Opinião

Novas tecnologias no mundo jurídico: há espaço para os iniciantes na carreira?

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9 de fevereiro de 2022, 6h35

Em razão da pandemia da Covid-19, fez-se necessário estabelecer medidas de isolamento social a fim de conter a propagação do vírus. Com efeito, a imposição do distanciamento acelerou o desenvolvimento de novas tecnologias, tanto para combater a doença quanto noutras áreas.

Diante desse cenário, abordar o mundo pós-pandêmico é falar de um significativo aumento do uso da tecnologia em contraponto com o menor contato humano, inclusive nas relações de trabalho, e do acirramento da concorrência entre os profissionais que atuam no Brasil e no exterior.  

Nesse sentido, Cristiano Englert, cofundador da Grow+, afirma que a inteligência artificial e o machine learning serão dois grandes legados das maiores evoluções tecnológicas durante a crise sanitária [1].

Tais mudanças trouxeram questões antagônicas: enquanto empresas fechavam suas portas diante da falta de perspectiva, outras prosperaram vertiginosamente por já terem, antes da crise da Covid-19, consolidado inovações tecnológicas.

Nessa esteira, os escritórios de advocacia e tribunais acompanham a tendência mundial e passaram a incorporar as tecnologias no dia a dia jurídico. Com efeito, na última década houve um boom tecnológico, de modo que a inteligência artificial já não é uma realidade distante, inclusive no cenário jurídico.

Assim, a inteligência artificial (IA) pode ser aplicada para elaborar tarefas repetitivas, como pesquisas doutrinárias ou jurisprudenciais, calcular prazos, elaborar manifestações simples, protocolar petições. Observa-se que funções anteriormente exercidas por estagiários e assistentes jurídicos passaram a ser conduzidas por máquinas.

Com efeito, diversos cientistas e programadores entendem que a IA representará revolução tecnológica semelhante ao computador pessoal. Há aqueles inclusive que consideram a não utilização de novas tecnologias como negligência, pois as novas máquinas, dotadas de machine learning, apresentarão dados mais rapidamente com maior precisão de informação, inexistindo justificativa para a resistência ao movimento.

Diversas bancas estão investindo de forma maciça em tecnologia, não apenas com a contratação de ferramentas disponíveis no mercado, como, ainda, desenvolvendo dentro do próprio escritório [2].

Assim, a famosa área de TI dos escritórios passou a contar não somente com uma rede de suporte aos sistemas de uso cotidiano, mas, ainda, percebe-se o crescimento nas contratações de profissionais voltados para a criação e o aperfeiçoamento de tecnologia voltada ao mundo jurídico.

Com efeito, utiliza-se a inteligência artificial desde para varredura diária nos andamentos processuais nos tribunais do país e alerta sobre o ajuizamento de ações, com o estudo da incidência de casos/decisões com o mesmo objeto (jurimetria), até mesmo para a realização de processos operacionais internos dos escritórios.

A prática demonstra que algumas atividades já são absorvidas pela tecnologia, Exemplo, em 2015 um grupo de advogados e engenheiros fundou a Tikal Tech, uma empresa de tecnologia dedicada ao desenvolvimento de soluções inovadores com foco no segmento jurídico. E em 2017 eles criaram o primeiro robô assistente de advogados do Brasil, o ELI (enhanced legal intelligence). Ele acelera o andamento de processos e aumenta a produtividade dos escritórios [3].

O robô cadastra processos, faz teses de defesa, monta e elabora petições iniciais. Um trabalho que antes demorava 34 dias para ser realizado com o Eli sai instantaneamente, como é o caso da distribuição de uma petição inicial na área trabalhista.

Assim, ainda que a ferramenta represente um grande avanço para os escritórios, estima-se que funções de estagiários, assistente jurídicos e advogados em início de carreira enfrentarão complexas mudanças na estrutura e modelo de trabalho, porquanto, as funções repetitivas ou de menor dificuldade serão realizadas por máquinas.

Nessa toada, atualmente se vislumbra a exigência de novas competências dos profissionais iniciantes da carreira. Nas entrevistas de emprego, usualmente questiona-se quanto a outras habilidades para além do Direito, como técnicas de mídias sociais, conhecimentos de programas de computação, gestão de pessoas, programação, entre outras.

Assim, cada vez mais, exige-se um profissional multifacetário, capaz de apresentar soluções jurídicas, gerar conteúdo nas redes sociais, captar clientes, produzir artigos acadêmicos e utilizar softwares complexos.

A experiência prática muitas vezes não caminha concomitantemente com a formação acadêmica tradicional. O estágio pouco acompanha as constantes exigências do mercado. Ademais, o país passa por baixo crescimento econômico em razão da crise, atrelado ao avanço significativo da utilização de novas tecnologias, como robôs e IA, que podem preencher as vagas de emprego voltados aos profissionais iniciantes, como estagiários e advogados juniores.

Diante desse cenário pouco atrativo, os estagiários também ficam à mercê das ferramentas tecnológicas que devido à pandemia, embora fossem aceleradas, não proporcionaram a todos as mesmas oportunidades.

Contudo, acredita-se que o impacto das novas tecnologias será positivo. Os advogados serão guarnecidos de informações mais precisas e poderão se dedicar a outras tarefas.

Há, portanto, de se buscar no mercado profissionais multifacetários, faz-se necessário cada vez mais que o profissional do Direito, especialmente aqueles ainda não consolidados na carreira, busquem novas oportunidades de aprendizado além das tradicionais, e ainda formem conhecimento noutras áreas além do Direito.

Ainda, imperioso ressaltar que a tecnologia não é capaz de suprir capacidades humanas, como julgamento, empatia, sentimentos, percepções subjetivas, razão pela qual as chamadas soft skills têm ganhado relevância nas vagas de emprego.

Para concluir, apesar das críticas e pontos negativos, é impossível negar que a tecnologia já faz parte do sistema jurídico e isso traz uma janela enorme de oportunidades, principalmente para a advocacia iniciante. Afinal, há muito espaço para novos profissionais "fora da caixa".

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