Opinião

Aspectos jurídicos nas aquisições focadas na contratação de talentos da empresa

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31 de agosto de 2022, 11h10

Apesar da recente onda de demissões nas startups, caracterizando o denominado "inverno tech", o movimento acelerado de digitalização dos negócios continua demandando cada vez mais profissionais de tecnologia. A dinâmica desse mercado traz um novo foco para operações de M&A (merges & acquisitions): a aquisição de novos talentos, dando destaque ao termo acqui-hiring (abreviação do inglês acquisition to hire).

A prática de acqui-hiring causa diversos impactos ao fazer com que empresas foquem em adquirir equipes prontas e formadas por mão de obra qualificada e com novos métodos de treinamento, ao invés de apenas promover o desenvolvimento interno de suas equipes e buscando crescimento somente por meio de contratações mais "orgânicas". Em outras palavras, esse tipo de operação pode encurtar a curva de aprendizado para se atingir determinada inovação dentro da empresa e permitir a criação de novos produtos mais rapidamente, através da aquisição do know how e da metodologia de empresas menores ou segmentos de startups.

É neste cenário que a atividade jurídica se insere, porque aspectos tributários, trabalhistas, relacionados à governança corporativa, eficiência concorrencial, de propriedade intelectual e gerenciamento de riscos não podem ser deixados de lado. Destacamos alguns dos principais pontos jurídicos que devem ser analisados nos casos de acqui-hiring.

Em um momento preliminar é importante avaliar a viabilidade do negócio como um todo, destacando os possíveis riscos jurídicos envolvidos, através da realização de uma due diligence com foco na transferência de know how: nesse caso, um dos principais pontos é referente à propriedade intelectual, uma vez que são os institutos de propriedade intelectual que protegem a tecnologia e, ao final, a inovação como um todo.

É comum que empresas em estágio inicial deixem de lado algumas questões jurídicas essenciais, como a formalização de cessão de direitos sobre as criações dos colaboradores para a sociedade. Por isso, é necessário estar atento para resguardar corretamente a propriedade intelectual e realizar a transferência de know how, para evitar qualquer tipo de efeito nocivo posterior a operação. Além disso, a decisão de seguir em frente com uma operação de acqui-hiring envolve uma análise ampla de viabilidade, que leva em consideração outros aspectos jurídicos, como questões tributárias, societária, trabalhistas, etc.

Lembramos que nas operações de M&A, a transação deve ser conduzida de modo que os responsáveis atuem de forma honesta, clara, informada e com base nos melhores interesses dos envolvidos, atentos aos deveres de cuidado e de lealdade. Além disso, quando da elaboração dos contratos definitivos (seja de compra e venda, subscrição de quotas ou qualquer outro), a negociação de determinadas cláusulas costuma ser bastante delicada. Diante disso, é importante elaborar e negociar com especial cuidado.

A cláusula de earn-out — específica de pagamento adicional ao vendedor caso determinada meta seja atingida (podendo ser rentabilidade, entrega de um produto ou outro padrão definido pelas partes) — precisa ser pensada juridicamente de forma a garantir a manutenção de baixas taxas de turnover (saída de funcionários adquiridos). Como o objetivo final da negociação nesses casos não é apenas a aquisição de uma determinada tecnologia, e sim a aquisição de talentos, esta deve ser a maior preocupação contratual.

Outro ponto chave para uma transação ser considerada bem-sucedida é a integração de equipes e sistemas, e isso está diretamente relacionado ao esforço de aprendizagem empreendido pelo adquirente e na criação de procedimentos de integração e de construção da cultura da empresa. Pensar na elaboração de novas políticas salariais, de incentivos e demais formas de reter os talentos adquiridos é extremamente importante e pode, se bem executadas, ser um diferencial competitivo. É essencial a atuação dos advogados diretamente neste tipo de contratação, ao entender as demandas dos talentos adquiridos e da adquirente e alinhar os objetivos das partes. Isso se reflete em políticas capazes de incentivar a permanência dos talentos após a operação, seja desenvolvendo novos programas de compra de ações, entre outros.

Além disso, aspectos comuns de operações de M&A não podem ser deixados de fora, como: a estruturação minuciosa de complexos acordos de quotistas/ acionistas; a estruturação de novos modelos de negócio e alinhamento de metas, as responsabilidades pós-fechamento da operação, eventuais impactos na administração das empresas, a verificação da existência de eventuais passivos junto a credores, observância de possíveis questões de cunho fiscal e trabalhista.

A atenção deve ser redobrada nessas operações, sobretudo com relação aos pontos envolvendo propriedade intelectual. É imprescindível compreender os possíveis riscos, ainda em fase preliminar, e na elaboração de documentos e políticas que propiciem a retenção de talentos. Afinal, o objetivo deve ser minimizar a possibilidade de gerar passivos relevantes e evitar a saída expressiva desses times adquiridos.

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