Opinião

Diferencial competitivo de um contencioso estratégico a partir do Direito 4.0

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1 de fevereiro de 2022, 6h03

Um dos problemas mais comumente apontados no Judiciário brasileiro é o tempo que os processos levam para tramitar. Há várias razões para isso, mas uma das principais, certamente, é o número enorme de processos que chegam aos tribunais. A título de comparação, a Justiça brasileira recebe uma demanda de duas a cinco vezes maior do que, por exemplo, a dos países europeus.

Nossa cultura jurídica, seja no âmbito cível, trabalhista ou administrativo, tende a transformar em processo contencioso inúmeros conflitos que poderiam ser resolvidos de outra maneira. O problema é agravado pelo fato de que a legislação brasileira é extremamente complexa e muda a todo instante, o que contribui não apenas com a sobrecarga do sistema judiciário, como também aumenta a insegurança jurídica e dificulta a atuação das empresas.

O Direito 4.0 — a recente incorporação de recursos digitais de automação, big data e inteligência artificial ao trabalho jurídico — vem buscando justamente oferecer algumas soluções a esses problemas, colocando a tecnologia a serviço da gestão de contenciosos.

Uma das maneiras de fazer isso é por meio da gestão de dados. O departamento jurídico de uma grande empresa não consegue acompanhar cada mudança na legislação nacional e internacional, consultar toda a jurisprudência sobre determinada área ou ainda conhecer todo o histórico de contenciosos da corporação sem a ajuda de alguma ferramenta tecnológica. O volume de informações é grande demais para ser processado por uma pessoa ou grupo de pessoas.

No entanto, ferramentas de big data analytics permitem coletar e armazenar informações de múltiplas fontes, otimizando o tempo da equipe jurídica e aprimorando o processo de monitoramento de dados do contencioso. Com o auxílio da tecnologia, tem-se um panorama muito mais completo e confiável sobre o histórico de decisões judiciais a respeito de determinado tema.

O Direto também vem incorporando recursos de inteligência artificial para lidar com processos contenciosos. A principal vantagem nesse caso é a possibilidade de enxergar tendências e realizar predições a partir de um volume enorme de dados que, novamente, não poderia ser analisado pelo olhar humano.

Ferramentas de IA ajudam a empresa a identificar falhas em seu modelo de gestão — o que evita futuros contenciosos —, identificar padrões que indicam maior ou menor chance de litígio e até ajudar a equipe jurídica a escolher teses com chances mais altas de vitória, com base no histórico de decisões de determinado tribunal.

Há alguns exemplos concretos dessa utilização. Nessa linha, podemos citar dois cases recentes de que participamos: uma empresa do e-commerce conseguiu reduzir cerca de 6% de sua contingência de processos judiciais (provisão de perdas prováveis) utilizando IA aplicada aos processos para mostrar quais processos já poderiam ser encerrados, mas constavam em suas bases como ativos. Outro é de uma empresa de recuperação de crédito que conseguiu otimizar em 20% os resultados de sua operação jurídica com o uso de IA para entender especificamente quais as varas, e não os tribunais como um todo, estavam com condenações maiores; com tal informação, conseguiu mapear melhor estratégias de acordo e incentivar os escritórios de advocacia parceiros a trabalharem com mais dedicação nas varas em que as condenações eram maiores. Esse case é contado no podcast "Departamentos jurídicos mais eficientes com tecnologia: saiba como".

Com isso, o Direito 4.0 vem ajudando a mudar, na verdade, a própria natureza do trabalho dos profissionais do Direito, especialmente quando tratamos do universo corporativo, com departamentos jurídicos que não inovam e não analisam dados e aplicação IA como eficientes geradores gastos, por não olharem para a otimização concreta de suas operações.

Tradicionalmente, o papel do departamento jurídico de uma empresa é buscar prevenção e, ao fim, soluções para conflitos. Hoje, porém, há uma mudança de perspectiva impulsionada, em grande medida, pelas inovações trazidas pela tecnologia. Fala-se em um contencioso estratégico. O papel da equipe jurídica seria, primordialmente, buscar as origens dos litígios no interior da empresa. Em outras palavras, antecipar-se aos problemas, evitando preventivamente gastos desnecessários de tempo e dinheiro com futuras ações judiciais.

Nesse sentido, procedimentos como identificação de demandas recorrentes, análise de jurisprudência, notificação de mudanças na legislação, pesquisa de casos similares para estabelecer parâmetros de negociação, entre outros, tornaram-se mais rápidos e confiáveis com a ajuda da tecnologia. Empresas podem operar com mais segurança jurídica, reduzir o número de contenciosos e concentrar esforços na resolução dos casos de maior relevância.

Com isso, o Direito 4.0 oferece caminhos para aprimorar a cultura jurídica brasileira e dar mais eficiência ao próprio Poder Judiciário, hoje sobrecarregado pela avalanche de processos que chegam aos tribunais anualmente. As ferramentas mais modernas de tecnologia digital estão ajudando cada vez mais empresas a se antecipar, evitando que típicos problemas de gestão, solucionáveis internamente, acabem se tornando novos contenciosos.

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