Opinião

CPJ/AMB: os dados sobre o Poder Judiciário e a magistratura em 2022

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30 de dezembro de 2022, 6h13

Incumbiu-me o diretor do Centro de Pesquisas Judiciais da Associação dos Magistrados Brasileiros (CPJ/AMB), ministro Luis Felipe Salomão, atual Corregedor Nacional de Justiça, de escrever a resenha deste ano, assim como apresentar as metas e projetos para o futuro. Aceitei de bom grado a missão, e o faço em nome de todos os integrantes do Centro — Marcelo Cavalcanti Piragibe Magalhães, Patrícia Cerqueira Kertzman Szporer, Cássio André Borges dos Santos, Carlos Gustavo Vianna Direito, Luciane Cardoso Barzotto, Daniela Pereira Madeira e a pesquisadora do CPJ, Nathalia Vince —, porque acredito que este tanque de ideias, que é o CPJ/AMB, incluído nos seus estatutos, já nasceu grande e tem um importante papel a cumprir para o aperfeiçoamento da magistratura.

Esta época do ano é sempre destinada a reflexão, ao balanço dos erros e acertos, aos planos para um tempo melhor.

O Poder Judiciário brasileiro — talvez o maior Judiciário do mundo, reunindo 90 tribunais e mais de 75 milhões de processos —, tem sido objeto de crescentes estudos em universidades e órgãos de pesquisa respeitados. Dentro do próprio Poder, aliás, há o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que possui departamentos de pesquisas e projetos, atuando como fonte das estatísticas oficiais, a exemplo da tradicional publicação "Justiça em Números". Além disso, a Corregedoria Nacional do CNJ informa constantemente à sociedade, por meio de seu site, não apenas procedimentos disciplinares em face de magistrados, notários e registradores, mas também dados relevantes sobre o funcionamento do sistema judicial.

Atenta à necessidade de conhecer os tribunais e magistrados brasileiros, a Associação dos Magistrados Brasileiros, desde 1996, vem reunindo o maior acervo de dados, análises e diagnósticos sobre problemas estruturais e conjunturais da magistratura e do Poder Judiciário. A atuação intensificou-se com a criação do Centro de Pesquisas Judiciais, há três anos, sob a coordenação do ministro Luis Felipe Salomão, com a participação de diversos magistrados e pesquisadores.

Desde 1996, as pesquisas [1] realizadas pelo CPJ/AMB trataram de temas como: "O perfil do magistrado brasileiro" (1996), "Direitos Humanos e Democracia" (1998) e "Opinião pública e política: Perfil do eleitor" (2010). Além disso, foi analisada a "Imagem do Poder Judiciário" em três momentos distintos (2004, 2007 e 2019).

Em 2022, das pesquisas realizadas pelo CPJ/AMB, destacam-se quatro, que trazem importantes contribuições para a melhoria do sistema de justiça.

A primeira é o :2º Censo de Magistrados Com Deficiência, Necessidades Especiais ou Doença Grave, e Magistrados Responsáveis por Pessoas na Mesma Condição" [2], na qual 813 magistrados responderam ao questionário. Identificou-se que: (1) 101 dos magistrados respondentes possuem deficiência (47 possuem deficiência física); (2) 87 magistrados respondentes possuem doença grave (19 deles sofrem de neoplasia maligna); (3) 58 magistrados respondentes possuem dependentes com doença grave (15 deles são doentes psiquiátricos); (4) 57% afirmaram ter conhecimento da Resolução 343 do CNJ, que prevê condições de trabalho especiais; e (5) dos 321 magistrado(a)s que teriam direito a condições especiais de trabalho em virtude da sua condição ou da condição do dependente, apenas 70 (9%) atualmente a possui.

A segunda é relacionada ao impacto do uso de novas tecnologias pelo Poder Judiciário, reconhecidamente na vanguarda deste tema. Com o objetivo de coletar as percepções da magistratura sobre o contexto da transformação digital da Justiça, os limites e possibilidades de virtualização de atividades e o seu impacto para a garantia de direitos, em 2022 foi feito o estudo sobre "O Exercício da Jurisdição e a Atualização de Novas Tecnologias de Informação e de Comunicação" [3], em parceria com o Laboratório de Acesso à Justiça e Desigualdades (Lades/UnB) e o Colégio Latino-Americano de Estudos Mundiais (Flacso/Brasil). Os números da pesquisa indicam que: (1) 83% acreditam que o Balcão Virtual ampliou o acesso da população ao Poder Judiciário; (2) para 88%, o Programa "Juízo 100% Digital" (que possibilita que todos os atos processuais sejam praticados exclusivamente por meio eletrônico e remoto) também aumentou a celeridade dos processos; (3) 859 magistrados apontam que a ferramenta mais utilizada para atender ao público é o WhatsApp; e (4) para 96% o acesso à Justiça depende do acesso à internet.

Com os mesmos objetivos acima, concluiu-se em 2022 a "Pesquisa sobre Teletrabalho" [4]. De seu relatório, infere-se que: (1) 66,5% dos respondentes afirmaram que houve aumento da carga de trabalho; (2) 88,9% disseram que esse modo de trabalho melhorou a produtividade e a qualidade de vida; e (3) 96,9% avaliaram como positiva a experiência com as atividades remotas em comparação com as atividades presenciais.

A quarta refere-se ao ambiente de negócios. O relatório "Um Estudo do Processo de Recuperação de Empresas" [5], realizado em parceria como a FGV Conhecimento, por meio de Centro de Inovação Administração e Pesquisa do Judiciário, analisou as fragilidades e potencialidades dos processos de recuperação judicial nos tribunais do país. Constatou-se que: (1) 30,3% dos juízes consideram ineficiente e demorado o processo para recuperação de crédito, ao passo que 39,4% até consideram eficiente, mas concordam que é demorado; (2) 64% dos advogados consideram o processo de recuperação transparente no Brasil, enquanto 32% dizem que não é; e (3) 60% dos advogados não recebem nenhuma orientação da OAB para oferecer a possibilidade de recuperação extrajudicial.

Estão em andamento e serão concluídas no primeiro semestre de 2023 pesquisas relacionadas a temas fundamentais para a compreensão do mundo atual, envolvendo o mundo digital, direitos humanos e sustentabilidade [6].

Por exemplo, na pesquisa intitulada "Atuação jurisdicional no combate às Fake News/Desinformação", que está realizada em parceria com a Unesco, o objetivo é investigar e analisar os parâmetros que o Judiciário tem utilizado para categorizar "fake news" e, a partir daí, buscar formar um conceito para o termo.

A pesquisa "Perfil das Magistradas Brasileiras e Perspectivas: rumo à equidade de gênero nos tribunais", que está em sua fase final, foi realizada em parceria com a Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam). Pela primeira vez em 72 anos de história, a AMB realizou uma pesquisa voltada exclusivamente para mulheres magistradas.

Também trarão dados inéditos as pesquisas: (1) "Perfil da magistratura no âmbito da América Latina", realizada em parceria com o Ipespe e a Federação Latino Americana de Magistrados; (2) "Atuação Jurisdicional nos Crimes Relacionados ao Meio Ambiente", em parceria com o CNJ e com a ABJ; e (3) "Diagnóstico sobre a Jurisdição do Transporte Aéreo no Brasil", em parceria com as associações de companhias de transporte aéreo (Alta, Jurcaib, Abear e Iata).

Por fim, em comparação com o Poder Executivo e Legislativo, os juízes frequentam constantes cursos para seu aperfeiçoamento — inclusive por ser uma exigência da Constituição Federal. Em razão disso a produção de ciência entre os magistrados cresceu nos últimos anos. São exemplos a criação do Prêmio Ministro Carlos Alberto Menezes Direito para o I Concurso de Artigos Científicos criado pelo CPJ/AMB, bem como o livro Sistema Penal Contemporâneo, lançado em 2021, com 31 artigos acadêmicos de magistrados, com temas como combate à corrupção, sistema carcerário e justiça restaurativa.

Os resultados alcançados até aqui pelo Centro de Pesquisa são expressivos. As pesquisas realizadas foram mencionadas na imprensa mais de 800 vezes. O site do CPJ [7] contou com mais de 108 mil acessos.

As reuniões do CPJ são periódicas (quase 20 já realizadas), com calendário previamente divulgado, onde ocorrem debates entre magistrados dos diversos segmentos da justiça, sociólogos, pesquisadores e sociedade civil, além de realizados os balanços das ações e a programação para as próximas pesquisas.

Este trabalho que o CPJ/AMB apresenta visa contribuir para o fortalecimento da magistratura brasileira, por meio de seu autoconhecimento, bem como para que a sociedade possa compreender melhor o funcionamento do Poder Judiciário.

Que venha mais um ano de inovação e pesquisa!

 

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