Opinião

Desconto de créditos de PIS-Cofins sobre aquisição de óleo diesel e a MP 1.118

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9 de junho de 2022, 6h09

Desde a greve dos caminhoneiros em 2018, o governo federal vem adotando medidas fiscais para reduzir o impacto tributário nos combustíveis, principalmente no óleo diesel.

Este artigo tratará especificamente sobre o insumo por transportadores de carga ou indústrias. A Medida Provisória n° 1.118/22 tratou também de outros combustíveis, sendo aplicado o mesmo raciocínio aqui exposto. A MP assegurou aos produtores ou revendedores dos derivados de petróleo a manutenção dos créditos.

Em março de 2022, foi sancionada a Lei Complementar n° 192/22, que reduziu a zero as alíquotas do PIS e da Cofins incidentes sobre a receita bruta decorrente da venda, entre outros, de óleo diesel, até 31 de dezembro de 2022.

O artigo 9° da mencionada lei complementar assegurou às pessoas jurídicas da cadeia, inclusive o adquirente final, a manutenção dos créditos relativos à aquisição, entre outros, de óleo diesel.

O dispositivo, expressamente, assegurava a todos da cadeia, o desconto de créditos do PIS e da Cofins.

No dia 18/5/2022, foi publicada, no Diário Oficial da União, a Medida Provisória n° 1.118, que alterou o artigo 9° da Lei Complementar 192/22, retirando a possibilidade da manutenção dos créditos de PIS-Cofins que o mencionado artigo previa.

A mencionada medida provisória, ao retirar a possibilidade de manutenção de tais créditos, aumentou de maneira indireta a carga tributária incidente em toda a cadeia de combustíveis, uma vez que, com a impossibilidade de desconto do citado crédito, o valor que deverá ser recolhido a título das contribuições será maior.

A MP entrou em vigor na data da sua publicação, o que gerou efeitos negativos imediatos aos contribuintes, que, ao apurar o PIS e a Cofins, não poderão descontar os créditos relativos à aquisição de óleo diesel.

A medida provisória entrou em vigor desconsiderando a regra da anterioridade nonagesimal, contida no §6° do artigo 195 e artigo 150, inciso III, alínea "c", ambos da Constituição.

Tal regra serve para evitar a surpresa e oferecer segurança jurídica às relações jurídico-tributárias, fazendo com que o contribuinte se planeje para arcar com a nova carga tributária.

A única interpretação possível, em relação à manutenção dos créditos, anteriormente prevista, é a de que houve a concessão de crédito presumido às pessoas jurídicas que adquirem os combustíveis sujeitos à alíquota zero, pois, caso não houvesse a possibilidade de aproveitar tais créditos, haveria a tributação do PIS e da Cofins concentrada no adquirente final, já que ele arcaria com toda a carga tributária relativamente às mencionadas contribuições. Ou seja, sobre o pretexto de reduzir a carga tributária incidente sobre os combustíveis, o governo federal estaria, na verdade, cometendo uma falsa redução da carga tributária, já que o Fisco iria arrecadar a mesma carga tributária se não houvesse reduzido a zero as alíquotas das contribuições.

Neste caso, seria a típica lei "para inglês ver", expressão utilizada para se referir a uma encenação do Brasil Império, para a potência inglesa, em relação a fiscalização de naus negreiras.

A manutenção dos créditos do PIS e da Cofins tem uma importância enorme, que, caso não seja assegurada no cenário de redução a zero da alíquota do tributo, acabaria por inviabilizar o benefício financeiro. Todavia, a observância da regra da anterioridade é medida que se impõe.

O Supremo Tribunal Federal possui jurisprudência pacificada em relação à aplicação da regra da anterioridade, ainda que o aumento da carga tributária seja indireto.

De modo resumido, o aumento do tributo de maneira direta consiste na majoração da alíquota ou da base de cálculo do tributo. Já o aumento indireto, consiste no aumento, de algum modo, da carga tributária, podendo ficar caracterizado pela redução de um benefício fiscal, o que ensejaria o aumento da carga tributária, ou a exclusão do direito à apuração de créditos de um tributo não cumulativo, o que, também implica em aumento da carga tributária.

O Superior Tribunal de Justiça possui decisão, em que, especificamente, decidiu que a exclusão do direito à apuração de créditos de PIS-Cofins implica em aumento da carga tributária das contribuições.

Portanto, o STF e o STJ possuem entendimentos convergentes sobre a aplicação da anterioridade em caso de aumento da carga tributária, ainda que de maneira indireta.

Como se sabe, o artigo 195, §6° da Constituição, estabelece que as contribuições para a seguridade social observarão a regra da anterioridade nonagesimal.

Evidentemente, a modificação na sistemática da não cumulação do PIS e da Cofins, que tem direta implicação na sua apuração, e, com isso, implica na majoração da carga tributária relativamente às contribuições, deverá respeitar a regra da anterioridade nonagesimal.

A Medida Provisória n° 1.118/22, que deu nova redação ao artigo 9° da Lei Complementar 192/22, desconsiderou a regra do §6° do artigo 195, bem como o artigo 150, inciso III, alínea "c", ambos da Constituição.

Portanto, é evidente a inconstitucionalidade da vigência imediata da MP, que, ao suprimir a redação do artigo 9° da Lei Complementar n° 192/22, retirou a possibilidade de apropriação de créditos do PIS e da Cofins na aquisição de óleo diesel utilizado como insumo, aumentando a carga tributária, sem observar a regra da anterioridade nonagesimal, prevista no artigo 195, §6° e artigo 150, inciso III, alínea "c", ambos da Constituição.

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