Opinião

Os honorários advocatícios nas ações coletivas na Justiça do Trabalho

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16 de março de 2022, 20h58

Os honorários advocatícios na Justiça do Trabalho e suas nuances são temas recorrentes há décadas. A verba honorária nas ações coletivas, com destaque para a perspectiva do profissional da advocacia, normalmente é esquecida na discussão sobre honorários nesse ramo da Justiça.

As discussões sobre honorários normalmente são travadas pelas perspectivas das partes, quer seja sob o âmbito dos requisitos para a justiça gratuita, quer seja pelo viés do acesso à Justiça, olvidando que os honorários advocatícios constituem remuneração de um profissional que já prestou o serviço, não raras vezes durante anos a fio.

É importante destacar, nesse contexto, a inaplicabilidade do artigo 87 do CDC nas ações coletivas movidas por sindicado em substituição processual por existir norma própria e expressa na CLT.

A omissão do Código de Processo Civil de 1973 em regulamentar as ações coletivas proporcionou que esse tipo de ação viesse a ser regulamentada em legislações esparsas, notadamente pela Lei de Ação Civil Pública e pelo Código de Defesa do Consumidor.

As disposições dessas legislações, por convenção de doutrina e jurisprudência, passaram a ser denominadas de microssistema de processo coletivo, sendo aplicadas além do âmbito específico previsto, incluindo o Processo do Trabalho.

Dentro dessa perspectiva é que passaram a ser aplicados aos processos coletivos perante a Justiça do Trabalho institutos como a condenação genérica, liquidação mediante habilitação individual, necessidade de publicação de edital com a condenação e, no que é pertinente para este artigo, a isenção de honorários advocatícios à entidade de classe que ajuíze ação, ressalvada a hipótese de litigância de má-fé.

Este último aspecto, decorrente da aplicação do artigo 87 do CDC, foi amplamente aplicado na Justiça do Trabalho para isentar sindicatos do pagamento de honorários advocatícios que seriam devidos à parte contrária, existindo alguns tribunais que ainda o aplicam a despeito da expressa previsão de condenação existente no § 1º do artigo 791-A da CLT, cuja redação foi conferida pela Lei nº 13.467/2017, denominada de Reforma Trabalhista.

A discussão sobre a aplicabilidade do artigo 87 do CDC aos processos coletivos trabalhistas deveria encontrar-se ultrapassada ante o texto claro e expresso do § 1º, do artigo 791-A, da CLT, que determina a condenação da parte sucumbente nas ações em que a parte estiver substituída pelo sindicato de sua categoria.

Por lógica o texto normativo está se referindo aos processos coletivos, pois somente neles o sindicato substitui os integrantes da categoria e, portanto, exclui a aplicação do artigo 87 do CDC porque falta a lacuna da legislação trabalhista como pressuposto erigido pelo artigo 769 da CLT.

É certo que alguns tribunais trabalhistas ainda têm aplicado o artigo 87 do CDC para isentar os sindicatos de honorários advocatícios em ações coletivas. Porém, além de o fazerem ao arrepio do § 1º, do 791-A, combinado com o artigo 769, da CLT, o fazem em violação ao artigo 97 da Constituição porquanto somente por declaração de inconstitucionalidade pelos respectivos Plenos poderiam afastar o texto normativo expresso da CLT.

Não é demais lembrar que o STF adota posição firme no sentido de que viola a cláusula de reserva de plenário não somente a declaração expressa de inconstitucionalidade por órgão fracionário dos tribunais, mas também a declaração implícita, pelo desprezo do texto normativo expresso.

Como corolário lógico, não é possível a simples aplicação do artigo 87, do CDC, no âmbito da Justiça do Trabalho, para afastar a condenação em honorários advocatícios de entidades sindicais, sem que o Juízo explicite as razões de suposta inconstitucionalidade do § 1º, do artigo 791-A, da CLT.

Um segundo aspecto que chama a atenção nas condenações em honorários advocatícios nas ações coletivas diz respeito à determinação da base de cálculo dos honorários, quer seja do patrono da parte ativa, quer seja do patrono da parte passiva.

A ação coletiva pode resultar em condenação genérica que pode ser liquidada individualmente em processos autônomos movidos pelos beneficiários, em que pese a possibilidade de liquidação coletiva pelo ente sindical o que, para alguns, depende da publicação de edital e do decurso do prazo de um ano, a teor do artigo 100, do CDC.

Em caso de condenação genérica que se submete a possibilidade de liquidação individual em ações autônomas é praticamente impossível determinar-se o proveito econômico da parte.

Por este motivo, nas ações coletivas ocorre a impossibilidade de liquidação e mensuração do proveito econômico de forma a atrair a aplicação do valor atualizado da causa como base de cálculo dos honorários advocatícios em conformidade com o caput do artigo 791-A da CLT.

É importante ressaltar que a dificuldade da mensuração do proveito econômico não se confunde com a impossibilidade de fixação do valor da causa de acordo com a expressão econômica do pedido, aspecto muito confundido inclusive em jurisprudência.

Assim, se é certo que as ações coletivas prescindem da liquidação exata dos pedidos em razão até mesmo da indeterminação subjetiva dos atingidos, é certo também que a partir da narração dos fatos e formulação das pretensões da ação coletiva é possível extrair-se uma expressão econômica da pretensão, consistindo num valor aproximado, informado por premissas de cálculo como valores médios e público estimado a ser atingido.

Com isso, a impossibilidade de liquidação não pode implicar em que o valor da causa seja estabelecido em valores irreais, simbólicos, que não representariam o valor devido a um substituído sequer.

Este aspecto reclama especial atenção em decorrência da eleição do valor da causa como base de cálculo dos honorários, quer seja em caso de procedência pelo caráter genérico da condenação, quer seja em caso de improcedência por ser a base de cálculo naturalmente utilizada para fixar os honorários dos réus.

É importante ressaltar que a fixação dos honorários advocatícios nas ações coletivas sobre o valor da causa é técnica que preserva a autonomia da referida verba que não pode ficar atrelada a eventuais ações individuais a serem ou não propostas pelos beneficiários para a determinação da base de cálculo dos honorários.

Recentemente, aliás, o STF, no RE 1.309.081, decidiu que os honorários advocatícios em ações coletivas contra a Fazenda Pública não podem sequer ser fracionados para fins de cobrança em ações individuais. Considerando que o próprio STF já havia decidido pela autonomia do crédito de honorários advocatícios ao julgar o tema 18 de repercussão geral, tem-se que efetivamente a melhor técnica para garantir a referida autonomia e evitar-se o fracionamento é a fixação dos honorários sobre o valor da causa. Assim, evita-se que o crédito de honorários fique na dependência da liquidação de valores devidos a beneficiários indeterminados.

É evidente que, atualmente, não é mais aplicável no âmbito da Justiça do Trabalho o disposto no artigo 87 do CDC, ressalvado o entendimento de algum Juízo acerca da inconstitucionalidade do § 1º do artigo 791-A da CLT que deve ser objeto de expressa declaração e, no âmbito dos Tribunais, submetido à cláusula de reserva de plenário.

As condenações em honorários nas ações coletivas, por boa técnica, devem observar o valor da causa fixado de acordo com o proveito econômico estimado e não em valores simbólicos, preservando-se a autonomia dos honorários advocatícios.

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