Opinião

A saúde no Brasil e suas idiossincrasias: o rol da ANS

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  • Adib Kassouf Sad

    é advogado vice-presidente da Caixa de Assistência dos Advogados de São Paulo membro da Academia Paulista de Letras Jurídicas exconselheiro secional e presidente da Comissão de Direito Administrativo da OAB-SP.

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24 de agosto de 2022, 9h12

O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, marcou para 26 e 27 de setembro audiência pública sobre a relação de procedimentos médicos elaborada pela Agência Nacional de Saúde Suplementar, o famigerado rol da ANS. Estão nas mãos de Barroso as ações diretas de inconstitucionalidade decorrentes da decisão da 2ª Turma de Direito Privado do Superior Tribunal de Justiça, que em 8 de junho último tornou a lista da agência estatal taxativa, não mais exemplificativa. Ou seja, os planos de saúde ficam desobrigados de cobrir procedimentos que não constem do rol.

Paralelamente, o Senado aprecia o tema, objeto do Projeto de Lei 2.033/22. Enquanto isso, juízes das instâncias inferiores seguem dando ganho de causa aos cidadãos que tiveram exames e tratamentos negados pelos convênios. É a judicialização da saúde, que se soma à sua mercantilização, esta em curso já há bastante tempo.

Não se nega que as operadoras de planos de saúde podem ter problemas financeiros caso procedimentos sejam cobertos indiscriminadamente, mas também não se nega que a saúde não deve ser tratada mediante os mesmos critérios que o comércio de bebidas ou o de sapatos. Surge ainda uma discussão adicional: a ANS tem qualificação para elaborar o rol? Especialistas afirmam que o corpo burocrático da agência não está apto a dizer se este ou aquele tratamento é o mais indicado a esta ou a aquela doença.

O Brasil é mesmo idiossincrático. Possui um sistema de saúde público e universal que, no papel, é modelo para o mundo, mas que na prática esbarra na má conduta de gestores públicos por envolver destinação de recursos. Seu sistema de saúde suplementar, a cargo de operadoras e seguradoras, cobra muito dos pacientes, paga pouco aos médicos e, mediante forte lobby nos palácios do poder, reajusta seus preços sem qualquer parâmetro razoável — a base é a sinistralidade das carteiras e o alto custo das novas tecnologias, mas a metodologia com que planilhas são confeccionadas é no mínimo questionável.

Assim manifestou-se, antes de convocar a audiência pública, o ministro Barroso: "Há, por um lado, uma preocupação legítima com o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de planos de saúde, a demandar uma definição prévia de sua cobertura. (…) Por outro lado, manifesta-se a justa preocupação dos usuários de planos de saúde com as omissões existentes no rol e a consequente não abrangência de todos os procedimentos necessários ao tratamento de doenças cobertas, em especial doenças raras".

Enquanto a audiência pública não lança luz sobre o debate e o referido projeto de lei não é apreciado no Senado, cidadãos que tiveram procedimentos negados vão à Justiça — ao menos os que têm condições econômicas para tanto — para assegurar seu direito constitucional à saúde ou desdobram-se para permanecerem minimamente cobertos: uma pesquisa da Anab (Associação Nacional das Administradoras de Benefícios) revelou que 47% dos brasileiros foram obrigados a remanejar seu orçamento para manter o plano de saúde. É a conduta recomendável, desde que o cidadão ainda tenha algum orçamento a remanejar.

Autores

  • é advogado, secretário-geral da Caixa de Assistência dos Advogados de São Paulo, membro da Academia Paulista de Letras Jurídicas e ex-conselheiro seccional e presidente da Comissão de Direito Administrativo da OAB-SP.

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