Opinião

Crypto maravilha: o Rio quer entrar neste mundo

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5 de fevereiro de 2022, 10h13

Nas últimas semanas, Eduardo Paes, prefeito do Rio de Janeiro, deixou o mundo cripto em polvorosa ao anunciar que o município entrará no mercado das criptomoedas. Ao divulgar estímulos municipais para recebimentos de impostos com bitcoin, investimentos de percentuais do tesouro da cidade nessa nova classe de investimentos e aventar a possibilidade de um criptoativo carioca, o prefeito chamou a atenção de toda a mídia para o tema.

Esse plano do prefeito — chamado de "Crypto Rio" —, se conseguir sair do papel, é uma grande vitória para a ideia de desenvolver uma economia digital e criativa na cidade, pois, apesar de não estar reinventando a roda — uma vez que está seguindo os passos de Miami, que já possui sua CityCoin, chamada MiamiCoin —, o Rio de Janeiro está inovando e poderá ostentar o título de hub para um ecossistema de investimentos em criptoativos. Essa ideia vai ao encontro de um potencial já existente no Rio de Janeiro, pois que a cidade possui um número considerável de empresas desse setor e um importante ecossistema de pesquisa em razão do rico cenário universitário da cidade e de seu entorno, se comparada a outras capitais. Por exemplo, apenas na cidade do Rio há três universidades federais, uma estadual e várias privadas, com condições de desenvolver uma mão de obra especializada necessária para esse mercado de trabalho do presente e do futuro.

Mas sempre existe um porém. É sempre preciso combinar o jogo com os russos! A começar pelos cuidados da prefeitura na composição com efetivos especialistas do grupo de trabalho instituído pelo Decreto Municipal nº 50.145 de 13/01/2022, o qual terá 90 dias para propor ações relacionadas ao desenvolvimento da economia carioca no universo cripto, como por exemplo, viabilizar formas de estimular o uso das moedas digitais como meio de pagamento do IPTU. Então, surgem as perguntas: quem serão esses especialistas? As universidades públicas e privadas estão convidadas? Experts de empresas do ramo sediadas no Rio farão parte? E as entidades como a CVM?

A nós, um advogado especializado em criptoativos e uma professora de Direito Empresarial, cabe fazer outro alerta: a necessidade de avaliar e rever os marcos legais da cidade, pois nos parece haver alguns vácuos legais para que esse plano do prefeito — diga-se, que aplaudimos — possa sair do papel.

Um ponto relevante é refletirmos sobre a necessidade da criação, pela cidade, de uma moeda digital própria nesse momento. A adoção de tecnologias e moedas já existentes deve ser considerada, uma vez que a volatilidade do mercado cripto, natural para os investidores profissionais, pode ser assustadora para os cidadãos e, assim, representar um problema na massificação de seu uso, o que pode levar essa moeda digital carioca ser uma "natimorta" num universo de mais de 17 mil outras já existentes (dados do CoinMarketCap). Igualmente, o anúncio de uma Central Bank Digital Currency (CBDC) pelo Banco Central do Brasil poderá gerar um ecossistema tecnológico bastante interessante para a implementação do projeto sem a necessidade da criação de uma moeda digital própria.

Outro alerta é que para o município do Rio vir a receber suas receitas em criptomoedas, ou mesmo passar a investir nelas, tornando a arrecadação da cidade mais rentável, é preciso avaliar e estudar e, possivelmente, combinar com a Câmara de Vereadores algumas alterações na Lei Orgânica Municipal. Uma dessas é deixar clara a competência e os limites do prefeito em determinar o investimento das sobras de caixa, à exemplo da lei paulistana que diz textualmente como o tesouro paulistano será investido — exemplificativamente em títulos da União ou emitidos por bancos oficiais, como a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil. O marco legal também precisará esclarecer sobre a quem caberá o risco da custódia dos criptoativos recebidos pelo tesouro municipal por meio do pagamento de impostos, como o IPTU. A prefeitura criará o seu próprio sistema de custódia, assumindo para si todo o risco do armazenamento de criptoativos? E, na hipótese de uma falha de segurança — algo possível no universo dos hackers —, como a prefeitura mitigará os riscos dessa custódia? 

Também é preciso verificar legalmente a possibilidade de penhora de tais ativos virtuais por credores do município, o que em tempos de crise não são poucos. Sendo os criptoativos detidos pelo município, penhoráveis, entendemos que é possível. Caberá a quem a guarda após a ordem de penhora? Ele deverá ser liquidado e transformado em reais? Quais serão as responsabilidades do fiel depositário das criptomoedas? O problema desses temas é que serão mais difíceis para o prefeito, pois algumas dessas normas precisam de regulamentação ou modificação de caráter federal.

Tais pontos, além de implicarem em custos para a criação ou manutenção do projeto, ao nosso ver são elementares para o funcionamento do plano que será desenhado pela prefeitura. Igualmente, como todo processo de inovação, os desafios do prefeito Eduardo Paes, principalmente os legais, por se tratar do poder público, serão imensos. Entretanto, o projeto Crypto Rio é um passo significativo para a consolidação do Rio de Janeiro como um importante hub de inovação tecnológica e poder atrair inúmeras oportunidades de recursos e empregos para a cidade.

O prefeito tem e terá o mérito de sair frente nessa inovação no setor público do Brasil, mas precisa "combinar o jogo" rápido e tecnicamente para que esse projeto Crypto Rio venha a ser uma fonte de investimento em projetos municipais estratégicos, como financiar o Carnaval carioca, adorado por nosso prefeito e por nós também! Não só porque amos o samba, mas principalmente porque sabemos que o Carnaval é muito importante para a economia da cidade, na geração de trabalho e renda para uma grande parcela da população carioca que trabalha e sobrevive do Carnaval e de seu entorno, como o turismo, sobretudo para os trabalhadores com baixa escolaridade. 

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