Garantias do Consumo

5G e TV aberta no Brasil: impactos aos usuários que utilizam antena parabólica

Autor

  • Suzana de Toledo Barros

    é procuradora de Justiça do MPDFT aposentada advogada e consultora jurídica mestre em Direito e Estado pela UnB e professora de Direito Constitucional do Iesb membro atual do Conselho Nacional dos Direitos Difusos do MJ e conselheira Independente do Sart (Sistema de Autorregulação das Telecomunicações) diretora do Brasilcon (Instituto de Política e Direito do Consumidor) autora de diversos artigos e da obra "O Princípio da Proporcionalidade e o Controle de Constitucionalidade das Leis Restritivas de Direitos Fundamentais" (Brasília: Brasília Jurídica 1995).

23 de março de 2022, 8h00

O 5G é a quinta geração de tecnologia de internet móvel, mas terá repercussão sobre serviços prestados atualmente que nada têm a ver com a internet, como é o caso do serviço de radiodifusão de sons e imagens, conhecido como TV aberta, gratuita e universal, especialmente quando recepcionado por antena parabólica. Aqui não nos interessa discutir a existência de relação consumerista, em razão da gratuidade do serviço, porque, bem se sabe, este é remunerado indiretamente, por meio da publicidade. Somos todos, portanto, usuários e consumidores desse importante serviço.

Segundo a Anatel, são 17 milhões de lares (o que se pode multiplicar por 3,5 para a quantificação de pessoas atingidas) que utilizam antena parabólica para captar o sinal da TV aberta, em razão da distância das torres de TV — especialmente a área rural — circunstância que justifica a utilização de satélite para que as emissoras possam levar o sinal até à população.

Destaca-se o fato de que estas antenas parabólicas recebem atualmente os sinais de TV aberta e gratuita transmitidos por um satélite da Star One (Embratel/Claro), que opera nas faixas de frequências de 3.625 MHz a 4200 MHz (Banda C "estendida") e de 3.700 MHz a 4.200 MHz (Banda C "padrão").

Conforme estabelecido no Edital do 5G, a subfaixa de 3.625 MHz a 3.700 MHz necessita ser liberada para dar lugar à implementação das novas redes de serviços móveis 5G, com ativação prevista já para julho deste ano nas capitais.

Como consequência, e de forma a evitar que os receptores de TV aberta e gratuita por satélite sofram interferências prejudiciais das redes de terminais 5G que irão operar na faixa abaixo dos 3.700 MHz, os sinais de TV aberta por satélite passarão a ser transmitidos em outra faixa de frequências, conhecida como Banda KU (tipicamente de 11 a 14 GHz) [1]. Isto irá requerer uma adaptação não somente das antenas receptoras, para a adequada recepção das frequências da Banda KU, como também a instalação de um novo set-top box de recepção (conhecido como "kit") para cada antena.

Felizmente, o Edital do 5G previu em seu Anexo IV-A que as empresas vencedoras dos lotes correspondentes a essa faixa de frequência da Banda C deverão custear não só a migração do sinal para a Banda KU (o que tem a ver propriamente com o(s) satélite(s) que irá disponibilizar o novo sinal), mas também a instalação da antena e do kit para os beneficiários de baixa renda, quando, na residência que já tenha antena parabólica, conste pessoa integrante do Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal.

Assim, dos 17 milhões de domicílios que contam com parabólicas de recepção gratuita de sinais abertos de TV por satélite, 8,3 milhões deverão ter a migração custeada a partir dos recursos arrecadados com o leilão. Outros 9,2 milhões de lares terão de trocar os equipamentos com seus próprios recursos. A previsão da Anatel é a de que a nova antena (bem menor que a atual) com o kit instalado custe em torno de R$ 250.

Ainda segundo o Edital do 5G, os radiodifusores possuem discricionariedade para escolher os satélites que operam na Banda KU atualmente capazes de receber a migração. Tal escolha, realizada recentemente, indicou dois satélites para a transmissão simultânea do sinal da TV aberta: um pertencente à mesma empresa Star One e outro da Sky. No caso da Sky, não se deve confundir o serviço de TV por assinatura ou por internet com o serviço de TV aberta, pois apenas este último é gratuito para o usuário.

A limpeza da Banda C e a correspondente migração do sinal da TV Aberta para a Banda KU para permitir a recepção de sinal por satélite e, por consequência, o uso de parabólica nas extensas zonas rurais brasileiras, obedece ao mesmo cronograma previsto no Edital 5G para a instalação da nova tecnologia, portanto será gradativa conforme a linha do tempo abaixo.

CRONOGRAMA DE LIMPEZA DAS FAIXAS POR MUNICÍPIOS

Segundo Clóvis José Baptista Neto, um dos maiores especialistas da área e atual Presidente do Conselho de Administração da Hispamar, empresa brasileira que compõe o Grupo espanhol Hispasat e que opera satélites brasileiros que cobrem todas as Américas, "indubitavelmente o processo de migração das parabólicas de recepção da TV aberta e gratuita via satélite da Banda C para a Banda KU por si só já se configura como um projeto estruturante, de grande impacto econômico e social no Brasil, em vista da enorme relevância do consumo dos conteúdos da TV aberta em todo o país, principalmente pela população de baixa renda cujo acesso a outros dispositivos de recepção de conteúdos audiovisuais com alta qualidade em seus lares, como por exemplo a recepção de conteúdos via 'streaming' usando a internet como rede de transporte, é ainda muito limitado".

Considerando, assim, o alcance da TV aberta no Brasil, faz-se necessário proteger os direitos de quem usufrui o serviço, garantindo-lhe qualidade comparável aos serviços de TV por assinatura via satélite e ininterrupção (salvo em condições especiais, que poderão ser ressalvadas, como por exemplo as interrupções do enlace satelital devido a problemas atmosféricos).

É importante que os usuários também possam ser orientados em caso de falhas no seu equipamento de recepção que será fornecido e a quem recorrer para a restauração do serviço, sobretudo no caso dos beneficiários de baixa renda. A defesa do consumidor deve estar em alerta.


[1] 1 Gigahertz (GHz) corresponde a 1.000 Megahertz (MHz)

Autores

  • é procuradora de Justiça do MPDFT aposentada, advogada e consultora jurídica, mestre em Direito e Estado pela UnB e professora de Direito Constitucional do Iesb, membro atual do Conselho Nacional dos Direitos Difusos do MJ e conselheira Independente do Sart (Sistema de Autorregulação das Telecomunicações), diretora do Brasilcon (Instituto de Política e Direito do Consumidor), autora de diversos artigos e da obra "O Princípio da Proporcionalidade e o Controle de Constitucionalidade das Leis Restritivas de Direitos Fundamentais" (Brasília: Brasília Jurídica, 1995).

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