassinadas.

Lutar para assegurar, resgatar e manter a igualdade de gênero é lutar pela dignidade humana. Não deve ser tarefa reservada a um grupo ou outro. É uma meta prioritária que demanda o empenho de toda a sociedade. Neste março tão simbólico pelo vislumbre de renascimento após a pandemia, busco força, energia e fé na humanidade para renovar e tornar pública mais uma vez minha convicção de que, juntos, independentemente de gênero, temos o poder de transformar o mundo para que seja melhor e mais justo, reconhecendo que somos todos iguais em direitos e na busca pela felicidade.

A causa é justa e precisa de todos. Não nos dividamos na busca pela liberdade e pela dignidade.

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