Opinião

Juízes especializados decidem melhor? O caso do direito da insolvência

Autores

  • Eduardo da Silva Mattos

    é advogado economista e contabilista sócio da Øx Analytics professor do curso de Economia da FAE Business School pós-doutor em matemática aplicada pela New York University doutor em Finanças pela Universidade Presbiteriana Mackenzie com pesquisa realizada na University of Chicago Booth School of Business e mestre em Direito Comercial pela Universidade de São Paulo.

  • Gustavo Osna

    é advogado professor do programa de pós-graduação stricto sensu em Direito da Universidade Católica de Brasília (UCB) e do programa de graduação em Direito da UFPR doutor em Direito das Relações Sociais pela UFPR mestre em Direito das Relações Sociais e bacharel em Direito pela UFPR e membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP).

26 de fevereiro de 2022, 15h09

Pesquisa recente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) acerca da implantação de varas especializadas (isto é, de serventias com competências limitadas e exclusivas em determinadas disciplinas jurídicas) indicou que juízes, servidores e advogados consideram que "a especialização melhora(ria) a coleta de provas, as compreensões da estrutura dos serviços judiciais e dos fluxos processuais, a efetividade e a fundamentação nas decisões e a padronização dos serviços cartorários" (p. 16)  conforme noticiado também aqui na Conjur.

Apesar de a fundamentação dessa hipótese parecer clara, qual seja, de que a especialização do Judiciário poderia levar a um serviço de qualidade superior ao usuário, cabe indagar: será que esse raciocínio se sustenta? E quais seriam os custos dessa escolha?

Em recente trabalho publicado, buscamos endereçar justamente tais questões em uma área específica do Direito: a da insolvência.

Foram analisados 1.029 acórdãos e decisões do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná em matéria de recuperação judicial. Como o TJ-PR possui duas varas com competência exclusiva para julgamento de casos de insolvência, foi possível comparar quantitativamente se as decisões proferidas por tais varas foram objeto de um menor número de recursos, assim como se foram reformadas em frequência menor do que as decisões proferidas por juízos que possuem competências concorrentes  incluindo juízos de vara única.

O ensaio apresenta diversas análises descritivas que se acredita serem inéditas  como a taxa de reformas de decisões em matéria de insolvência ou os principais motivos que levam as partes a recorrerem ao segundo grau de jurisdição.

Quanto ao título deste artigo, embora já em âmbito teórico defenda-se que não é possível definir se as decisões de um juízo são "melhores" do que as de outro (ou até mesmo se os julgamentos de instância superior são "melhores" do que as decisões de juízos singulares), os resultados do trabalho sequer dão suporte a essa noção: não se encontrou evidência clara de que as decisões de juízos comuns sejam mais recorridas ou mais reformadas do que decisões de juízos especializados.

Apesar disso, parece que juízos especializados em insolvência são muito mais céleres na análise de processos. Contudo, também foi apontado, a partir de dados do CNJ, que tais juízos costumam receber número sensivelmente inferior de novas demandas em comparação a juízos comuns  algo que concorreria para a maior celeridade, mas que não poderia ser replicado para todas as áreas do Direito sem criar imensos custos para a estrutura judicial.

Isso nos leva ao próximo ponto: o Judiciário brasileiro atualmente é tido como caro e, apesar disso, segundo pesquisa do próprio CNJ, incapaz de entregar um serviço que satisfaça o usuário. Dessa forma, implementar varas especializadas em insolvência ou tornaria o Judiciário ainda mais oneroso (caso houvesse criação de novas serventias) ou reduziria os recursos de outras áreas que atualmente já não prestam serviços tidos como satisfatórios.

Nesse sentido, a especialização do Judiciário  e, em especial, da área da insolvência  pode possuir algumas vantagens (talvez menores do que àquelas originalmente pensadas), mas também contempla custos. Assim, a escolha política de estrutura judicial deve envolver a análise dos trade-offs existentes e ter como objetivo final a entrega de um serviço que satisfaça o jurisdicionado.

Autores

  • é advogado, economista, sócio do escritório Mattos, Osna & Sirena Sociedade de Advogados e da Hedge Consultoria, professor do curso de Economia da FAE Business School, doutor em Finanças pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, com pesquisa realizada na University of Chicago Booth School of Business, e mestre em Direito Comercial pela Universidade de São Paulo.

  • é advogado, sócio do escritório Mattos, Osna & Sirena Sociedade de Advogados e da Hedge Consultoria, professor dos programas de graduação e de pós-graduação Stricto Sensu em Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), doutor e mestre em Direito das Relações Sociais pela Universidade Federal do Paraná (UFPR).

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