Opinião

(I)legitimidade das associações civis para obter relatórios de contratos de integração

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8 de julho de 2022, 16h07

A Lei Federal nº 13.288/2016 regula os chamados "contratos de integração agrossilvipastoril" e, para além de prever os direitos e obrigações de produtores integrados e integradores, estabeleceu uma série de outras regras relativas à interação entre esses agentes econômicos.

Para os fins do objeto deste artigo, destacam-se três disposições relevantes.

A primeira, constante do artigo 6º, concerne à necessidade de que cada unidade produtora tenha uma Comissão de Acompanhamento, Desenvolvimento e Conciliação da Integração (Cadec), órgão colegiado com formação paritária de integradores, integrados e entidades representativas de integradores e integrados. As finalidades e competências do Cadec estão delineadas no §4º do artigo 6º.

A segunda, objeto do artigo 7º, caput, diz respeito à obrigação de o integrador elaborar o Relatório de Informações da Produção Integrada (Ripi) relativo a cada ciclo produtivo do produtor integrado. Referido documento traz todas as informações atinentes aos indicadores técnicos e financeiros da execução contratual. Pode-se dizer que o Ripi está para o integrado como o holerite está para o empregado.

A terceira disposição se encontra no §2º do artigo 7º, que cabe aqui transcrever: "o Ripi deverá ser consolidado até a data do acerto financeiro entre integrador e produtor integrado, sendo fornecido ao integrado e, quando solicitado, à Cadec ou sua entidade representativa".

À luz desse último dispositivo citado, algumas associações passaram a ajuizar ações contra integradores, pedindo a entrega de todos os Ripis de todos os produtores de determinada unidade, integrantes ou não de seus quadros associativos.

Recente julgado do TJ-DF sobre a matéria
Recente julgado da 2ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, proferido nos autos da apelação nº 0718077-12.2021.8.07.0001, entendeu que ação judicial para pedir exibição de Ripis, nos termos do artigo 7º, §2º, acima referido "retrata legitimação extraordinária por representação processual (…) razão pela qual necessária a autorização expressa dos associados para a propositura da demanda, na forma do artigo 5º, XXI, da Constituição Federal".

Com base nisso, concluiu-se que a associação que moveu a ação não teria legitimidade para pedir os Ripis dos produtores que não fazem comprovadamente parte de seus quadros e a tenham autorizado a tomar tal medida.

De outro lado, faltaria interesse de agir da associação para obter documentos dos seus próprios associados (que certamente os têm e podem fornecê-los diretamente à própria associação).

Por fim, o julgado assentou que "a Lei n. 13.288/2016 não estabelece função específica para as entidades representativas, atribuindo a competência fiscalizatória exclusivamente à Cadec".

Trata-se de decisão paradigmática, a primeira de que se tem notícia nos tribunais brasileiros, merecendo aqui uma análise sob o prisma material e processual.

Análise dos fundamentos do julgado 
A solução dada à causa se assenta em duas premissas.

A primeira concerne à legitimidade das associações civis em demandas que tenham por objetivo o interesse de seus associados.  

O STF, em sede de repercussão geral, assentou entendimentos de que: (a) a legitimidade das associações para ajuizamento de demandas na defesa dos interesses de seus associados exige autorização expressa destes (Tema nº 82); e (b) impõe-se um dever de transparência à associação autora, de juntar com a petição inicial relação nominal de seus associados a quem se destina a tutela jurisdicional pleiteada (Tema nº 499). 

Aplicado esse entendimento ao caso concreto, chega-se à constatação de que somente será uma "entidade representativa", para os fins do artigo 7º, §2º, da lei, aquela que efetivamente demonstrar que está agindo no interesse dos membros de sua categoria. Isso se daria, por exemplo, na hipótese em que o integrador sonegue Ripis do integrado, ou quando houver elementos a demonstrar quebra da isonomia entre integrados quanto a critérios financeiros e técnicos para composição dos respectivos Ripis.

A segunda concerne à inexistência de papel fiscalizatório das associações civis quanto às informações constantes dos Ripis. Quem exerce a fiscalização das práticas de uma unidade no tocante aos contratos de integração é a Cadec respectiva, a qual é formada por paritariamente por representantes de integradores e integrados. No âmbito desse órgão colegiado as associações devem veicular seus pedidos ao integrador para melhoria das condições dos integrados e observância dos critérios técnicos e financeiros aplicáveis.

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