Opinião

A Constituição é clara quanto ao indulto presidencial

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  • Paulo Lopo Saraiva

    é advogado professor pós-doutor em Direito Constitucional pela Universidade de Coimbra doutor e mestre em Direito Constitucional pela PUC-SP professor Emérito da UFRN ex-presidente da Comissão de Estudos Constitucionais do Conselho Federal da OAB e ex-conselheiro da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça.

2 de maio de 2022, 11h04

Recentemente, o presidente da República concedeu indulto a um deputado federal, que foi condenado pelo Supremo Tribunal Federal. A medida causou um grande impacto político e acendeu a chama de variadas interpretações do texto constitucional. Mas o problema surgiu, lá atrás, quando não foi observado o artigo 53, caput, da Constituição. Claris verbis:

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Presidente Bolsonaro e deputado Silveira
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"Art. 53. Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos."

De outro bordo, não foi cumprido o artigo 55, § 2º:

Verbis:

"Art. 55. Perderá o mandato o deputado ou senador:
§ 2º. Nos casos dos incisos I, II e VI, a perda do mandato será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal, por maioria absoluta, mediante provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa."

Conclui-se, com facilidade, que o problema foi criado anteriormente ao ato do presidente da República, sobre o indulto, veja-se o artigo 84, XII, da Constituição. Claris verbis:

"Art. 84. Compete privativamente ao presidente da República:
XII – conceder indulto e comutar penas, com audiência, se necessário, dos órgãos instituídos em lei;"

A grafia é simples e só admite uma interpretação: a concessão do indulto pelo presidente da República. Esta é uma competência privativa dele. E pronto. "In claris non fit interpretatio" (Na clareza, não há interpretação).

Leitores da Constituição, que têm acesso fácil aos meios de comunicação, passaram a dar opiniões desconectadas do texto constitucional, numa interpretação pessoal e não condizente com a realidade do texto em análise. O saudoso mestre Paulo Bonavides, já ensinou:

"Mas a interpretação, quando excede os limites razoáveis em que se há de conter, quando cria ou 'inventa' contra legem, posto que aparentemente ainda aí a sombra da lei, é perniciosa, assim à garantia como à certeza das instituições.
Faz-se mister, por conseguinte, ponderar gravemente nas consequências que advêm de um irrefletido alargamento do raio de interpretação constitucional, como a observação tornou patente desde que se induziram métodos desconhecidos na hermenêutica das Constituições" (Curso de Direito Constitucional, Malheiros, 2013, pág. 491)

Outro saudoso mestre nordestino Pinto Ferreira cita Tobias Barreto, o ícone da Escola do Recife:

"A força que não vence. A força não se faz Direito: O Direito é a força, que matou a própria força", esclarece Tobias Barreto (Manuel de Direito Constitucional, Forense, 1990, pág. 214)

Não adianta "inventar" interpretações esdrúxulas ao claro texto da Constituição. A competência é exclusiva do presidente da República. "Quosque tandem Catilina, abutere patientia nostra" (Até quando Catilina, abusarás da nossa paciência?), disse o grande Cícero.

Dizemos nós: Até quando abusarão da nossa paciência, com interpretações infundadas e midiáticas. Chegou a hora de dar um basta, no ativismo judicial, para que as coisas se comportem nos termos do artigo 2º, da Constituição Federal. Ativismo, não e nunca; Constituição, sim e sempre; parodiamos o grande Rui Barbosa. Os poderes têm de funcionar, nos limites de suas competências constitucionais.

Ó tempora; ó mores (ó tempos, ó costumes – Cícero).

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