Opinião

Outsourcing tecnológico e seus aspectos jurídicos

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7 de janeiro de 2022, 6h03

O mercado de tecnologia cresce em medidas exponenciais, acarretando altíssima competitividade entre agentes econômicos [1]. Com relação ao oferecimento de serviços de tecnologia de informação a empresas, esse mercado proporciona cada vez mais eficiência comercial e economia de escala.

O trabalho "Aspectos jurídicos del outsourcing tecnológico" [2], de autoria do advogado Miguel Ángel Mata González, doutor em Direito pela Universidade Complutense de Madri, realiza uma percuciente análise jurídica do oferecimento desta modalidade de serviços.

Publicado em maio de 2021 pelo selo editorial Tirant lo Blanch, a obra, que é fruto da elaboração e defesa da tesis doctoral de seu autor, aborda em sete capítulos uma sistematização sobre os principais pontos da avença empresarial relativa ao negócio jurídico do contrato de outsourcing tecnológico, enquanto modalidade de contratação informática, estudada a partir da dogmática espanhola (mas que muito pode interessar ao leitor brasileiro).

Em prólogo, o autor sintetiza a noção de outsourcing tecnológico como sendo o fenômeno de descentralização produtiva dos sistemas de informação pelas empresas, advinda de estratégias corporativas com o intuito de redução de custos e foco no desempenho e desenvolvimento de sua atividade econômica (core business) [3].

No primeiro capítulo, preocupa-se em delinear um trato mais profundo a esse fenômeno, identificado como um exemplo de aliança tecnológica, com seus tipos e modalidades, benefícios, desvantagens e fases da contratação.

Em termos mais simples, outsourcing se trata de uma terceirização de serviços, porém com feitio de cunho técnico (o que, em sendo no mercado de tecnologia, justifica o adjetivo tecnológico), cuja atividade produtiva ou processo de negócio a ser terceirizado (serviços de sistemas da informação, por exemplo) geralmente são considerados auxiliares com relação aos processos core da atividade empresária.

Ao segundo capítulo, foca-se propriamente na abordagem dos termos da contratação. O autor bem aborda o contrato partindo sobre o prisma do Direito Privado geral, fazendo menção a teoria da relação jurídica, para a contextualização da fase pré-contratual (dos acordos de intenção e de confidencialidade), das cláusulas em sentido estrito e de meios adequados de solução de conflitos que possam ser convencionados pelas partes.

No terceiro capítulo, é trazido um panorama trabalhista espanhol aplicado ao fenômeno do outsourcing tecnológico. Também é informada as vantagens e desvantagens trabalhistas concernentes, desde os aspectos do trabalho autônomo e do teletrabalho até questões sindicais e de mobilidade funcional (modificação de funções do trabalhador) e geográfica.

A matéria da proteção de dados pessoais, intrínseca ao setor de tecnologia da informação, é abordada no quarto capítulo, no ponto de vista comunitário (europeu) com o Regulamento Geral de Proteção de Dados, e nacional com a ley orgánica correspondente. Fundamentalmente, o outsourcing prestado por empresas internacionais (dita de modalidade offshore) pressupõe a aplicação das regras sobre transferência internacional de dados.

Ao quinto capítulo aborda-se a disciplina jurídica da propriedade intelectual, propriamente no campo do direito autoral, pessoal e patrimonial, incidente ao programa de computador. O autor afirma que os softwares constituem o ativo mais relevante, em geral, no contexto de uma relação negocial de outsourcing tecnológico [4]. Também é dedicada uma interessante passagem sobre free and open source software (foss/software livre e software de código aberto).

No penúltimo capítulo, detalha-se o regime espanhol de responsabilidade civil contratual e extracontratual aplicáveis a relação. Importante é a explicação sobre o seguro de responsabilidade civil, considerado praxe nessas relações, e sobre cláusulas de limitação de responsabilidade e seus limites dogmáticos.

Por último, são tecidas considerações acerca do cloud computing (computação em nuvem) e suas possibilidades para a execução dos serviços relativos a outsourcing. Também se aborda as vantagens e desvantagens, bem como suas modalidades (IaaS, PaaS e SaaS), tipos e considerações especiais sobre cláusulas contratuais afetas ao modelo.

Com a falta de doutrina especializada, com tons profundos de abordagem prática e sem se esquecer de bom fundamento doutrinário, a obra é extremamente bem-vinda. O regime jurídico espanhol não prejudica sobremaneira a compreensão do leitor brasileiro, que pode facilmente traçar paralelos com a dogmática pátria.

A literatura jurídica sobre a prática do direito na tecnologia da informação (portanto, mais que o simplista direito digital) carece em muito de contribuições sólidas da realidade atuante. Essa obra pode ser considerada uma introdução segura a quem deseja explorar com afinco o cenário do mercado empresarial de TI.


 

[1] Para mais detalhes, assista AKITA, Fábio. O mercado de TI para iniciantes em programação. 2019. Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=O76ZfAIEukE.

[2] Referência completa: GONZÁLEZ, Miguel Ángel Mata. Aspectos jurídicos del outsourcing tecnológico. Valência: Tirant lo Blanch, 2021.

[3] Página 28 do livro.

[4] Página 183 do livro.

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